“Não contes a ninguém”, disse ele à menina que ia violar
APAV divulga estatísticas dos primeiros seis meses de funcionamento de serviço de apoio especializado para crianças e jovens vítimas de violência sexual.
Aliciava as meninas com guloseimas e moedas de um euro, mas se elas resistiam chegava a usar a força. Aproveitava-se da miséria em que viviam estas filhas de famílias de etnia cigana. A uma delas, de oito anos, valeu-lhe a atenção da mãe, que impediu o guarda da GNR reformado de consumar a violação. “Levou-a para um terreno isolado, encostou-a a uma rocha, baixou-lhe as calças e as cuecas pelo tornozelo, dizendo-lhe ‘Não contes a ninguém’, exibindo o seu pénis, enquanto lhe acariciava o órgão genital”, descreve a sentença que o condenou a 15 anos de cadeia. Naquela tarde de Inverno, a progenitora — que costumava cumprimentar o sexagenário quando se cruzava com ele na rua — foi alertada pelos gritos da miúda, que acabou por ser encaminhada para as urgências hospitalares.
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Aliciava as meninas com guloseimas e moedas de um euro, mas se elas resistiam chegava a usar a força. Aproveitava-se da miséria em que viviam estas filhas de famílias de etnia cigana. A uma delas, de oito anos, valeu-lhe a atenção da mãe, que impediu o guarda da GNR reformado de consumar a violação. “Levou-a para um terreno isolado, encostou-a a uma rocha, baixou-lhe as calças e as cuecas pelo tornozelo, dizendo-lhe ‘Não contes a ninguém’, exibindo o seu pénis, enquanto lhe acariciava o órgão genital”, descreve a sentença que o condenou a 15 anos de cadeia. Naquela tarde de Inverno, a progenitora — que costumava cumprimentar o sexagenário quando se cruzava com ele na rua — foi alertada pelos gritos da miúda, que acabou por ser encaminhada para as urgências hospitalares.
O caso passou-se em Mourão, no Alentejo, em 2014, e depois de vários recursos o agressor conseguiu que o Supremo Tribunal de Justiça lhe baixasse a pena para sete anos de prisão — muito embora reconhecendo a sua “propensão para a prática” de actos sexuais com crianças.
Tivessem os ataques em causa ocorrido mais recentemente e era bem possível que as meninas de etnia cigana pudessem ser encaminhadas para um novo serviço da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, destinado a prestar apoio especializado a crianças e jovens vítimas de violência sexual. Os resultados dos primeiros seis meses de funcionamento do projecto Care são apresentados nesta quinta-feira na Fundação Calouste Gulbenkian, entidade financiadora da iniciativa, e dão conta de que, em média, foram atendidas pela APAV quatro menores por semana, num total de 103 crianças. A maioria (83%) eram raparigas e em 48% dos casos o agressor era seu familiar directo — pai ou padrasto. São estatísticas que confirmam tudo o que há muito se sabe sobre este tipo de fenómeno.
Entre 2013 e 2015, altura em que a APAV não tinha este apoio especializado, foram atendidas na associação 281 crianças vítimas de violência sexual. Bruno Brito, gestor da rede Care, que funciona em vários pontos do país, pensa que o elevado número de crianças atendidas nestes primeiros seis meses, por comparação com os três anos anteriores, pode ser um mero efeito do surgimento do projecto. É que há parceiros do projecto, como é o caso da Polícia Judiciária, que passaram a encaminhá-las para aqui. O apoio oferecido é não apenas emocional e psicológico, mas também jurídico e prático. As vítimas e respectivas famílias são ajudadas a apresentar queixa e nas diligências judiciais subsequentes, por exemplo.
A sentença do caso de Mourão não diz quantas vezes tiveram as meninas de relatar aquilo a que foram sujeitas às autoridades. Mais do que uma, certamente. “O ideal era poderem contar tudo, à polícia, uma só vez”, explica Bruno Brito. Mas não é isso que costuma acontecer.