Já é possível viajar no tempo pela história do fado

O Museu do Fado lançou o Arquivo Sonoro Digital, que conta já com 3000 gravações do início do século XX.

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O Velho Fado da Mouraria, de Júlia Florista

A memória e a saudade já se cantam há mais de um século e cabem, agora, em 3000 fonogramas do Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado, em Lisboa. A banda sonora da história do fado, apresentada esta sexta-feira, é de acesso livre e inclui faixas de discos comercializados entre 1900 e 1950. O projecto, uma parceria entre o museu e o Instituto de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa, faz parte do Plano de Salvaguarda da candidatura do Fado à Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade (UNESCO).

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A memória e a saudade já se cantam há mais de um século e cabem, agora, em 3000 fonogramas do Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado, em Lisboa. A banda sonora da história do fado, apresentada esta sexta-feira, é de acesso livre e inclui faixas de discos comercializados entre 1900 e 1950. O projecto, uma parceria entre o museu e o Instituto de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa, faz parte do Plano de Salvaguarda da candidatura do Fado à Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade (UNESCO).

O Arquivo Sonoro Digital já disponível on-line permite a pesquisa por intérprete e repertório a partir de uma base de 529 artistas gravados por 43 companhias fonográficas. As faixas vão acompanhadas de uma ficha técnica que permite saber mais sobre cada uma. “Foram identificadas 30 mil faixas, por isso o arquivo é apenas 10% do trabalho que ainda há a fazer”, explicou Rui Vieira Nery, musicólogo e professor da Universidade Nova de Lisboa.

O repositório conta a história do fado desde o período que antecedeu a discografia electrónica – surgida em 1927 –, altura em que o género se circunscrevia, sobretudo, ao circuito dos artistas de revista. Podemos escutar Maria Victória, a “primeira fadista autêntica a cantar em revista”, num fado menor de 1915, e Júlia Florista, “conhecido nome das canções de fado que podemos ouvir agora pela primeira vez” no Velho fado da Mouraria. Pode ser encontrada, também, uma das primeiras gravações de Amália Rodrigues, O namorico da Rita, de 1950.

O arquivo contém também faixas de carácter político como A Portuguesa e o Fado do 31, que alude à revolta republicana do 31 de Janeiro, no Porto. Além de ecoar pelos bairros populares, o fado também se cantava no teatro e, por isso, começou a adquirir características dd canção – exemplo disso é A Carta do Ganga, de Estevão Amarante, uma crítica social e política.

Uma memória colectiva

Preservar a memória colectiva do fado é a prioridade do arquivo, que recorreu à digitalização para resgatar gravações do século XX com pior qualidade. Sublinhou Rui Vieira Nery que “a digitalização é um instrumento muito rico, porque podemos ter na mesma os nossos discos de 78 rotações e digitalizá-los para acesso de todos”. A recuperação de práticas do fado esquecidas é, segundo o musicólogo, “muito importante para a cultura e a história de Portugal”.

Sara Pereira, directora do Museu do Fado, referiu que o fado tem sofrido uma crescente “revitalização e promoção local e internacional” e é um “activo cultural histórico da cidade de Lisboa”. De acordo com dados do INE mencionados pela directora na apresentação do Arquivo, o fado teve, desde 2011, um aumento de 50% na sua expressão, sobrepondo-se a géneros como o jazz e o pop rock. Constitui, ainda, 60% das exportações da música portuguesa. Em Lisboa, existem 40 casas de fado, 30 das quais acolhem um elenco permanente, num total de 240 artistas que fazem do fado a sua segunda casa.

O fado é, também, um motor de “crescimento social económico da cidade e do país”, diz Fernando Medina. O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa referiu a importância da “reconciliação do fado como factor identitário” e elogia as novas gerações. “O fado atrai, sobretudo, em países que não sabem uma palavra de língua portuguesa, pela sonoridade e pela narrativa”, afirma. Também o secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado, salientou a “importância desta nossa expressão”.

O museu aproveitou a ocasião para lançar a editora Museu do Fado Discos, que pretende privilegiar projectos inéditos de artistas emergentes. Sara Pereira reconhece que “a editora pretende também servir de laboratório de captação e gravação de som” para os alunos de ciências musicais e sonoplastia da Universidade Nova. Com o objectivo de editar quatro a seis discos por ano, a editora estreia-se com o disco Tons de Lisboa, do guitarrista José Manuel Neto.

O Arquivo Sonoro Digital pretende aumentar, gradualmente, o seu acervo e integrar os registos de faixas existentes em colecções públicas e privadas. Para já, são cinco décadas de história do fado que proporcionam ao público uma viagem pelo tempo de xaile preto e saudade ao peito.

Texto editado por Inês Nadais