Tribunal condena Cresap a mostrar documentos a candidato excluído de concurso
Comissão que recruta altos cargos da Administração Pública diz que já cumpriu decisão, mas queixoso garante que ainda não conseguiu consultar a informação que pretende.
O Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa condenou em finais de Março passado a Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública (Cresap) a dar acesso a toda a documentação que faz parte de um concurso para vogal do Laboratório Nacional de Energia e Geologia a um candidato que foi excluído desse procedimento. A Cresap assegura, numa nota enviada ao PÚBLICO, que já cumpriu a decisão a 30 de Março passado, mas o queixoso, António Cardoso, garante que ainda não conseguiu consultar a informação que pretende.
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O Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa condenou em finais de Março passado a Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública (Cresap) a dar acesso a toda a documentação que faz parte de um concurso para vogal do Laboratório Nacional de Energia e Geologia a um candidato que foi excluído desse procedimento. A Cresap assegura, numa nota enviada ao PÚBLICO, que já cumpriu a decisão a 30 de Março passado, mas o queixoso, António Cardoso, garante que ainda não conseguiu consultar a informação que pretende.
António Cardoso é engenheiro civil, doutorado pelo Técnico de Lisboa, investigador do Laboratório Nacional de Engenharia Civil e professor da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa. Assegura ao PÚBLICO que só recebeu esta terça-feira, já depois de o PÚBLICO ter questionado a Cresap sobre este caso, um e-mail a combinar a consulta do processo.
Esta quinta-feira, após a publicação da notícia, a Cresap veio admitiu "um lapso" na execução do despacho de 30 de Março, que permitiria a consulta de todo o processo ao queixoso, precisando que o mesmo não foi executado pelo secretariado. "Foram tratadas as questões das custas, mas, inadvertidamente, não se deu logo andamento à comunicação ao reclamante", refere a Cresap, num email enviado ao PÚBLICO. "Mal o secretariado teve conhecimento de que o candidato vinha à Cresap para ser entrevistado no âmbito de outro concurso, procedeu à comunicação em causa através de e-mail", sustenta. Facto é que essa mensagem de correio electrónico foi enviada ao queixoso duas horas após a Cresap ter recebido o pedido de esclarecimentos do PÚBLICO sobre este caso.
Não é a primeira vez que a versão da Cresap é posta em causa neste caso. A comissão, na nota enviada ao PÚBLICO, garante que já respondeu à reclamação do queixoso apresentada em Agosto do ano passado “através de e-mail de 21 de Setembro de 2015”. No entanto, a própria decisão do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa desmente essa tese. Isto porque na sentença, datada de 22 de Março e assinada pela juíza Paula Mestre Vinagre, a Cresap é intimada “a satisfazer, no prazo de dez dias, o pedido de informação formulado pelo requerente, concretamente, a facultar-lhe o cabal acesso à documentação que integra o procedimento concursal n.º 575 mediante consulta, com prévia marcação de data e, bem assim, a ser-lhe comunicada a decisão que recaiu sobre a reclamação de 24 de Agosto" do ano passado. Sobre a resposta à reclamação, a decisão refere de seguida, entre parêntesis: “ou, caso seja inexistente, qual a previsão para que a mesma seja proferida”.
A reclamação do queixoso alega que o concurso apresenta “vários vícios”, nomeadamente o facto de considerar como factor preferencial “independência relativamente à carreira de investigação científica”. Mais tarde, o investigador descobre que um dos candidatos indicou no currículo possuir o doutoramento, um grau que teria concluído em Junho de 2015, mas que na realidade não obteve. “Por consulta na biblioteca nacional e na Universidade Lusíada, não encontrei nenhum doutoramento defendido pelo candidato”, explica ao PÚBLICO António Cardoso. Por isso, estranhou que o presidente da Cresap e do júri, João Bilhim, tivesse atribuído uma nota superior a este candidato do que a si, que é doutorado desde 2004.
A Cresap garante que o tal candidato, que já tinha feito a parte curricular do doutoramento e teria marcado para o primeiro semestre de 2015 a defesa da tese, nunca foi classificado como doutor.
24 pessoas para um lugar
Este caso começou em Fevereiro do ano passado, altura em que António Cardoso concorreu a um lugar de vogal do Laboratório Nacional de Energia e Geologia. O candidato foi um dos seis seleccionados para a entrevista, já que na primeira fase do concurso conseguira uma avaliação curricular de 13,5, a quarta melhor entre as 24 pessoas que concorreram ao lugar. A 14 de Agosto, é notificado por João Bilhim de que não chegara a integrar a lista final de candidatos.
Passados três dias, António Cardoso solicita as actas do concurso e, quatro dias depois, a votação discriminada de cada um dos elementos do júri relativa ao currículo dos candidatos. Pede ainda acesso aos resultados das provas psicotécnicas e aos currículos de cada um.
A 24 de Agosto entrega em mão uma reclamação na Cresap. Quatro dias mais tarde chega a primeira resposta aos pedidos de informação, que só continha uma parte dos dados pedidos. Sem acesso à documentação pretendida, António Cardoso decide interpor, em meados de Setembro, uma acção no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, solicitando que a Cresap fosse obrigada a prestar-lhe a informação que pretendia e a responder-lhe à reclamação apresentada no final de Agosto.
Citada pelo tribunal para responder ao pedido, a Cresap informa a juíza de que “toda a documentação e informação solicitada foi enviada”. A versão é desmentida pelo candidato, que garante que a Cresap “continua a omitir relevantes informações”, já que continua sem conseguir consultar os resultados das provas psicotécnicas e a votação discriminada por itens de cada elemento do júri. A Cresap acaba por enviar os resultados dos exames psicotécnicos ao tribunal, mas não as votações discriminadas por itens. Na decisão, a juíza admite que a Cresap já facultou ao queixoso “vasta informação relativa ao procedimento concursal em causa”, mas “não foi facultada a consulta pretendida para que o requerente possa obter a informação que considera em falta, nem lhe foi comunicada a decisão da reclamação por ele apresentada”. A magistrada sublinha que é um “ dever” da comissão “facultar tal acesso, sem que tenha fundamento para a recusa”. E condena a Cresap.