Senado promete “total neutralidade” na avaliação do impeachment a Dilma

Ao contrário da Câmara dos Deputados, que acelerou o processo ao máximo, a câmara alta do Congresso deve ter uma postura mais branda. Temer já pensa num Governo de regeneração política e económica.

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Temer prepara um Governo técnico com três superministérios, para fazer frente à grave crise económica no Brasil. Nelson Almeida/AFP

Selada a aprovação da Câmara dos Deputados para a abertura do processo de destituição da Presidente do Brasil, a oposição pressiona agora a câmara alta do Congresso para que acelere a sua decisão e afaste o mais rapidamente possível Dilma Rousseff da presidência. Mas o Senado tem prazos mais flexíveis do que a Câmara dos Deputados e a sua liderança é visivelmente menos hostil a Dilma e ao seu Partido dos Trabalhadores (PT): “Pretendemos fazer isso com absoluta isenção e total neutralidade”, disse na segunda-feira o presidente do Senado, Renan Calheiros, ao receber oficialmente os documentos de processo.

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Selada a aprovação da Câmara dos Deputados para a abertura do processo de destituição da Presidente do Brasil, a oposição pressiona agora a câmara alta do Congresso para que acelere a sua decisão e afaste o mais rapidamente possível Dilma Rousseff da presidência. Mas o Senado tem prazos mais flexíveis do que a Câmara dos Deputados e a sua liderança é visivelmente menos hostil a Dilma e ao seu Partido dos Trabalhadores (PT): “Pretendemos fazer isso com absoluta isenção e total neutralidade”, disse na segunda-feira o presidente do Senado, Renan Calheiros, ao receber oficialmente os documentos de processo.

Cabe ao Senado decidir se aceita o processo de destituição, suspender Dilma por um período máximo de 180 dias e julgá-la durante esse tempo. Antes disso, porém, tem de organizar uma comissão especial, eleger o seu presidente e relator, algo que começará a ser feito esta terça-feira, dia da leitura do processo. Espera-se uma decisão para os dias 10 ou 11 de Maio, mas muitos querem que o Senado decida o futuro de Dilma mais cedo, até porque esperam para breve um contra-ataque do Partido dos Trabalhadores (de Dilma), que se deve centrar na ideia de que Michel Temer não tem o apoio da população — conseguiria apenas entre 1% a 2% dos votos em caso de eleições.

“Pessoas pedem para agilizar, mas não poderemos agilizar de tal forma que pareça atropelo ou delongar de tal forma que pareça procrastinação”, afirmou Renan Calheiros, do mesmo partido (Partido do Movimento Democrático Brasileiro, PMDB) que Temer e que o seu homólogo na Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que agendou sessões para o fim-de-semana para acelerar ao máximo o impeachment a Dilma. É quase certo que a Presidente vai perder a votação no Senado: já mais de metade dos senadores se pronunciou contra Dilma — 48, segundo a Folha de São Paulo, quando são precisos apenas 41.

Apesar disso, os apoiantes de um presumível Governo de Michel Temer conhecem a história recente do país e sabem, como escreve o El País Brasil, que mesmo Itamar Franco só foi capaz de governar com segurança depois de o ex-Presidente Collor de Melo — sobre quem as opiniões não se dividiram durante o impeachment — ter renunciado oficialmente ao cargo, quase três meses depois de ter sido suspenso pelo Senado. “Devemos ter rapidez na decisão, com responsabilidade”, diz o novo líder do PMDB, Romero Jucá. “Nada impede que o Senado trabalhe na sexta [depois de feriado]. A Câmara trabalhou no domingo.”

Mas Renan Calheiros não é Eduardo Cunha — que esta terça-feira prometeu não aprovar nenhuma lei de relevo até ao fim do processo no Senado — e não quer romper por completo as pontes com o PT, que ainda pode conquistar a presidência num cenário de eleições antecipadas ou em 2018. Como explica o veterano cientista político brasileiro Rudá Ricci ao El País: “Lula é muito forte para 2018, por que assumiria [Renan] uma posição beligerante agora? Ele sabe como o Nordeste vota, ali é a sua casa, não vai arriscar indispondo-se com o PT.”

Superministérios

Michel Temer, o presumível sucessor de Dilma Rousseff na presidência, falou esta terça-feira pela primeira vez desde que o impeachment foi aprovado na Câmara dos Deputados para negar estar já a preparar um Governo seu e dizer que aguardará em silêncio que o processo se conclua. “Seria inadequado que eu dissesse qualquer coisa antes da solução acertada pelo Senado”, afirmou aos jornalistas, em frente à sua casa de São Paulo, onde na segunda-feira se encontrou com vários conselheiros e altos-cargos públicos.

Sabe-se porém que o grande partido de oposição Partido da Social Democracia Brasileira já enviou uma lista de condições para uma coligação com o PMDB de Temer e o jornal Estado de São Paulo avança esta terça-feira que o (ainda) vice-presidente prepara três superministérios na Economia, Desenvolvimento Social e Infraestrutura — extinto em 1992. “[Temer] avalia que precisa de dar uma resposta convincente ao país de que está comprometido com a recuperação política e económica”, lê-se no diário brasileiro. Antecipa-se um executivo de orientação técnica, para enfrentar a grave crise económica, que acabou agudizada pelos últimos meses de imobilidade governamental. 

Dilma, por sua vez, prosseguiu na terça-feira a mesma linha de argumentação que usou para responder à aprovação do impeachment: disse-se vítima de um golpe de Estado e acusou Temer de conspirar abertamente contra a sua presidência com a oposição. “Estão vendendo terrenos na Lua”, disse a Presidente a um grupo de jornalistas estrangeiros, criticando a embrionária coligação governamental entre PMDB e PSDB. “O Brasil tem um veio golpista adormecido”, afirmou.