Pânico no PSOE: quem será o segundo?
Antes de se discutirem as coligações de governo ou de se repetir um bloqueio negocial, a grande questão é saber quem será o segundo partido nas eleições do dia 26.
Uma palavra (italiana) domina a campanha eleitoral espanhola: sorpasso. A duas semanas do voto, as sondagens prognosticam que a coligação Unidos Podemos (UP) ultrapassará o PSOE em votos e mandatos, o que subverteria o tabuleiro político espanhol. O UP engloba o Podemos, os seus associados regionais e a Esquerda Unida (IU). A "frente ampla" com a comunista IU foi exactamente concebida para superar o PSOE em votos e deputados.
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Uma palavra (italiana) domina a campanha eleitoral espanhola: sorpasso. A duas semanas do voto, as sondagens prognosticam que a coligação Unidos Podemos (UP) ultrapassará o PSOE em votos e mandatos, o que subverteria o tabuleiro político espanhol. O UP engloba o Podemos, os seus associados regionais e a Esquerda Unida (IU). A "frente ampla" com a comunista IU foi exactamente concebida para superar o PSOE em votos e deputados.
Quem será o segundo? A última sondagem do Centro de Investigaciones Sociológicas (CIS) prenuncia um cataclismo para os socialistas, que perderiam para Pablo Iglesias a liderança da esquerda. É a questão-chave. Tem mais consequências para o sistema político do que saber se será o bloco de esquerda ou o de direita a somar mais deputados.
O objectivo do Podemos é ocupar o espaço do PSOE, substitui-lo como alternativa ao PP e relegá-lo para o papel de força de apoio. Iglesias "estende a mão" aos socialistas para fazerem uma coligação governamental "progressista" e ao mesmo tempo assume-se como a "nova social-democracia" perante a "velha social-democracia" que o PSOE representaria. Lembra que "o comunismo é uma tradição política que nasce como cisão prática e teórica da social-democracia. Por isso, Lenine, Marx e todos os comunistas do século XIX eram de partidos social-democratas (...)." A isto, atacando em todos os azimutes, acrescenta o "apelo à pátria".
O Podemos conseguiu dar credibilidade ao cenário do sorpasso e precisa de o consolidar antes da votação, de modo a apresentar-se como a única força capaz de desafiar o Partido Popular (PP) e, portanto, como o único "voto útil" contra a direita. Para o PSOE é vital manter-se como segunda força, pelo menos em mandatos, sob pena de correr o risco de um processo de desagregação.
Segundo a mega-sondagem do CIS (17.000 entrevistas realizadas em Maio), o PP teria 29,2% dos votos e entre 118-121 deputados; o UP 25,6% dos sufrágios e de 88 a 92 mandatos; o PSOE 21,2% e 78 a 80 deputados; o Cidadãos 14,6% e 38 ou 39 mandatos. O resto vai para partidos nacionalistas. Esta distribuição pouco varia em relação a Dezembro. É a coligação UP que muda o quadro e permite a sua superioridade sobre o PSOE.
Um estudo realizado pelo politólogo Kiko Llaneras — não uma sondagem mas a ponderação de dezenas de sondagens e resultados anteriores de forma a permitir 15.000 simulações do número de deputados dos partidos — traça um quadro muito próximo. Este estudo, que inclui as sondagens posteriores ao trabalho de campo do CIS, reduz a diferença entre a soma do PP e Cidadãos e a do UP-PSOE: 162 e 164 mandatos, respectivamente.
Previne o politólogo Pablo Simón que é preciso dar atenção a que sondagem do CIS é, como todas, "um fotograma de uma película em movimento": em Dezembro, 36% dos eleitores decidiram o voto durante as duas semanas da campanha. O jogo está em aberto. E tudo se vai resolver ao milímetro: segundo o CIS, uma descida do PSOE de oito décimas de votos poderia custar-lhe a perda de dez ou doze mandatos. Por isso, prudência.
Esquerda e centro
O PSOE está numa posição difícil. Não vale a pena falar nas divisões internas e no peso das "baronias territoriais" que fazem do PSOE uma quase confederação de feudos regionais. Os jornalistas retratam um quadro de "desmoralização" e "pânico", sublinhando a "solidão" de Sánchez no meio dos "barões".
O Podemos flagela os socialistas e estes mostram indecisão na resposta. A estratégia eleitoral socialista consistiu em fazer do PP o seu único alvo — "nós ou o PP" — o que levou Sánchez a fazer da negociação com Rajoy uma "linha vermelha", acabando por diminuir a sua margem de manobra nas negociações.
Sánchez tem procurado a todo o custo evitar o confronto directo com o Podemos. Ele próprio declarou há dias numa entrevista: "Pablo Iglesias não é nosso adversário, mas sim as políticas do PP (...)." Mesmo sob a ameaça e as provocações de Iglesias, não ousou pôr em relevo o choque de políticas e valores, da política económica à questão da integração europeia ou da ordem internacional. Não valorizou o seu programa perante o discurso do Podemos que não quer discutir as políticas concretas e joga tudo no sentimento de enfado e decepção dos "eleitores zangados". Sánchez não esclareceu a questão estratégica que obceca os socialistas: é o Podemos um aliado virtual ou uma força antagónica?
Para evitar o sorpasso, Sánchez tem de olhar simultaneamente para a sua esquerda, onde pela primeira vez tem um adversário poderoso, e para os eleitores do centro, escreve o politólogo Sebastián Lavezzolo. O contexto político mudou com o multipartidarismo. E tanto o Podemos como o PP lançaram-se numa estratégia de "polarização ideológica". Iglesias quer monopolizar o combate contra Rajoy, enquanto este joga no reflexo do medo e no seu papel de barreira perante o "extremismo". Esta "polarização ideológica" não interessa ao PSOE, pois tende a reforçar o reflexo do "voto útil" nos adversários ou a abstenção. É no centro-esquerda que se verifica maior indecisão. Segundo o CIS, esta área representa 21% do eleitorado e será decisiva, pelo voto ou pela abstenção.
"Deveria [Sánchez] lançar-se na batalha pela hegemonia da esquerda", ou seja, dar prioridade a uma viragem à esquerda? "Ou deveria aguentar o melhor possível a sua posição no centro e no centro-esquerda?" — interroga-se Lavezzolo. Por um lado, "o PSOE é o partido mais próximo da posição do eleitor médio em Espanha". Por outro, é escassa a possibilidade de recuperar votos que fugiram para o Podemos.
A questão do governo
Se Iglesias conseguir o sorpasso, é natural que reivindique o papel de pivot nas negociações de uma alternativa governamental de esquerda. Retiraria a iniciativa a Sánchez, remetendo-o para uma posição marginal. Iglesias quer ser candidato à chefia do governo. Já não se trata de uma miragem, mas de uma hipótese fundada — e que não cabe abordar neste texto.
À primeira vista, este cenário beneficiaria a estratégia de polarização de Rajoy, excepto se a soma do conjunto da esquerda for maioritária, caso em que o PP apostaria na inevitabilidade da "grande coligação" com o PSOE.
Esta é uma questão que dilacera os socialistas, cuja maioria dos eleitores, sobretudo à esquerda, recusa categoricamente um acordo com o PP. Mas os resultados prováveis das eleições não permitem afastar este cenário, explica o politólogo Lluis Orriols. "Os custos desta decisão podem ser muito elevados. Mas o PSOE tem uma via para reduzir esses custos: convencer a opinião pública de que esta é a única opção viável para evitar novas eleições."
Cita um recente inquérito de Kiko Llaneras: "a maioria dos eleitores do PSOE, cerca de 70%, prefere uma grande coligação a ir a terceiras eleições (...) e apenas 20% preferem um governo de esquerda a uma grande coligação." Para mais, o eleitorado do centro opõe-se a uma coligação do PSOE com Iglesias e os nacionalistas. É uma escolha dramática em que o PSOE se arrisca a muito perder, dividindo-se e deixando o monopólio da oposição ao Podemos.
Se as coisas correrem mal, o PSOE entrará em convulsão na noite de 26. Lembremos apenas que tudo está ainda em aberto.