Associações denunciam empresa que promove actividades com "artista anão"
Uma empresa de organização de eventos publicita actividades de diversão que incluem bowling, “striptease cómico” e “arremesso de anões”.
A Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes (CNOD) e a Associação Nacional de Displasias Ósseas (ANDO) denunciam as actividades de diversão promovidas pela empresa de organização de eventos Mundial Eventos. As associações alegam que a empresa organiza actividades que incluem o arremesso, “striptease cómico” e bowling com um homem com nanismo. As associações consideram, em comunicado, que estas actividades “atentam contra a dignidade humana”.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes (CNOD) e a Associação Nacional de Displasias Ósseas (ANDO) denunciam as actividades de diversão promovidas pela empresa de organização de eventos Mundial Eventos. As associações alegam que a empresa organiza actividades que incluem o arremesso, “striptease cómico” e bowling com um homem com nanismo. As associações consideram, em comunicado, que estas actividades “atentam contra a dignidade humana”.
Ambas as associações confirmaram ao PÚBLICO que a empresa eliminou os posts no Facebook relativos a estas actividades, assim como algumas páginas no site. No entanto, ainda é possível encontrar, no site da empresa, informações relativas ao “espectáculo de striptease cómico – Anão”. Segundo o site, a empresa oferece “um pequeno stripper de grande talento”. Uma actividade que a empresa descreve como “animação cómica por natureza”. O “espectáculo” publicitário tem um custo a partir de 159,90 euros por grupo.
Ainda na página relativa ao “Arremesso do Anão”, a que o PÚBLICO teve acesso, é possível ler-se que este “jogo” pode ser realizado “em qualquer local escolhido por si”. As regras ditam que os participantes “lancem o animador anão o mais longe possível, dentro de uma determinada zona, definida como zona de segurança. O jogador que conseguir arremessar o animador o mais longe possível, é obviamente o vencedor.”
Quando contactada pelo PÚBLICO, a Mundial Eventos remeteu para um comunicado publicado no Facebook da empresa e recusa outras declarações. Pedro Raposo, responsável e proprietário da marca, justifica na rede social que as actividades em causa são exercidas por “um profissional de animação, que exerce a sua actividade há cerca de seis anos, tem página própria onde promove os seus espectáculos, sendo a Mundial Eventos apenas uma agência que os promove”. A empresa acredita que todos os espectáculos “são realizados no exercício da plenitude dos direitos e capacidades” dos seus profissionais. “Não obrigámos o artista a realizar nenhum espectáculo.”
Pedro Raposo defendeu na rede social que "o colaborador da Mundial Eventos é um homem adulto, no pleno exercício das suas capacidades e que, de forma livre e esclarecida, decidiu fazer os espectáculos que realiza". Ainda em comunicado, o empresário acredita que “a recusa, por parte da Mundial Eventos, em promover tais espectáculos, consubstanciaria, isso sim, uma discriminação ao artista em causa em função das suas características físicas”.
A denúncia terá surgido depois do alerta de uma sócia da ANDO, que leu o artigo Quem quer lançar um anão? sobre a empresa, publicado pela revista Visão. O artigo questiona se está é uma questão de “livre arbítrio ou atentado à dignidade”.
As associações encaram este tipo de actividades como “um profundo retrocesso que promove a humilhação, que atenta contra a dignidade humana e que viola os direitos das pessoas com deficiência foi já proibida noutros países”. A CNOD e a ANDO pretendem pedir uma auditoria à Assembleia da República, confirmou ao PÚBLICO Jorge Silva, da CNOD. Inês Alves, presidente da ANDO, afirma que já terá contactado a secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, sem resposta até ao momento.
Inês Alves destaca as implicações físicas, “para além da chacota de que são alvo”, que este tipo de actividades pode ter para um pessoa com nanismo. “O arremesso e o bowling com pessoas com este tipo de condição genética podem comportar riscos neurológicos”. Inês Alves destaca que pessoas com um tipo de nanismo podem facilmente estar em risco, uma vez que a doença pode acarretar várias debilidades físicas. Pessoas com displasia esquelética (condição que dá nome à ANDO) têm alguns dos seus órgãos com um tamanho desproporcional à sua altura.
A Mundial Eventos justificou no comunicado que “não pode deixar de estranhar o facto de todos não terem qualquer tipo de preocupação em questionar a opinião deste [artista] sobre os espectáculos que realiza, como se as suas características físicas o levassem a padecer de uma incapacidade mental genérica de entendimento, que necessitasse de ser suprida”.
Jorge Silva relembra a polémica gerada em 2002, quando surgiram acusações de que a proibição do arremesso de anões em França era discriminatória. A ONU deu apoio à lei francesa. Já nos anos 1990, estados norte-americanos como Illinois, Nova Iorque e Flórida tinham proibido este tipo de prática.
A Constituição da República Portuguesa não se pronuncia directamente sobre esta prática. No entanto, os presidentes das associações destacam que a Constituição, a legislação e a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência “são claras no combate à exclusão, ao preconceito e na defesa da dignidade humana” .
Texto editado por Hugo Torres