Câmara de Oeiras insiste em empreendimento apesar de críticas da população

A resposta da autarquia à petição entregue pelos munícipes não deixou satisfeitos os signatários que planeiam nova acção judicial.

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Autarquia ainda não tem conhece data para início das obras DR

Durante esta segunda-feira, o ambiente na sala da biblioteca municipal de Oeiras aqueceu muito mais do que o clima faria prever, acompanhando a escalada da tensão entre o presidente da Câmara de Oeiras e os munícipes presentes. A causa? A discussão da petição “Vamos Salvar o Jamor” entregue à Assembleia Municipal em Novembro de 2015 e que se insurge contra a construção do projecto Porto Cruz, um “empreendimento megalómano, dispensável e que vai prejudicar o concelho”, segundo o grupo de munícipes.

O projecto, da empresa Silcoge, do grupo imobiliário SIL, abrange uma área de 27,6 hectares e prevê a construção de oito edifícios, cinco outras torres e três de habitação, comércio e serviços na margem direita do rio Jamor, na Cruz Quebrada, concelho de Oeiras. O investimento, privado, está estimado em 250 milhões de euros. O projecto prevê a demolição da antiga fábrica Lusalite, que tem suscitado várias denúncias pela acumulação de amianto. Na Câmara de Oeiras, o plano de pormenor onde se insere o projecto Porto Cruz foi aprovado com os votos a favor do PSD, PS e IOMAF (Isaltino Oeiras Mais à Frente) e os votos contra da CDU. Na Assembleia Municipal, apenas o PSD e o IOMAF votaram a favor. O PS absteve-se e o Bloco de Esquerda, CDU e CDS votaram contra. Apesar das críticas, o projecto irá avançar e segundo o presidente da Câmara de Oeiras, Paulo Vistas, embora “ainda não esteja prevista uma data de arranque” a conclusão deverá acontecer em 2020, afirmou durante a assembleia municipal.

Para o grupo de 300 signatários que quer impedir o projecto, a construção do Porto Cruz irá resultar na destruição da praia da Cruz Quebrada e na sua substituição por um aterro de betão, “em violação clara das regras do ordenamento do território”.

Ao PÚBLICO, Carlos Branco, presidente do grupo “Vamos Salvar o Jamor”, sublinhou o aumento do risco de inundação, os problemas para o trânsito local e o isolamento do Complexo Desportivo Nacional do Jamor como as consequências mais preocupantes.

Entre os pontos principais apontados na petição, o grupo aborda as consequências arquitectónicas e paisagísticas — um dos edifícios tem uma altura prevista de 20 andares — “numa zona atravessada por uma falha geológica, sujeita ainda a outros elevados riscos naturais (cheias, galgamentos marítimos e deslizamentos de terras) e que regista já actualmente um nível de ruído superior ao permitido por lei para este tipo de utilizações”.

O projecto irá ainda, segundo o grupo, aumentar as diferenças entre a margem direita (onde se localiza o projecto) e a margem esquerda do rio Jamor (onde vivem as populações das zonas baixas), uma vez que a construção de um bunker, ”uma muralha impenetrável contínua”, irá estender o risco de cheias para os empreendimentos adjacentes, considera.

À espera de receber uma explicação por parte de técnicos designados pela câmara de Oeiras, acordada em comissão de trabalho, o grupo de munícipes presentes na reunião foi surpreendido quando o próprio presidente da Câmara de Oeiras que se levantou para responder à petição. O autarca começou por dizer que as razões apresentadas pelos munícipes não são “razão substantiva para a alteração e revogação” do projecto e elogiou o empreendimento, nomeadamente os equipamentos previstos como a piscina, a marina, o heliporto e os jardins. “Os prazos foram cumpridos e as deliberações foram tomadas”, afirmou. “Não vale a pena fazer propostas demagógicas”, acrescentou. Além disso, o presidente da Câmara argumentou que “está em causa a saúde pública”, uma vez que “a descontaminação do amianto dos edifícios da antiga fábrica Lusalite depende do plano de pormenor”.

Técnicos ausentes

A ausência dos técnicos foi contestada pelos munícipes, mas também por alguns deputados, entre eles Joaquim Cotas e Isabel Sande e Castro (CDS), duas das vozes mais interventivas durante o debate. “A vinda dos técnicos foi aceite por unanimidade na Comisssão”, lembrou Joaquim Cotas, deputado da CDU e presidente da Comissão Permanente do Ambiente que acredita que a presença dos especialistas “poderia ajudar todos a perceber melhor o projecto”.
Já outras declarações tiveram o condão de voltar a incendiar os ânimos. Foi o caso do deputado Salvador Martins, do IOMAF: “Há organismos próprios que fazem a análise” dos projectos, notou, acrescentando que a assembleia não é “um regime de assembleias populares” e que não serve para responder aos pedidos dos munícipes.

As respostas dos membros do grupo “Vamos Salvar o Jamor” chegaram logo depois. O grupo fez questão de destacar que caso o projecto não seja revogado, “estas maiorias serão responsabilizadas por terem tomado essa decisão”. “A democracia não é só de quatro em quatro anos. O que estamos a fazer aqui hoje é democracia. E a democracia faz-se e perde-se todos os dias”, apontou Carlos Branco, presidente da associação.

Para este responsável, as respostas do autarca foram “genéricas e generalistas” e não responderam à maioria das perguntas colocadas pelo grupo. Além disso, Carlos Branco questionou os pareceres da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), uma vez que, em Agosto de 2012, o parecer da CCDR ao projecto era desfavorável. Segundo Carlos Branco, o grupo aguarda há mais de seis meses por um encontro com responsáveis deste organismo estatal mas ainda não obteve nenhuma resposta.

A tensão voltou a escalar quando o presidente do Conselho de Administração do grupo responsável pela obra, presente na assembleia, tomou a palavra e questionou onde estavam estas contestações quando começou a consulta do projecto. “É como esperarem que um aluno de Medicina, que passou anos a estudar, conclua o curso para só no fim lhe dizerem que não pode exercer”, exemplificou, argumentando que este é um projecto de décadas. Pedro Silveira sublinhou que a cultura da empresa não assenta em favoritismos partidários nem tão pouco quer destabilizar a população e por isso convidou a associação para um encontro onde o projecto possa ser apresentado com maior pormenor.

Ao PÚBLICO, o presidente da associação de munícipes, disse não estar convencido com a resposta da autarquia e garantiu que “na devida altura irá avançar com uma nova acção judicial”.

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Durante esta segunda-feira, o ambiente na sala da biblioteca municipal de Oeiras aqueceu muito mais do que o clima faria prever, acompanhando a escalada da tensão entre o presidente da Câmara de Oeiras e os munícipes presentes. A causa? A discussão da petição “Vamos Salvar o Jamor” entregue à Assembleia Municipal em Novembro de 2015 e que se insurge contra a construção do projecto Porto Cruz, um “empreendimento megalómano, dispensável e que vai prejudicar o concelho”, segundo o grupo de munícipes.

O projecto, da empresa Silcoge, do grupo imobiliário SIL, abrange uma área de 27,6 hectares e prevê a construção de oito edifícios, cinco outras torres e três de habitação, comércio e serviços na margem direita do rio Jamor, na Cruz Quebrada, concelho de Oeiras. O investimento, privado, está estimado em 250 milhões de euros. O projecto prevê a demolição da antiga fábrica Lusalite, que tem suscitado várias denúncias pela acumulação de amianto. Na Câmara de Oeiras, o plano de pormenor onde se insere o projecto Porto Cruz foi aprovado com os votos a favor do PSD, PS e IOMAF (Isaltino Oeiras Mais à Frente) e os votos contra da CDU. Na Assembleia Municipal, apenas o PSD e o IOMAF votaram a favor. O PS absteve-se e o Bloco de Esquerda, CDU e CDS votaram contra. Apesar das críticas, o projecto irá avançar e segundo o presidente da Câmara de Oeiras, Paulo Vistas, embora “ainda não esteja prevista uma data de arranque” a conclusão deverá acontecer em 2020, afirmou durante a assembleia municipal.

Para o grupo de 300 signatários que quer impedir o projecto, a construção do Porto Cruz irá resultar na destruição da praia da Cruz Quebrada e na sua substituição por um aterro de betão, “em violação clara das regras do ordenamento do território”.

Ao PÚBLICO, Carlos Branco, presidente do grupo “Vamos Salvar o Jamor”, sublinhou o aumento do risco de inundação, os problemas para o trânsito local e o isolamento do Complexo Desportivo Nacional do Jamor como as consequências mais preocupantes.

Entre os pontos principais apontados na petição, o grupo aborda as consequências arquitectónicas e paisagísticas — um dos edifícios tem uma altura prevista de 20 andares — “numa zona atravessada por uma falha geológica, sujeita ainda a outros elevados riscos naturais (cheias, galgamentos marítimos e deslizamentos de terras) e que regista já actualmente um nível de ruído superior ao permitido por lei para este tipo de utilizações”.

O projecto irá ainda, segundo o grupo, aumentar as diferenças entre a margem direita (onde se localiza o projecto) e a margem esquerda do rio Jamor (onde vivem as populações das zonas baixas), uma vez que a construção de um bunker, ”uma muralha impenetrável contínua”, irá estender o risco de cheias para os empreendimentos adjacentes, considera.

À espera de receber uma explicação por parte de técnicos designados pela câmara de Oeiras, acordada em comissão de trabalho, o grupo de munícipes presentes na reunião foi surpreendido quando o próprio presidente da Câmara de Oeiras que se levantou para responder à petição. O autarca começou por dizer que as razões apresentadas pelos munícipes não são “razão substantiva para a alteração e revogação” do projecto e elogiou o empreendimento, nomeadamente os equipamentos previstos como a piscina, a marina, o heliporto e os jardins. “Os prazos foram cumpridos e as deliberações foram tomadas”, afirmou. “Não vale a pena fazer propostas demagógicas”, acrescentou. Além disso, o presidente da Câmara argumentou que “está em causa a saúde pública”, uma vez que “a descontaminação do amianto dos edifícios da antiga fábrica Lusalite depende do plano de pormenor”.

Técnicos ausentes

A ausência dos técnicos foi contestada pelos munícipes, mas também por alguns deputados, entre eles Joaquim Cotas e Isabel Sande e Castro (CDS), duas das vozes mais interventivas durante o debate. “A vinda dos técnicos foi aceite por unanimidade na Comisssão”, lembrou Joaquim Cotas, deputado da CDU e presidente da Comissão Permanente do Ambiente que acredita que a presença dos especialistas “poderia ajudar todos a perceber melhor o projecto”.
Já outras declarações tiveram o condão de voltar a incendiar os ânimos. Foi o caso do deputado Salvador Martins, do IOMAF: “Há organismos próprios que fazem a análise” dos projectos, notou, acrescentando que a assembleia não é “um regime de assembleias populares” e que não serve para responder aos pedidos dos munícipes.

As respostas dos membros do grupo “Vamos Salvar o Jamor” chegaram logo depois. O grupo fez questão de destacar que caso o projecto não seja revogado, “estas maiorias serão responsabilizadas por terem tomado essa decisão”. “A democracia não é só de quatro em quatro anos. O que estamos a fazer aqui hoje é democracia. E a democracia faz-se e perde-se todos os dias”, apontou Carlos Branco, presidente da associação.

Para este responsável, as respostas do autarca foram “genéricas e generalistas” e não responderam à maioria das perguntas colocadas pelo grupo. Além disso, Carlos Branco questionou os pareceres da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), uma vez que, em Agosto de 2012, o parecer da CCDR ao projecto era desfavorável. Segundo Carlos Branco, o grupo aguarda há mais de seis meses por um encontro com responsáveis deste organismo estatal mas ainda não obteve nenhuma resposta.

A tensão voltou a escalar quando o presidente do Conselho de Administração do grupo responsável pela obra, presente na assembleia, tomou a palavra e questionou onde estavam estas contestações quando começou a consulta do projecto. “É como esperarem que um aluno de Medicina, que passou anos a estudar, conclua o curso para só no fim lhe dizerem que não pode exercer”, exemplificou, argumentando que este é um projecto de décadas. Pedro Silveira sublinhou que a cultura da empresa não assenta em favoritismos partidários nem tão pouco quer destabilizar a população e por isso convidou a associação para um encontro onde o projecto possa ser apresentado com maior pormenor.

Ao PÚBLICO, o presidente da associação de munícipes, disse não estar convencido com a resposta da autarquia e garantiu que “na devida altura irá avançar com uma nova acção judicial”.