Grande Alemanha
Segundo as agências Reuters e Bloomberg, no dia 29 de Junho de 2016, numa conferência em Berlim, o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, questionado sobre a situação do Deutsche Bank, respondeu que estava mais preocupado com a situação de Portugal. Que se Portugal não cumprir as regras orçamentais poderá vir a precisar de um novo programa de resgate. Não é a primeira vez que o senhor Schäuble faz este tipo de afirmações sobre Portugal quando questionado sobre a situação do Deutsche Bank, no que parece ser um reflexo pavloviano.
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Segundo as agências Reuters e Bloomberg, no dia 29 de Junho de 2016, numa conferência em Berlim, o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, questionado sobre a situação do Deutsche Bank, respondeu que estava mais preocupado com a situação de Portugal. Que se Portugal não cumprir as regras orçamentais poderá vir a precisar de um novo programa de resgate. Não é a primeira vez que o senhor Schäuble faz este tipo de afirmações sobre Portugal quando questionado sobre a situação do Deutsche Bank, no que parece ser um reflexo pavloviano.
É fácil de compreender o reflexo pavloviano do senhor Schäuble. Com a crise financeira de 2008, a banca alemã perdeu muito dinheiro no investimento que tinha realizado em ativos financeiros que se revelaram tóxicos, no outro lado do Atlântico. Esse investimento foi suportado pelas agências de rating, agências que até às vésperas da crise financeira de 2008 classificaram os referidos ativos financeiros de AAA. A partir de 2010, com a crise da Grécia e o apoio do então presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, o senhor Schäuble encontrou uma solução para resolver os problemas da banca alemã: impor a austeridade a todo o continente, apertar com as regras orçamentais europeias e lançar Estados-membros da coesão como Portugal às feras e/ou aos humores dos mercados financeiros. A seguir, a União Europeia, com a ajuda do Fundo Monetário Internacional, lá estará, como esteve e tem estado, para os resgatar. Primeiro, convertendo a dívida pública e privada dos Estados resgatados à banca, no caso, à banca alemã, em dívida pública dos referidos Estados aos Estados credores, incluindo o Estado alemão. Ou seja, os contribuintes dos Estados resgatados são forçados a salvar os seus próprios bancos para estes poderem pagar as dívidas aos bancos dos Estados credores, no caso, aos bancos alemães. Segundo, impondo, através do Conselho e do Eurogrupo, condições leoninas aos empréstimos concedidos aos Estados membros devedores. E assim tem vindo a Alemanha a resolver os problemas da respetiva banca. E assim será resolvido o problema do Deutsche Bank.
Que bom negócio é para a Alemanha ter uma zona euro incompleta, reduzida a um mero regime de câmbios fixos, e, em simultâneo, ter o controlo político duma União Europeia convertida numa Grande Alemanha, ainda mais com o recente "Brexit". O controlo político da União Europeia é conseguido quer pelo domínio que a Alemanha tem do Conselho, o diretório da União Europeia, quer por via da desconfiança dos mercados financeiros, alimentada, regularmente e intencionalmente, com declarações como estas últimas do senhor Schäuble. Portugal tem mesmo de estar preocupado com a situação do Deutsche Bank, pois o pagamento do buraco financeiro que lá existir vai caber aos portugueses, aos gregos, aos espanhóis, aos Estados-membros da coesão, às economias mais frágeis da União Europeia, com doses cavalares de austeridade.
Os nazis, nos campos de concentração, colocavam letreiros a dizer que “o trabalho liberta”, pois os prisioneiros morriam com os trabalhos forçados. No contexto do campo de concentração financeiro para que que os países da coesão foram remetidos na União Europeia, é caso para dizer “a austeridade liberta”, isto é, países como Portugal vão morrer, enquanto países independentes, basta ver a sangria de quadros jovens qualificados e o envelhecimento acelerado a que têm estado sujeitos desde 2010. Na prática, já foram convertidos à condição de colónias da Grande Alemanha que a União Europeia se tornou. Historicamente, não conheço caso nenhum em que os cidadãos das colónias tenham os mesmos direitos e deveres dos cidadãos da potência colonizadora. Em termos relativos, costumam ter menos direitos e mais deveres.
Professor da Católica Porto Business School, da Universidade Católica Portuguesa