Ainda sem dobrar o cabo das tormentas
Marcelo chega a Moçambique com o país mergulhado numa grave crise política, social e económica
O que é feito do "eldorado", da pérola do Índico, do país que ambicionava servir de exemplo a outros a nível regional? Que é feito da abundância de recursos naturais e de todas as esperanças que renasceram com a descoberta de uma das maiores reservas de gás natural e de carvão do mundo? Que é feito da luta para tirar da pobreza os 54% da população que vivem com menos de um dólar por dia? Moçambique está no meio da chamada "tempestade perfeita", que transformou a esperança de muitos numa tormenta sem fim à vista. O país está mergulhado, simultaneamente, numa grave crise política, social e económica, e para debelar as duas últimas é preciso que a primeira esteja sanada. Desfecho que infelizmente ainda não se vislumbra a curto prazo.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O que é feito do "eldorado", da pérola do Índico, do país que ambicionava servir de exemplo a outros a nível regional? Que é feito da abundância de recursos naturais e de todas as esperanças que renasceram com a descoberta de uma das maiores reservas de gás natural e de carvão do mundo? Que é feito da luta para tirar da pobreza os 54% da população que vivem com menos de um dólar por dia? Moçambique está no meio da chamada "tempestade perfeita", que transformou a esperança de muitos numa tormenta sem fim à vista. O país está mergulhado, simultaneamente, numa grave crise política, social e económica, e para debelar as duas últimas é preciso que a primeira esteja sanada. Desfecho que infelizmente ainda não se vislumbra a curto prazo.
Comecemos pela economia, que está num estado caótico. A queda abrupta dos preços do gás e das matérias-primas e o atraso nas novas explorações fizeram lembrar o país das lacunas e das debilidades da economia: a carência de infra-estruturas, a falta de mão-de-obra especializada, a necessidade de especialização e desenvolvimento de sectores como o turismo, a agricultura, os transportes ou o financeiro. Fenómenos climatéricos como o El Niño contribuem para a seca extrema no Sul do país, enquanto do Norte chegavam notícias de fortes chuvas e inundações. Isto tudo numa economia em arrefecimento, com o metical a perder valor e com a credibilidade internacional fortemente abalada pela recente descoberta de dívida pública oculta no valor de 1,4 mil milhões de dólares, o que levou o Banco Mundial a suspender a ajuda a Moçambique, a União Europeia a ameaçar suspender e o FMI a cancelar a sua missão.
Nas ruas, sucedem-se notícias de contestação, fala-se num clima de medo, noticia-se raptos, assassínios e até a descoberta de uma vala comum com cerca de 120 corpos na região da Gorongosa. Isto numa altura em que milhares de refugiados vão para o Malawi para fugir, dizem eles, aos atropelos cometidos pelo Exército.
Nem a crise na economia, nem a crise social terão solução no actual clima de confronto político/militar entre a Frelimo, que está no poder, e a Renamo, que continua a contestar os resultados das presidenciais e legislativas de Outubro de 2014, com Afonso Dhlakama a ameaçar tomar o poder nas províncias em que reclama ter vencido as presidenciais. É este o ambiente que Marcelo Rebelo de Sousa vai encontrar quando aterrar esta terça-feira em Maputo, e já se percebeu (até pelos encontros que teve em Roma com a Comunidade de Santo Egídio, que teve um papel importante nos acordo de paz de 1992) que o Presidente vai com vontade de dar um contributo para tentar encontrar um caminho de diálogo. Aliás, o único que Moçambique tem pela frente. Marcelo quer ajudar a fazer pontes; resta saber se Nyusi e Dhlakama querem atravessá-las.