Alteração à lei da PMA implica “longo período de adaptação”
A presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina da Reprodução, Teresa Almeida Santos, fala em condicionantes como a falta de gâmetas e potencial aumento da procura dos centros.
No ano em que se assinalam três décadas do nascimento do primeiro bebé com recurso a técnicas de procriação medicamente assistida (PMA), a Assembleia da República (AR) prepara-se para avançar com uma alteração significativa a esta lei.
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No ano em que se assinalam três décadas do nascimento do primeiro bebé com recurso a técnicas de procriação medicamente assistida (PMA), a Assembleia da República (AR) prepara-se para avançar com uma alteração significativa a esta lei.
Para a presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina da Reprodução (SPMR), Teresa Almeida Santos, esta modificação da lei, a confirmar-se, significa uma “mudança de paradigma”. Se, até agora, apenas os casais heterossexuais com problemas de fertilidade podiam recorrer a estas técnicas para ter filhos, o projecto de lei que vai a votação na sexta-feira em plenário alarga essa possibilidade a todas as mulheres, sem que estado civil ou a orientação sexual sejam requisito.
O documento foi aprovado a 21 de Março no grupo de trabalho sobre a PMA. Este “alargamento”, como lhe chama a também responsável pelo serviço de medicina da reprodução do Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra (CHUC), implica “modificações profundas na prática da PMA em Portugal”.
Com a passagem da PMA a método complementar de procriação, a presidente da SPMR prevê um “longo período de adaptação” até que seja possível a aplicação da lei. Em causa estão constrangimentos orçamentais, de recursos humanos e a escassez de recursos como gâmetas (ver caixa). “Vivendo um período de restrições orçamentais, racionalização de recursos e de dificuldades para mudar coisas pequenas na prática do SNS, eu antevejo que vá ser demorado — diria meses, pelo menos — até que possamos aplicar as técnicas de reprodução medicamente assistida nestes novos beneficiários”, explica a responsável, em entrevista ao PÚBLICO.
Apesar de não avançar com uma estimativa, Teresa Almeida Santos antecipa o aumento da procura por parte da camada da população que agora passa a ter acesso a este método. Até agora muitas mulheres iam a Espanha, onde esta prática foi inscrita na lei em 1988.
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Ao significar o aumento do número de consultas, a subida da procura pode também levar ao crescimento das listas de espera. Se, na região de Coimbra, o tempo de espera ronda os quatro meses e no Porto os seis, em Lisboa “as listas de espera são tradicionalmente superiores a um ano”. A responsável menciona o caso da avaliação e acompanhamento psicológico como exemplo de uma escassez actual que se deve acentuar com a mudança de paradigma.
Processo legislativo
Apesar de o primeiro bebé com recurso a estas técnicas ter nascido em 1986 e de a abertura a mulheres independentemente do seu estado civil ou orientação sexual poder vir a ser inscrita na lei 30 anos depois, Teresa Almeida Santos não considera que o desenvolvimento da legislação tenha sido lento. “Acompanhou a evolução técnica e a própria mentalidade dos portugueses”, considera, concedendo que “talvez pudesse ter sido mais célere”, uma vez que era uma “matéria em discussão há algum tempo”, mas que isso é também sinal dos “ciclos políticos”. “Se o resultado da votação for aquele que se prevê, até vamos ter uma lei bastante moderna em relação a outros países da Europa”, afirma.
Enquanto a votação estiver a decorrer no plenário da AR, a SPMR vai estar reunida no seu 6.º congresso, que tem início nesta quinta-feira e dura até sábado. Uma das propostas em cima da mesa no Parlamento é ainda a da gestação de substituição, as chamadas “barrigas de aluguer”, segundo uma proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda mas que foi chumbada num primeiro momento com os votos contra de PSD, CDS-PP e PCP.
No entanto, os bloquistas vão levar o documento a sessão plenária, contando com o levantamento da disciplina de voto na bancada social-democrata para ver o diploma poder ser aprovado. Sem se posicionar directamente e rejeitando qualquer “preconceito ideológico”, Teresa Almeida Santos entende que “não é proibindo que as coisas se resolvem”. E, embora ressalvando que a proposta do Bloco influencia um “número reduzido de pessoas face à massa que são os casais inférteis e outros possíveis beneficiários dentro de poucos dias”, a responsável considera que “já se puseram na mesa todos os argumentos a favor e contra” e que deve agora ser tomada uma decisão pelos actores políticos.