Carne bovina dificulta exportações de vinho para o Brasil

Ministro da Agricultura, Capoulas Santos, visita Vinhos de Portugal no Rio, iniciativa do PÚBLICO e o jornal O Globo

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Quando Luis Capoulas Santos entrou no Mercado do Vinho de Portugal no Rio passava pouco das onze da manhã mas já a fila ia longa. De banca em banca, o ministro da Agricultura ia tecendo alguns comentários, elogiando “um aroma inconfundível” de um vinho, ou o “rótulo lindíssimo” de outro, fazendo alguns malabarismos para que não lhe enchessem demasiadas vezes o copo. Mas a conversa teve de ficar mais séria quando a produtora Sofia Prazeres, da Quinta de São José, lhe lançou sem rodeios quando o ministro da Agricultura passou na sua banca: “Veja lá se consegue baixar as taxas” de importação.

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Quando Luis Capoulas Santos entrou no Mercado do Vinho de Portugal no Rio passava pouco das onze da manhã mas já a fila ia longa. De banca em banca, o ministro da Agricultura ia tecendo alguns comentários, elogiando “um aroma inconfundível” de um vinho, ou o “rótulo lindíssimo” de outro, fazendo alguns malabarismos para que não lhe enchessem demasiadas vezes o copo. Mas a conversa teve de ficar mais séria quando a produtora Sofia Prazeres, da Quinta de São José, lhe lançou sem rodeios quando o ministro da Agricultura passou na sua banca: “Veja lá se consegue baixar as taxas” de importação.

A participação de 66 produtores de todas as regiões vinícolas do país nesta terceira edição do Vinhos de Portugal no Rio – iniciativa dos jornais PÚBLICO e O Globo em parceria com a ViniPortugal – só momentaneamente ofusca as dificuldades que os produtores portugueses enfrentam para fazer chegar os seus vinhos às mesas dos brasileiros. A questão levantada por Sofia Prazeres – antiga campeã nacional de ténis que se apaixonou pela vinha do Douro – foi respondida. “Estão a decorrer negociações entre a União Europeia e o Mercosul” (Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela), que é um “mercado com um enorme potencial”. Mas o processo é demorado.

O resultado para os vinhos portugueses, e somando às taxas os custos logísticos e as margens de lucro dos importadores e distribuidores, é que “o vinho chega à prateleira [no Brasil] oito vezes mais caro do que o preço em Portugal”, explica Jorge Monteiro, presidente da ViniPortugal. “Os vinhos europeus pagam taxas que países do Mercosul ou o Chile não pagam. Mas como este não é um problema da UE, é um problema de Portugal...”

Minutos mais tarde, Capoulas Santos confirmará ao PÚBLICO que as taxas são o maior entrave nas exportações de vinho para o Brasil. “Há vários anos que estas negociações não avançam, mas elas terão de ter um epílogo feliz. E isso passará necessariamente por concessões recíprocas.”

O que está a complicar? A carne de bovino. “O Mercosul é hoje a maior potência agrícola a nível mundial”, sendo que o Brasil contribui em grande medida para isso, essencialmente na produção de carne bovina – “que é uma produção muito importante na Europa. Este dossier tem impedido as negociações do tratado de comércio, que terá de ser mutuamente vantajoso”. Ou seja, a Europa “tem todo o interesse em colocar no Mercosul os seus produtos (da indústria automóvel, da banca, dos seguros)”, ao mesmo tempo que “o Brasil e os outros países do Mercosul olham para o mercado europeu como principal importador de produtos agrícolas”. Mas “se abríssemos agora os mercados, a carne de bovino desapareceria na Europa. Temos que criar mecanismos que garantam que esse sector não desaparecerá”, que tragam vantagens para os dois lados.

Entretanto, o ministro reconhece que devemos, “sem dúvida”, investir em alternativas: “Qualquer estratégia comercial deve apostar na diversificação de mercados. Infelizmente, as circunstâncias internacionais não têm sido fáceis. Têm-se sucedido crises, mas o mundo sempre foi perigoso em todas as épocas históricas. A crise obriga-nos a esforços acrescidos, quer de diversificação do mercado, quer de uma aposta mais ampla dentro desses próprios mercados”. No caso brasileiro, o próximo passo é conquistar São Paulo, por exemplo. “Já exportamos para todo o mundo, para mais de 50 países diferentes. A dificuldade é que não há meios financeiros que nos permitam fazer uma campanha promocional em todos os países ao mesmo tempo”.

Jorge Monteiro explica que, no primeiro trimestre de 2016, o Brasil representou 2,9% das exportações de vinho portuguesas (a União Europeia continua a pesar mais, com 61%, os Estados Unidos a seguir, com 10,9%, Canadá 5,7%, Suíça, com 4,9%, Angola com 2,7% e China 2%). Para os produtores vitivinícolas, a crise no Brasil pode ser uma preocupação, mas não tanto como a de Angola. “Angola teve uma queda mais estrutural. Se deixar de vender Barca Velha em Luanda - que tem o restaurante onde se vende mais Barca Velha em todo o mundo - consigo vender para outros mercados. Mas o vinho a granel – de entrada de gama- esse foi o que baixou. Houve uma queda de 24% em 2015, passou de 95 milhões para 72 milhões. Este ano prevê -se que termine entre 20 e 30 milhões”, diz o presidente da ViniPorrtugal.

Em relação ao Brasil, “não há diminuição do consumo, mas o consumidor está a preferir vinhos a preços mais acessíveis (que faz com que o volume tenha caído este trimestre 10,9%). A comunidade da diáspora continua a beber e está fidelizada numa marca - em geral Casal Garcia ou Monte Velho - mas está a deixar de comprar os reserva”.

Em todo o caso, os brasileiros estão longe de serem grandes consumidores de vinho – no ano passado o país consumiu 1,9 litros per capita (em Portugal foram 42 litros). O vinho “ainda é uma bebida para momentos especiais”, afirma Jorge Monteiro. E os brasileiros “preferem claramente o tinto, apesar de ser um país quente” – tal como acontece com os angolanos, aliás. Para refrescar, venha a cerveja estupidamente gelada.