O mercado que vive entre a curiosidade dos turistas e o esquecimento dos portuenses
Presidente da União de Freguesias do Centro Histórico do Porto diz que há um projecto de requalificação proposto à Câmara.
Entre a Travessa de S. Sebastião e a rua Tareija Vaz de Altaro, ali no Morro da Sé, há um mercado escondido. S. Sebastião dá o nome a um espaço de comércio que “já no tempo dos reis era um portal por onde vinham as mercadorias que chegavam à ribeira”. Quem o diz é Isabel que vende no mercado “desde que se conhece”. A peixeira é uma das seis que ainda ali permanecem. Cansadas de “promessas”, as vendedoras vão abandonando o mercado que entretanto não se transformou no “cartão-de-visita do centro histórico” que o presidente da União de Freguesias do Centro Histórico do Porto previra há quase dois anos.
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Entre a Travessa de S. Sebastião e a rua Tareija Vaz de Altaro, ali no Morro da Sé, há um mercado escondido. S. Sebastião dá o nome a um espaço de comércio que “já no tempo dos reis era um portal por onde vinham as mercadorias que chegavam à ribeira”. Quem o diz é Isabel que vende no mercado “desde que se conhece”. A peixeira é uma das seis que ainda ali permanecem. Cansadas de “promessas”, as vendedoras vão abandonando o mercado que entretanto não se transformou no “cartão-de-visita do centro histórico” que o presidente da União de Freguesias do Centro Histórico do Porto previra há quase dois anos.
O mercado é propriedade da Câmara Municipal, mas é gerido pela União de Freguesias do Centro Histórico. Questionado sobre a demora da implementação do projecto, o responsável admite que este tem o seu “tempo”. “Aqui não há culpados”, esclarece. E garante que está a “tentar melhorar aquele espaço”, com um projecto de requalificação, que já foi apresentado à autarquia, e que foi feita “uma visita ao terreno, há um ano e tal, quer com a Via Pública [Departamento Municipal de Mobilidade e Gestão da Via Pública], quer com o vereador do Ambiente”. Mas entretanto o tempo passou e nada acontece.
“É uma tristeza. A Sé era tão linda e agora não temos ninguém. Levaram o povo todo”, diz a peixeira que alerta para a desertificação de toda a zona envolvente à Sé do Porto, um dos ex-libris da cidade, presente no roteiro de qualquer visitante que chegue à cidade. “Mas são só turistas. A gente precisava de povo que morasse aqui na Sé”. Porque os turistas “gostam mas não compram nada”, salienta a vendedora.
Já Glória de Sousa, também peixeira, nasceu por entre aquelas velhas pedras, ali no número 14. Apesar de há mais de 20 anos morar em Campanhã, está sempre no seu bairro, no seu “rico mercadinho” e admite que este necessita de “muitas alterações e de ser mais falado, mais mostrado”. Uma visão que é partilhada por Isabel: “Estão sempre a falar no Bolhão. Nós temos mais de 100 anos, não é Maria da Aida?”. A peixeira sente-se ali “abandonada”, ao contrário do que acontece em Lisboa. “Lá ajeitaram os mercados, estão sempre a dar publicidade aos deles. Olha em Alfama, sempre a bombar e aqui na Sé ninguém bomba”, protesta.
António Fonseca diz que “se o mercado fosse mesmo da Junta”, existiria “outro tipo de responsabilidade”. Da Câmara, diz que recebe uma verba anual de 4 mil euros “que não dá para pagar à funcionária que está lá para fazer a limpeza”. O presidente da União de Freguesias do Centro Histórico do Porto acrescenta ainda que a maior parte das vendedoras “nem está a pagar nada e também não tem tido muito cuidado com as bancas”.
Para além da falta de visibilidade e de divulgação, as vendedoras consideram que as estruturas do mercado não ajudam ao trabalho. O que se pode perceber pelos plásticos que tentam tapar o gradeamento para impedir que a chuva e o vento entrem. Para Glória, é preciso fazer “umas obritas”: “fechar mais os gradeamentos, porque é muito frio”. A estrutura construída em cimento tem um jardim na parte superior, o que faz entrar a humidade. Um ambiente que também não atrai os clientes. “No ano passado, vieram aí a dizer que iam fazer isto e aquilo e não fizeram nada”, diz Maria Comunista. “Era para tapar isto com vidros mas era muito caro”, conta a vendedora.
Para António Fonseca, as prioridades na intervenção no mercado mantêm-se: colocar uma “boa sinalética” e uma iluminação nova porque “quem passa na avenida nem se apercebe do mercado”, explica. Para além disso, o responsável destaca a necessidade de se colocarem melhores equipamentos para os frescos, placas de acrílico, para substituir os plásticos que tentam travar o vento, e um “horário adaptado à necessidade local e turística”, para que a população, os visitantes e até os hotéis se tornem clientes. A “variedade de oferta” também é necessária ao mercado, nomeadamente, artesanato alusivo à cidade do Porto, produtos de merchandising da Câmara do Porto, dos Clérigos, e da Sé, refere António Fonseca. O presidente da União de Freguesias do Centro Histórico promete ainda reunir “brevemente” com as vendedoras do mercado.
Contactada pelo PÚBLICO, a Câmara do Porto remete explicações para a Junta de Freguesia, a quem compete a gestão do mercado.
Carminda Nobre, que ali vende desde catraia, aguarda por “melhores dias” porque “a gente não pode exigir muito que eles também não fazem”. Nos últimos tempos, já nem os Santos ajudam a equilibrar as contas. “Vendeu-se alguma coisinha mas não como nos outros anos. Quem é que você vê aqui?”, questiona Isabel, perante um mercado com apenas dois clientes que esperam que o peixe seja amanhado.
Texto editado por Ana Fernandes