Câmara de Lisboa manda embora lojistas para fazer habitação de renda acessível

Comerciantes da Rua de S. Lázaro têm autarquia como senhorio

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Rita Baleia

Comerciantes da Rua de S. Lázaro, em Lisboa, estão indignados por terem de abandonar as suas lojas para ali nascerem habitações a preços reduzidos, no âmbito do programa camarário Renda Acessível.

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Comerciantes da Rua de S. Lázaro, em Lisboa, estão indignados por terem de abandonar as suas lojas para ali nascerem habitações a preços reduzidos, no âmbito do programa camarário Renda Acessível.

"É um terramoto na minha vida e na minha empresa", lamenta o comerciante José Fernandes, que há 30 anos tem uma loja de têxteis na Rua de São Lázaro, junto ao Martim Moniz, freguesia de Arroios.  O lojista contou que, há cerca de um mês, recebeu uma da Câmara de Lisboa, sua senhoria, a solicitar documentos, mas sem dar explicações. Foi de forma informal que soube, através de uma funcionária da autarquia, que teria de sair do seu espaço para ali ser concretizado o Programa Renda Acessível.

Anunciado em Abril pelo presidente do município, Fernando Medina, o projecto prevê o arrendamento de cinco a sete mil fogos a preços reduzidos em 15 zonas da cidade, tendo os jovens como "destinatário primeiro". Os contemplados serão escolhidos através de sorteio. Um T0 poderá ser arrendado por 250 euros, um T1 por 350 euros e um T2 por 450 euros.

Poderá candidatar-se quem tenha rendimentos de 7500 a 40 mil euros por ano e não seja proprietário de imóveis.

O programa funcionará através de parcerias do município com o sector privado: enquanto o primeiro disponibilizará terrenos e edifícios que são sua propriedade, ao segundo caberá construir ou reabilitar.

Na Rua de S. Lázaro a maioria das lojas funciona como armazém de revenda, mas também há venda a retalho de atoalhados, cortinados e roupa interior.

"A clientela que vem a um sítio, acaba por ir a outra loja, já está habituada. Se sairmos daqui, vai ser difícil arranjar clientes novos", refere José Fernandes. Ainda assim, o comerciante já andou a ver outros espaços: "Não há nada na zona para arrendar e o que há é com um terço da área e a pedirem três vezes mais".

Manuel Rocha e Alfredo Tomás, o primeiro proprietário de outra loja de têxteis e o segundo estofador de móveis, souberam ainda antes de José Fernandes que teriam de sair. Como os espaços onde se encontram lhes foram cedidos há décadas de forma precária, receberam em Novembro passado uma carta da autarquia pedindo-lhes a “desocupação do espaço não habitacional”, para “dar cumprimento” ao programa. Mais recentemente, em Maio, foram notificados para abandonar o espaço em 60 dias.

Em ambos os casos, não há direito a indemnização (pelo facto de o contrato de arrendamento ser precário), mas o que os preocupa é a mercadoria armazenada. "Tenho a loja cheia de artigos e não dá para me desfazer deles em dois meses", queixa-se Alfredo Tomás. Também Manuel Rocha não conseguiu “escoar o stock” neste prazo, pelo que pediu “mais tempo” à câmara. Enquanto este comerciante fala na “morte do comércio tradicional”, Alfredo Tomás observa que “vão acabar com um ofício que praticamente já não há na cidade”, o de estofador.

A autarquia explica que em causa estão 27 lojas da Rua de São Lázaro cujos espaços serão reabilitados para serem arrendados para habitação a baixo custo. “Não foi interposta qualquer acção de despejo, mas sim iniciados os contactos legais visando a desocupação dos espaços, tendo sido acautelado o pagamento das devidas indemnizações nos casos dos contratos de arrendamento existentes em situação regular”, assegura o município, acrescentando que “alguns dos processos já terminaram e foi entregue a devida compensação”.

Segundo a autarquia, os contactos feitos com os comerciantes levaram a “prorrogações dos prazos de saída dos espaços em função dos pedidos”, pelo que o período de permanência nas lojas foi adiado até ao final do ano.

A Câmara de Lisboa tenciona abrir concursos públicos para operações-piloto do Programa Renda Acessível “logo que existam manifestações de interesse credíveis”. A autarquia indica que uma das próximas acções a realizar é "aprofundar estudos de procura, quer de famílias potencialmente interessadas, quer de entidades privadas potencialmente interessadas em apresentar propostas nos concursos públicos para atribuição de concessões ou direitos de superfície”.

O objectivo é "abrir concursos públicos para execução das operações-piloto logo que existam manifestações de interesse credíveis de entidades privadas", salienta. A maioria socialista na autarquia conta ter a proposta programa aprovada pelo restante executivo "até ao final de Setembro". Seguidamente, terá de remeter à Assembleia Municipal a proposta de afectação de património imobiliário municipal a este programa, também para apreciação e deliberação.