CDU lança dúvidas sobre acordo com empresa de familiares de Rui Moreira
Imobiliária tinha avançado com um processo judicial contra a câmara já em 2010. Acordo em causa é de 2014.
O vereador da CDU na Câmara do Porto, Pedro Carvalho, pediu esta manhã esclarecimentos ao executivo sobre uma transacção judicial entre o município e uma empresa imobiliária, com a participação de familiares directos do presidente Rui Moreira, que envolve terrenos na escarpa da Arrábida. O comunista argumentou que a transacção – que não passou pelo crivo do executivo – implica “um compromisso” da câmara em alterar o Plano Director Municipal (PDM), actualmente em revisão, para acomodar as exigências da empresa Selminho, mas o director municipal dos Serviços Jurídicos da câmara, Correia de Matos, garantiu que não. Rui Moreira ausentou-se da sala durante a discussão.
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O vereador da CDU na Câmara do Porto, Pedro Carvalho, pediu esta manhã esclarecimentos ao executivo sobre uma transacção judicial entre o município e uma empresa imobiliária, com a participação de familiares directos do presidente Rui Moreira, que envolve terrenos na escarpa da Arrábida. O comunista argumentou que a transacção – que não passou pelo crivo do executivo – implica “um compromisso” da câmara em alterar o Plano Director Municipal (PDM), actualmente em revisão, para acomodar as exigências da empresa Selminho, mas o director municipal dos Serviços Jurídicos da câmara, Correia de Matos, garantiu que não. Rui Moreira ausentou-se da sala durante a discussão.
Em causa estão terrenos da empresa Selminho, na escarpa da Arrábida, que a empresa participada por irmãos de Rui Moreira argumenta ter capacidade construtiva, à luz das Normas Provisórias, que vigoraram durante alguns anos na cidade, fruto do atraso na elaboração do PDM que só entraria em vigor em 2006. A empresa avançou com uma acção judicial, já em 2010, e em 2014, com Rui Moreira na presidência da câmara, foi assumido o acordo que suscita dúvidas a Pedro Carvalho.
O comunista pediu esclarecimentos sobre os motivos para a câmara entender que era necessário chegar a um acordo – em vez de aguardar pela decisão do tribunal -, argumentando que em 2012, em sede da 1.ª alteração do PDM, os serviços tinham recusado uma reclamação da empresa. “O que me espanta é uma transacção judicial que não vem ao conhecimento dos órgãos autárquicos e na qual está implícito o reconhecimento de direitos constituídos. Acabamos por ter uma transacção judicial que vem reconhecer esses direitos”, disse.
O documento em causa estabelece que a câmara “compromete-se a, no processo de revisão do PDM do Porto […], diligenciar pela alteração da qualificação do solo do terreno da Autora [Selminho], seja pela alteração da tipologia da qualificação do solo actualmente prevista, seja pela alteração das regras que conformam a utilização do solo de acordo com a qualificação actualmente prevista”. “A referida alteração” – continua a transacção judicial – “deverá garantir à Autora um nível de edificabilidade equivalente ao que detinha antes da entrada em vigor do PDM actualmente vigente, ou, caso tal não seja possível, a integração do terreno descrito […] em mecanismos de perequação compensatória adequados às restrições existentes ou outras que vierem a ser estabelecidas pela revisão do PDM […]”. Por fim, o acordo estabelece que caso a revisão do PDM “não garanta à Autora o resultado previsto na cláusula anterior, as partes desde já comprometem-se a dirimir o litígio pendente, com vista ao apuramento da existência de um eventual direito a indemnização através de um tribunal arbitral a constituir para o efeito”.
O director municipal dos serviços jurídicos da autarquia, Correia de Matos, explicou que o processo já corria quando assumiu funções, mas que os privados argumentavam, de facto, pela existência de direitos adquiridos “discutíveis, mas invocáveis, e havia pareceres favoráveis do Urbanismo nesse sentido”. Existia, por isso, o risco de o tribunal considerar “senão todas, algumas das reivindicações urbanísticas” da empresa. O responsável explicou ainda que a decisão de 2012, durante a 1.ª alteração do PDM, decorreu do facto de os serviços entenderem que o pedido da empresa só poderia ser considerado em sede de revisão, o que só iria acontecer em 2016. Além disso, disse Correia de Matos, a transacção judicial define apenas que “o município se compromete a estudar” a possibilidade de aquele terreno vir a ter “alguma capacidade construtiva”. “Se não for possível, será o tribunal arbitral que vai decidir se há algum direito a indemnização e, a haver, o montante ou forma de indemnização”, concluiu.
As justificações não deixaram Pedro Carvalho satisfeito, e o vereador insistiu: “Havia um risco de se perder esta acção?”. O comunista questionou também o vereador do Urbanismo, Manuel Correia Fernandes, sobre a eventual existência de outro tipo de acordos ou compromissos que condicionem a revisão do PDM. O vereador socialista lembrou que todo o processo será sujeito ao escrutínio do executivo e da Assembleia Municipal, além de um conjunto de entidades externas e garantiu: “Ninguém pode assumir a responsabilidade de rever um centímetro quadrado em qualquer parte da cidade. Os procedimentos serão completamente respeitados, penso que por todos e por mim próprio enquanto eu cá estiver. Não há compromisso nenhum que tenha chegado ao pelouro do Urbanismo sobre o que quer que seja, nem de empresas nem de cidadãos particulares, em sede de revisão do PDM”.
Ao fim de largos minutos de perguntas de Pedro Carvalho e respostas do Correia de Matos, o vereador do PSD Amorim Pereira, que é jurista, lamentou a discussão “em circuito fechado”, por não ter tido acesso aos documentos na posse de Pedro Carvalho, mas depois de ouvir a leitura dos termos da transacção, afirmou: “O que ficou claro é que não há nenhuma obrigação de prosseguir qualquer efeito útil. Não há obrigação de resultados, por isso é que está lá ‘diligenciar’, ponto final. Há uma obrigação de meios e não de resultados”. Ainda assim, o vereador solicitou o acesso à transacção judicial.