A transparência na gestão colectiva

Com uma medida aparentemente simples, deu-se um passo de gigante.

A transparência, muito mais do que um conceito de natureza social, é uma obrigação legal que assume agora um caráter de suma importância nas sociedades de gestão coletiva de direito de autor e direitos conexos. Apesar de também consistir num imperativo ético, decorre, em primeira linha, da Diretiva 2014/26/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2014 e, num segundo momento, da nova Lei das Sociedades de Gestão Coletiva [1], Lei 26/2015, de 14 de Abril, que transpõe para o nosso ordenamento jurídico as obrigações de transparência impostas pelo legislador comunitário.

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A transparência, muito mais do que um conceito de natureza social, é uma obrigação legal que assume agora um caráter de suma importância nas sociedades de gestão coletiva de direito de autor e direitos conexos. Apesar de também consistir num imperativo ético, decorre, em primeira linha, da Diretiva 2014/26/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2014 e, num segundo momento, da nova Lei das Sociedades de Gestão Coletiva [1], Lei 26/2015, de 14 de Abril, que transpõe para o nosso ordenamento jurídico as obrigações de transparência impostas pelo legislador comunitário.

Na realidade, o que se pretende assegurar com estas novas disposições legais, que são obrigatórias do nosso ponto de vista, dada a natureza imperativa do Art. 57 da Lei 26/2015, de 14 de Abril, é um funcionamento claro e transparente para todos aqueles que direta ou indiretamente se cruzem com estas entidades de gestão coletiva.

É de todos conhecido que as diferenças significativas de funcionamento das organizações de gestão coletiva, no que diz respeito à sua transparência e à responsabilidade perante os seus membros e os titulares dos direitos [2], sempre levantaram suspeições, fundamentadas ou não, quanto às políticas de utilização e distribuição das remunerações cobradas aos usuários[3] das obras.

Na verdade, é comum as pessoas interrogarem-se sobre o destino dado às verbas pagas às sociedades de gestão, isto é, quanto fica nas entidades, a quem é distribuído, como é distribuído e quais os prazos para as referidas distribuições.

Acresce ainda que nestas questões existe um normal conflito de interesses entre quem paga (usuários) e quem cobra (sociedades de gestão coletiva), pois é perfeitamente compreensível que quem paga queira pagar o menos possível e, já que é obrigado a pagar, gostará de saber para onde vai aquele dinheiro. Por outro lado, quem cobra não o faz para proveito próprio, fá-lo por conta de terceiros (titulares de direitos), que obviamente têm o direito de saber, de forma clara e transparente, quanto dinheiro é que foi cobrado, quais os custos inerentes ao processo administrativo de cobrança, a quem são distribuídos os valores remanescentes e quais os critérios ou regulamentos de distribuição. É esta a única forma de se personificar, de facto, a transparência.

É também importante termos em mente que a própria utilização das verbas legalmente alocadas aos fundos culturais e sociais[4] destas sociedades estão sujeitas ao mesmo regime de transparência, o que se compreende pelas razões já invocadas.

A presente estrutura legislativa tem o objetivo de estabelecer e garantir um padrão elevado de governação, gestão financeira, transparência e apresentação de relatórios e regulamentos que permitam, naturalmente, ilidir qualquer suspeição e, concomitantemente, permitir à supervisão / tutela uma maior eficiência.

Esta disposição legal da Lei (Art.º 57) obriga à elaboração de um relatório anual de transparência e respetiva publicação no site da entidade de gestão coletiva. Com esta medida, aparentemente simples, deu-se um passo de gigante, que é, ao mesmo tempo, um grande desafio de clareza na gestão, porém gigantesco naquilo que é a informação disponibilizada aos titulares de direitos, usuários e outras organizações de gestão coletiva na gestão de direitos.

Pretende-se, pois, que cada organização de gestão coletiva, ou os respetivos membros, sejam uma entidade responsável pela atribuição ou pagamento de montantes devidos aos titulares de direitos, com vista a obtenção de uma maior pacificação e bem-estar social assentes no princípio da transparência.

 

[1] Entidades criadas pelo ordenamento jurídico que têm como missão a gestão dos direitos patrimoniais de autor e conexos, estando ainda obrigadas a atividades de natureza social e cultural, defesa, promoção e divulgação do direito de autor e direitos conexos.

[2] Indivíduo ou pessoa jurídica que tem direitos sobre determinada obra ou produção cultural.

[3] A diferença entre usuários e utilizadores consiste que os primeiros pagam pelos serviços que usufruem e do qual tiram mais-valia (ex. Netflix) enquanto os utilizadores não (ex. YouTube).

[4] Fundo obrigatório nas sociedades de gestão coletiva para ações que fomentem iniciativas culturais e artísticas, com prioridade ao investimento em novos talentos.

Advogado e Director Geral da GEDIPE