Câmara de Lisboa tomou posse administrativa de prédios para construir mesquita
Proprietário vai ter de sair de dois prédios que tinha recuperado recentemente e que agora vão ser destruídos.
A Câmara de Lisboa tomou nesta segunda-feira posse administrativa de dois prédios na Rua do Benformoso, onde vai ser construída a futura mesquita da Mouraria, num processo de expropriação muito contestado pelo proprietário dos imóveis.
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A Câmara de Lisboa tomou nesta segunda-feira posse administrativa de dois prédios na Rua do Benformoso, onde vai ser construída a futura mesquita da Mouraria, num processo de expropriação muito contestado pelo proprietário dos imóveis.
Em declarações aos jornalistas, António Barroso disse que situações destas “nunca deveriam existir num país onde as pessoas têm alguns direitos”.
Em causa está um processo de expropriação por interesse público que a autarquia iniciou para deitar abaixo alguns prédios naquela zona.
António Barroso é uma das pessoas afectadas pela decisão camarária e recebeu a informação de que vai receber uma indemnização no valor de 530 mil euros para sair dos dois prédios na Rua do Benformoso que recentemente recuperou.
O prédio mais pequeno tem apenas rés-do-chão e cave, com 70 metros quadrados (m2) por piso, e destina-se ao comércio, enquanto o outro tem 100 m2 de área útil por piso. Destina-se também ao comércio no rés-do-chão, o primeiro andar é a habitação do proprietário e o segundo andar e o sótão servem para arrendamento de curta duração.
O proprietário, que mora e trabalha há mais de 40 anos na Mouraria, apresentou uma contraproposta no valor de 1,99 milhões de euros, mas “foi recusada”.
Segundo António Barroso, aquele valor engloba os valores actuais do mercado, o dinheiro que investiu nas obras e parte da sua vida.
Depois de se ter recusado a assistir à posse administrativa dos imóveis, o proprietário saiu de casa no final para mostrar o desalento por uma situação que classificou de “desumana”.
“Não perdi a esperança. Há de haver alguém que tenha bom senso porque isto não se faz”, frisou.
“Como é que a câmara vem destruir uma casa que eu reconstruí? Na qual cumpri com os objectivos que eles tinham?”, questionou o proprietário.
Afirmando que “não se opõe à construção” da mesquita, António Barroso, de 63 anos, disse não compreender porque é que a autarquia não optou por edificá-la em locais onde existem prédios devolutos.
O proprietário disse ainda que “sempre esteve disposto a negociar”, mas a câmara “nunca fez qualquer proposta".
Questionado sobre a indemnização que a autarquia lhe quer dar, considerou que está abaixo do real valor dos dois prédios e exemplificou afirmando que “não consegue encontrar um apartamento na Mouraria [nas mesmas condições do seu] por menos de 400 ou 450 mil euros e a câmara quer dar por um prédio 402 mil euros”.
Na semana passada, a advogada de António Barroso interpôs uma providência cautelar para suspender a posse administrativa dos edifícios, mas ainda está a ser apreciada pelo tribunal.
Aos jornalistas, Tânia Mendes admitiu hoje que é muito difícil travar o processo já iniciado pela câmara, mas aguarda pela decisão do juiz.
Hoje foi dado o primeiro passo do processo de expropriação e foi comunicado ao proprietário e aos seus inquilinos que podem permanecer no local até serem oficialmente notificados para sair.
Até lá, as rendas também deverão ser pagas normalmente ao proprietário.
A Câmara de Lisboa aprovou em Outubro de 2015 a requalificação das ruas da Palma e do Benformoso, na Mouraria, que assenta na criação de uma praça coberta, um jardim e uma nova mesquita para a comunidade muçulmana até meados de 2017.
A Lusa contactou no dia 17 a Câmara de Lisboa para obter mais esclarecimentos sobre a expropriação, mas ainda não obteve resposta. Segundo o município, as questões têm de ser analisadas por diferentes serviços, tendo em conta a complexidade do assunto.