"Auditoria vem ao encontro das nossas suspeitas"
Organizações pela defesa dos direitos LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero) queixam-se há anos da Unidade Reconstrutiva Génito-Urinária e Sexual.
Associações pela defesa dos direitos LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero) congratulam-se com o resultado da auditoria da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) à Unidade Reconstrutiva Génito-Urinária e Sexual (URGUS) do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Encaram-no como uma promessa de mudança.
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Associações pela defesa dos direitos LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero) congratulam-se com o resultado da auditoria da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) à Unidade Reconstrutiva Génito-Urinária e Sexual (URGUS) do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Encaram-no como uma promessa de mudança.
A Margarida Faria, presidente da APLOS — Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade de Género, parece “muito positivo” ver tudo isto reconhecido e escrito pela IGAS: não há consulta específica, não há lista de espera específica, falta coordenação e tudo isso gera dificuldade em aceder aquele serviço de saúde. “A informação que temos é essa”, sublinha.
“Esta é uma população que comunica muito entre si, há redes que funcionam bem”, explica. Em seis anos, só conheceu uma pessoa operada na URGUS. Muitas outras acabaram por pedir um empréstimo e fazer os tratamentos no privado. Ocorre-lhe o caso de um pai a quem ligaram da URGUS a adiar a consulta da filha de Abril para Novembro. “Não se pode esperar tanto tempo. A pressão psicológica é muito grande. O risco de suicido é enorme”, salienta. O homem pegou na filha e levou-a ao cirurgião plástico Décio Ferreira, que saiu do Serviço Nacional de Saúde, do Hospital de Santa Maria, em 2011, quando atingiu os 70 anos de idade, mas continua a operar no privado, no Hospital de Jesus.
A APLOS pediu em 2012 uma audição ao parlamento para denunciar a situação e este ano já pedira outra. Outras organizações têm levantado a voz, como a Panteras Rosa — Frente de Combate à LesBiGayTransFobia, a JANO — Associação de Apoio a Pessoas com Disforia de Género, e a API — Acção pela Igualdade.
Carta ao ministro e aos deputados
“Ficamos bem felizes com a auditoria”, reconhece Júlia Mendes Pereira, co-directora da API. Em Março de 2015, escreveram uma carta ao ministro da Saúde, com conhecimento da Ordem dos Médicos e dos vários grupos parlamentares a dar nota dos relatos que lhe iam chegando.
“Pessoas com os seus diagnósticos clínicos completos e avalizados pela Ordem dos Médicos, ao tentarem contactar a URGUS, tanto são reencaminhadas para o Serviço de Psiquiatria como são encaminhadas para o Serviço de Cirurgia Plástica, revelando desde logo que a URGUS não dispõe de um serviço centralizado para receber novos utentes e os reencaminharem para a especialidade que efectivamente necessitam”, lê-se na carta.
“A informação prestada pelos diferentes serviços também é díspar: enquanto no Serviço de Psiquiatria informam os utentes de longas listas de espera, há relatos de que no Serviço de Cirurgia Plástica informam que não há pessoas para serem operadas. Relatos ainda mais preocupantes dão conta de utentes a quem é imposta a realização de novos exames e consultas com o fim de confirmar diagnósticos (mesmo quando estes utentes possuem relatórios detalhados dos seus diagnósticos, e o aval da Ordem dos Médicos).”
“A auditoria vem ao encontro das nossas expectativas e das nossas suspeitas”, refere Júlia Mendes Pereira. “Como diz o bastonário, a unidade não existe. O serviço nunca foi transparente. Ainda esta semana, uma pessoa que está nisto há seis anos, tem os dois diagnósticos, a autorização da Ordem dos Médicos, o nome mudado, ligou para lá para marcar consulta de triagem de cirurgia e disseram-lhe que precisa de uma requisição do hospital de origem”, conta. “Esta pessoa não é de Lisboa, nem do Porto, tem de fazer mais uma deslocação, com todos os gastos que isso engloba.”
A dirigente associativa lamenta que as pessoas transgénero não tenham sido ouvidas neste processo. Não só as que sentem que lhe está a ser negado o acesso à saúde. No seu entender, também era importante saber o que têm a dizer as pessoas que estão a fazer as cirurgias e como estão as que já passaram por isso.