Um cravo amarelo em defesa da liberdade de escola
PSP estima que estiveram perto de sete mil pessoas no protesto. Organizadores falam em 12 mil manifestantes.
O grande cravo amarelo de papel destaca-se entre a multidão ruidosa. Ouvimos com custo o nome de quem o transporta: Irene Santos, 65 anos, directora do colégio Didáxis de Riba D’ Ave. Explica-nos que tem participado em todos os protestos contra o fecho de turmas nos colégios privados com contratos de associação, que são financiados pelo Estado e, por isso, oferecem um ensino gratuito a parte dos alunos.
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O grande cravo amarelo de papel destaca-se entre a multidão ruidosa. Ouvimos com custo o nome de quem o transporta: Irene Santos, 65 anos, directora do colégio Didáxis de Riba D’ Ave. Explica-nos que tem participado em todos os protestos contra o fecho de turmas nos colégios privados com contratos de associação, que são financiados pelo Estado e, por isso, oferecem um ensino gratuito a parte dos alunos.
“O cravo significa a liberdade de escola”, afirma a professora, que dirige aquele estabelecimento de ensino, com mais de 1700 alunos, há 39 anos. O barulho atrapalha, por isso, fazemos questão de esclarecer: “Escola ou escolha?” “Escola. Nem pública, nem, particular e cooperativa. Só escola”, insiste a professora.
A ideia já tinha sido repetida antes de o protesto desaguar na Avenida dos Aliados, no centro do Porto, dez minutos antes da uma da tarde. Cristina Gonçalves, mãe de dois rapazes, um de 15 e um de nove, aguarda pelos restantes manifestantes, à sombra de uma árvore. Tem o filho mais velho no Instituto Nun'Alvares, em Santo Tirso, um colégio com contrato de associação e o mais novo, numa escola primária pública.
Foram as escolas que escolheu para os filhos. As que, acredita, melhor se adaptam a cada um deles. “Tinha uma escola primária de luxo a dois minutos de casa. Mas preferi colocar o meu filho numa escola primária de uma aldeia, com uma turma só com oito meninos e onde ele tem muita atenção”, justifica a mãe. Veio protestar porque não concorda que fechem turmas no colégio onde ela e o marido andaram, o Nun'Alvres, que tem um projecto educativo em que acredita.
Ao lado, está um amigo, Miguel Costa, que também veio ao protesto. O filho de 11 anos vai para o 7.º ano e não poderá manter-se no Nun'Alvres. Terá de ir para uma escola pública “com muitos problemas de violência”, argumenta a mulher, Madalena Silva, que tal como outros pais, teme a mudança. “Sim, o meu filho vai ter de ir para uma escola pública com estores eléctricos, um sistema sofisticado de circulação de ar que não funciona e candeeiros do Siza Vieira”, ironiza, brincando com a ideia de que os colégios são para uma elite com dinheiro e as escolas públicas para os mais desfavorecidos.
Vergílio Mota, 61 anos, professor no Colégio S. Miguel, em Fátima, junta-se à conversa. Também quer desconstruir a ideia de que os colégios são para uma elite e que recusam a entrada de alunos indesejados. “O meu colégio acolhe alunos de 17 nacionalidades, 32 institucionalizados, 76 com necessidades educativas especiais. Do conjunto de alunos, cerca de 1200, 406 beneficiam da acção social escolar”, debita num instante. “Estes é que são os ricos e privilegiados?” pergunta. A mulher Olinda professora num outro colégio em Leiria, está sentada ao lado. Diz ter 40 anos de serviço, sempre no privado, e teme ficar sem emprego.
Letras gigantes num relvado
A organização tem outra preocupação. Ao longo de todo o protesto insiste numa mensagem: as turmas com contrato de associação ficam mais baratas ao Estado em 25 mil euros, quando comparadas com as turmas da escola pública. A faixa que encabeçava a manifestação diz isso mesmo. "Custo por turma: contratos de associação 80.500 euros; os portugueses pagam na escola estatal 105 mil", lia-se. No local de concentração dos manifestantes, em Campanhã, a ideia já fora repetida. Os participantes juntaram-se e formaram letras gigantes num relvado perto da principal estação de comboios da cidade. “Poupamos 25.000 €”, escreveram num gigante puzzle humano.
Contudo, essa ideia não é consensual.O Tribunal de Contas (TdC) apresentou, em Outubro de 2012, um estudo sobre o custo médio por aluno, que lhe fora pedido pelo Parlamento na sequência do corte de financiamento aos colégios iniciado em 2011. O TdC fez os seus cálculos com base nos dados de 2009/2010, por serem estes os últimos que então existiam. Concluiu que o custo médio por aluno no ensino público era de 4415 euros, um valor que subia para os 4522 euros nos colégios com contrato de associação. Mas o próprio TdC alertava então que este valor não devia ser considerado para anos subsequentes, por não terem sido levados em conta os sucessivos pacotes de austeridade entretanto já aplicados e que levaram a uma diminuição significativa das despesas na educação.
Manuel Bento, do núcleo agregador Defesa da Escola Ponto, fazia um balanço "muito positivo" do protesto que dizia ter tido uma adesão "acima das expectativas". O organizador estimava que tivessem participado no protesto 12 mil pessoas, um número muito superior ao calculado pela PSP. O subcomissário Hélder Andrade explica que nas reuniões preparatórias os organizadores contavam com sete mil participantes, um valor que ficou "ligeiramente" aquém do real. "Estão claramente mais de cinco mil pessoas e um pouco menos de sete mil", estimou o responsável, que sublinha que a manifestação correu "sem qualquer incidente".