Teixeira dos Santos confirmado na presidência do BIC Portugal

O nome do ex-ministro das Finanças já foi apresentado informalmente ao BdP. BIC cresceu com compra do BPN, nacionalizado por Teixeira dos Santos.

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Teixeira do Santos era ministro das Finanças quando o BPN, depois comprado pelo BIC, foi nacionalizado Miguel Manso

O ex-ministro das Finanças Fernando Teixeira dos Santos vai ser o próximo presidente-executivo do banco luso-angolano BIC Portugal, onde Isabel dos Santos domina com 42,5% do capital. O PÚBLICO apurou que a escolha de Teixeira dos Santos já foi comunicada ao Banco de Portugal (BdP), que fez saber que não se oporá à sua nomeação numa próxima assembleia-geral.

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O ex-ministro das Finanças Fernando Teixeira dos Santos vai ser o próximo presidente-executivo do banco luso-angolano BIC Portugal, onde Isabel dos Santos domina com 42,5% do capital. O PÚBLICO apurou que a escolha de Teixeira dos Santos já foi comunicada ao Banco de Portugal (BdP), que fez saber que não se oporá à sua nomeação numa próxima assembleia-geral.

A indicação de Teixeira dos Santos, economista e ex-presidente da CMVM, para liderar o BIC Portugal no triénio 2016/2018 surge depois de o BdP ter recusado validar a idoneidade a Jaime Pereira para o exercício das funções de gestão. Jaime Pereira foi a primeira escolha dos accionistas do BIC Portugal para substituir Luís Mira Amaral, cujo mandato à frente da comissão executiva terminou em Dezembro. 

Por seu turno, o conselho de administração (não executivo) do BIC Portugal vai ser encabeçado por Diogo Barrote, como revelou à Lusa Fernando Teles, que confirmou ainda a nomeação de Teixeira dos Santos como próximo CEO, após a informação ter sido avançada pelo PÚBLICO. Com a segunda posição accionista  (37%) da instituição portuguesa, de que foi, aliás, presidente não executivo nos mandatos anteriores, Fernando Teles é o presidente executivo do BIC Angola.

A lista com os novos membros dos órgãos sociais do BIC Portugal foi já enviada para o BdP, que foi consultado previamente sobre os nomes agora propostos. Ao escolherem Teixeira dos Santos, um rosto com peso político junto do actual executivo e boa imagem em certos círculos da oposição, assim como experiência na área financeira (desde logo por ter sido ministro com a tutela do sector), Isabel dos Santos e Fernando Teles respondem a uma exigência do BdP: a escolha de uma figura respeitada para assumir a presidência. E uma garantia de que a proposta de eleição dos órgãos sociais terá luz verde do BdP, um processo que se arrasta há quatro meses no meio de acesa polémica e de reservas levantadas pelo supervisor.

O PÚBLICO tentou sem sucesso obter um comentário por parte de Teixeira dos Santos, de 64 anos, e que em 2011, quando era ministro das Finanças, protagonizou um braço-de-ferro com o ex-primeiro-ministro José Sócrates no âmbito do pedido ajuda externa.

Já este ano, Teixeira dos Santos tinha sido apontado pelo Governo de António Costa para integrar a comissão que, nos próximos três anos, vai escrutinar a execução da carta de missão da Caixa Geral de Depósitos (CGD), bem como avaliar a gestão do novo presidente do banco público, António Domingues (ex-BPI). Com a ida para o grupo BIC, o ex-ministro deixará a comissão. 

Não é a primeira vez, que o economista, de 64 anos, é apontado para presidir a uma instituição bancária. Em Maio de 2015, foi convidado para chefiar a gestão da Caixa Económica Montepio Geral, mas acabaria por recuar, “após uma prolongada reflexão".

Críticas do Banco de Portugal

Tudo indica que o BdP está agora em condições de conceder o registo de idoneidade à empresária Isabel dos Santos e a Fernando Teles para integrarem a administração não executiva do BIC Portugal. Isto, depois de a instituição ter implementado um conjunto de recomendações, no sentido do introduzir melhoramentos nos procedimentos, nomeadamente ao nível da área de controlo, com a criação de mecanismos que garantem que as boas práticas são respeitadas.  

No que respeita a Jaime Pereira, o BdP não vai permitir o exercício de cargos de gestão, isto por lhe serem imputadas falhas graves na prevenção de branqueamento de capitais.  

As actuações de Jaime Pereira e de Fernando Teles no BIC Portugal foram alvo de críticas por parte do BdP, como transparece de um relatório divulgado pelo Expresso a 11 de Maio. No quadro de uma inspecção, a autoridade apontou falhas graves à gestão do banco, nomeadamente ao papel de Jaime Pereira como executivo e de Fernando Teles como presidente não executivo.

Ao contrário do que se verifica noutras sociedades financeiras, os gestores de bancos só podem desempenhar as funções depois de o BdP confirmar a sua idoneidade (ou reavaliação caso não seja a primeira vez), processo que levou o supervisor a fazer diligências reforçadas junto da instituição.

Em 2011, o BIC comprou, no contexto da privatização, o Banco Português de Negócios (BPN) por 40 milhões, o que lhe deu acesso a uma rede comercial de mais 200 balcões. O BIC Portugal tem a sua origem no Banco BIC Angola, que nasceu em 2005, juntando Isabel dos Santos, Fernando Teles e Américo Amorim. Em 2014, Isabel dos Santos e Teles compraram as acções de Américo Amorim (25%) e de António Ruas (10%).

Isabel dos Santos, com Fernando Teles, detém 21% do BPI (via Santoro e BIC Angola), onde se trava hoje uma guerra accionista com dois lados no confronto: o espanhol CaixaBank e a angolana Santoro.

Teixeira dos Santos e o BPN

A ligação de Teixeira dos Santos com o banco que agora vai liderar remonta a 2008, indirectamente. Foi no dia 2 de Novembro de 2008, duas semanas depois do grande crash de Wall Street, após a falência do banco norte-americano Lehman Brothers, que o então ministro das Finanças anunciou a nacionalização do BPN: “Face à inexistência de uma solução que permita defender o interesse dos depositantes, o Governo viu-se obrigado a propor à Assembleia da República a nacionalização do BPN”, comunicou Teixeira dos Santos.

Essa foi a origem de tudo, porque o BIC que o ex-ministro vai comandar é o resultado de uma também polémica "fusão por incorporação" do pequeno banco angolano BIC com o negócio "bom" do BPN. Esta fusão, realizada em Abril de 2012, fez com que o BIC comprasse 200 balcões por 40 milhões de euros - num negócio em que o Estado se comprometeu a pagar bastante mais do que esse valor, em várias cláusulas de que ainda não se conhecem todos os contornos.

Entre 2008 e 2011, um ano antes da venda ao BIC, Teixeira dos Santos foi ainda responsável político por três decisões que resultaram em prejuízos para o Estado. A primeira foi a nomeação de dois gestores da Caixa-Geral de Depósitos - Francisco Bandeira e Norberto Rosa - para dirigir o BPN nacionalizado, e cuja gestão motivou uma queixa-crime recente do Estado por gestão danosa. Seja qual for a apreciação do Tribunal, o Estado já teve pelo menos de arcar com custas jurídicas num estranho processo movido contra os administradores que o próprio Estado nomeou.

A segunda decisão cara foi a de financiar, através da CGD, a liquidez do BPN, em mais de 5 mil milhões de euros, durante os anos em que esteve nacionalizado, e a de entregar a parte "tóxica" a três veículos públicos - Parvalorem, Parups e Parparticipadas - cuja conta final ainda não é conhecida. A terceira decisão onde Teixeira dos Santos esteve envolvido acaba por ser a mais misteriosa de todas.

Trata-se da cláusula 2.10 do memorando de entendimento negociado entre o Governo português e a troika, assinado em 17 de Maio de 2011. Aí ficou escrito que Portugal se comprometia, em dois meses, a vender o BPN. Algo que não tinha conseguido em quase três anos. "As autoridades estão a iniciar um processo para a venda do Banco Português de Negócios (BPN) de acordo com um calendário acelerado e sem um preço mínimo. Para este fim, está a ser submetido um novo plano à CE para aprovação ao abrigo das regras de concorrência. O objectivo é encontrar um comprador, o mais tardar, até fim de Julho de 2011."

Esta cláusula já levou a que vários jornalistas, portugueses e estrangeiros (como o autor do documentário do canal Arte sobre a troika, o alemão Harald Schuman) questionassem as autoridades portuguesas sobre a sua inclusão no memorando. Por que razão o Governo se impunha um prazo tão curto para vender o BPN, sem "preço mínimo"? Isso não depreciava, objectivamente, o valor do banco vendido, favorecendo o comprador? A resposta nunca foi dada. Nem por Teixeira dos Santos, que negociou o memorando, nem pelo Governo seguinte, que finalizou a venda ao BIC.