Vai ser mais fácil perder a carta com o sistema de pontos

Em causa está o facto de para o antigo regime de cassação da carta só contarem as contra-ordenações graves e muito graves. Agora os crimes rodoviários também pesam — e muito.

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Nos últimos seis anos foram cassadas apenas 35 cartas em Portugal. Foto: Fernando Veludo/nFactos

Os perto de seis milhões de condutores existentes em Portugal – o número exacto não foi disponibilizado pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes – vão ganhar esta quarta-feira 12 pontos no arranque do novo sistema de carta por pontos. Apesar de todos os condutores começarem com os mesmos pontos, independentemente das infracções que cometeram no passado, não há motivos de satisfação para os prevaricadores. É que o novo sistema torna mais fácil a perda da carta, porque inclui para efeitos de cassação do título de condução não só as infracções graves e muito graves, como também os crimes rodoviários. 

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Os perto de seis milhões de condutores existentes em Portugal – o número exacto não foi disponibilizado pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes – vão ganhar esta quarta-feira 12 pontos no arranque do novo sistema de carta por pontos. Apesar de todos os condutores começarem com os mesmos pontos, independentemente das infracções que cometeram no passado, não há motivos de satisfação para os prevaricadores. É que o novo sistema torna mais fácil a perda da carta, porque inclui para efeitos de cassação do título de condução não só as infracções graves e muito graves, como também os crimes rodoviários. 

Até aqui o processo administrativo, decidido pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), e o processo-crime, nas mãos dos tribunais, eram autónomos e só as contra-ordenações graves e muito graves é que contavam para efeitos de cassação da carta.  

Para tal era necessário que condutores cometessem três infracções muito graves ou cinco entre graves e muito graves no espaço de cinco anos. A partir de agora, além das contra-ordenações graves (que implicam perda de dois ou três pontos) e das muito graves (que implicam a perda de quatro ou cinco pontos) também vão contar os crimes rodoviários, que vão descontar metade dos pontos atribuídos inicialmente a cada condutor. Ou seja, independentemente da sanção atribuída pelos tribunais, o condutor que for condenado por um crime rodoviário vai perder seis pontos na carta. No rol destes ilícitos criminais está incluída a condenação de uma pessoa apanhada a conduzir com uma taxa de alcoolemia igual ou superior a 1,2g/l  no sangue, condução sem carta, homicídio negligente em acidente rodoviário, omissão de auxílio e condução perigosa, entre outros.

Efeito de descida na sinistralidade

Essa alteração é destacada por Alain Areal, director-geral da Prevenção Rodoviária Portuguesa (ANSR), que espera que o novo modelo faça descer a sinistralidade nas estradas portuguesas pelo menos no primeiro ano de funcionamento. “Um estudo europeu que avaliou o impacto da adopção da carta por pontos em vários países concluiu que no primeiro ano há um decréscimo da sinistralidade”, afirma Alain Areal. O dirigente daquela associação atribui essa descida ao acréscimo de notícias sobre segurança rodoviária, que aumenta a percepção da fiscalização e induz comportamentos mais seguros. “Os estudos mostram que passado algum tempo existe alguma recuperação da sinistralidade. Vamos ver o que acontece em Portugal”, refere Alain Real.

O presidente da presidente da ANSR, Jorge Jacob, reconhece numa pequena entrevista ao PÚBLICO que com o novo sistema será mais fácil perder a carta. Mas apresenta outros motivos. “É expectável que o novo sistema de cassação seja mais eficaz, no sentido em que não depende do factor tempo. A subtracção total dos pontos, que leva à cassação da carta, não tem limite temporal”, afirma Jorge Jacob. O presidente da ANSR realça, por outro lado, que no novo sistema há mais situações que levam à perda da carta. “Caso o condutor não frequente a acção de formação quando tiver cinco ou quatro pontos, não realize a prova teórica do exame de condução quando tiver três ou menos pontos ou reprove na mesma, verá cassada a carta de condução, tendo de esperar dois anos para tirar uma nova carta”, enumera o líder da autoridade. E remata: “Estas medidas são fortemente dissuasoras de comportamentos de risco”.

Menos optimista estão o presidente do Automóvel Clube de Portugal, Carlos Barbosa, e o presidente da Associação dos Cidadãos Auto-mobilizados (ACA-M), Manuel João Ramos, que temem que as vantagens do novo sistema sejam anuladas pelas deficiências na fiscalização e  no processamento das multas. Além da falta de meios da autoridade que processa as contra-ordenações, Carlos Barbosa insiste que há erros cometidos na criação da própria ANSR. “Não faz sentido ter uma autoridade a processar as multas e todo o processo relativo aos condutores estar numa outra entidade, o Instituto da Mobilidade e dos Transportes”, resume o dirigente do automóvel club.

35 cartas cassadas em seis anos

Por isso, não se surpreende com as 35 cassações de cartas ocorridas nos últimos seis anos, um número avançado esta terça-feira pelo secretário de Estado da Administração Interna, Jorge Gomes. “Para não contratarem mais pessoas a processar contra-ordenações, perdem milhões em coimas”, critica Carlos Barbosa.

As 35 cartas apreendidas em seis anos, parecem irrisórias quando comparadas com as mais de 203 mil cartas cassadas em Espanha até final de Junho do ano passado, contabilizadas pelas autoridades espanholas no balanço dos nove anos da introdução da carta por pontos, que arrancou em 2006. "Em seis anos e em mais de seis milhões de processos contra-ordenacionais, resultaram 35 cartas cassadas. Isto demonstra a ineficácia de um sistema", reconhece Jorge Gomes, à Lusa.

Manuel João Ramos lembra que um estudo recente mostrou que Portugal e a Roménia têm os níveis de fiscalização rodoviária mais baixos da Europa. “Seremos todos bons condutores se as polícias não tiverem meios para fiscalizar as infracções e a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária não tiver pessoal para processar as contra-ordenações”, resume o presidente da ACA-M.