E o que fazer em caso de "Bremain"?
O que vamos saber na próxima segunda-feira, após o referendo britânico e as eleições em Espanha, é se a Europa pode finalmente sair da crise.
A semana passada escrevi sobre o que fazer se no referendo de amanhã o Reino Unido optar por sair da União Europeia — o chamado Brexit. Hoje escrevo sobre o cenário da permanência, ou Bremain.
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A semana passada escrevi sobre o que fazer se no referendo de amanhã o Reino Unido optar por sair da União Europeia — o chamado Brexit. Hoje escrevo sobre o cenário da permanência, ou Bremain.
Com o partido Conservador dividido, o apoio de Cameron insuficiente e a direita inglesa maioritariamente do lado do Brexit, é preciso entender que o Reino Unido só ficará na UE com a mobilização do voto trabalhista e da esquerda. Uma vitória da permanência será necessariamente uma vitória das lideranças políticas à esquerda. E estas estão unanimemente a favor da permanência na UE. E atenção: trata-se das lideranças mais à esquerda em muitos anos, do trabalhista Jeremy Corbyn à deputada verde Caroline Lucas e à social-democrata líder escocesa Nicola Sturgeon.
O mesmo se passa com os mais importantes nomes intelectuais e culturais da esquerda britânica, de Paul Mason a Polly Toynbee e ao ambientalista George Monbiot, passando pelo cineasta Ken Loach e por Billy Bragg — o homem que me levou à festa do “Avante!” com a esperança de o ver tocar “A Internacional” na guitarra elétrica. (A esquerda portuguesa que torce pelo Brexit deveria, aliás, perguntar-se se esta gente está toda iludida.)
Mas acima de tudo deveríamos perguntar-nos: que defendem eles? Tal como a vitória do Brexit será inevitavelmente uma vitória política para as posições anti-imigração, uma vitória do Bremain, conquistada por estes líderes, tem de ser vista como a vitória política de quem exige uma Europa socialmente justa e ambientalmente sustentável. É isso que se espera que Corbyn leve aos socialistas europeus, Lucas aos verdes europeus, e quem sabe ambos a um Conselho Europeu daqui a um par de anos. A primeira tarefa para o governo português é a de, com outros, antecipar a exigência de um regresso da Europa à dimensão social.
Em segundo lugar, será sempre necessário reconhecer a mais séria das críticas à UE tal como ela existe hoje: o seu problema democrático. Ao invés de ir para um salto de integração, provavelmente em matéria de segurança, como França e Alemanha desejam, Portugal e outros países devem lembrar que os europeus não toleram mais integração sem mais democracia — ou seja, sem mais poder democrático no processo de decisão na Comissão e no Conselho, e sem mais acesso ao Tribunal de Justiça da UE.
Em terceiro lugar, a notícia mais importante de ontem: o Tribunal Constitucional Alemão reconheceu finalmente que é constitucional a compra de dívida soberana pelo Banco Central Europeu, e fê-lo depois de ter perguntado ao Tribunal de Justiça da UE se este programa de compra de dívida dos estados era compatível com os Tratados europeus. A resposta foi também positiva.
Faço parte daqueles que defendiam, desde pelo menos 2010, que a solução para a crise do euro passava pela compra de dívida soberana pelo BCE. Durante anos ouvimos como resposta que isto nunca aconteceria porque a Alemanha não permitiria. Agora já acontece e a Alemanha acabou por ter de aceitar.
Portanto, é possível uma Europa social e democrática. É possível uma Europa com uma Alemanha importante mas não dominante. O que vamos saber na próxima segunda-feira, após o referendo britânico e as eleições em Espanha, é se a Europa pode finalmente sair da crise.