Morte de voluntário em ensaio da Bial “claramente ligada à molécula”

Conclusões do relatório sobre ensaio da farmacêutica portuguesa em França são peremptórias.

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A empresa farmacêutica portuguesa desenvolveu dois fármacos de raiz Nelson Garrido

As conclusões do comité de peritos que analisou o que se passou no ensaio clínico, em França, a uma molécula da empresa farmacêutica portuguesa Bial – em que uma pessoa morreu e cinco outras tiveram efeitos neurológicos graves no início deste ano – são peremptórias: “O acidente que ocorreu em vários voluntários do ensaio (…) aparece claramente ligado à molécula testada”, lê-se no relatório do Comité Científico Especializado Temporário criado pela Agência Nacional de Segurança do Medicamento francesa (ANSM), divulgado esta terça-feira.

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As conclusões do comité de peritos que analisou o que se passou no ensaio clínico, em França, a uma molécula da empresa farmacêutica portuguesa Bial – em que uma pessoa morreu e cinco outras tiveram efeitos neurológicos graves no início deste ano – são peremptórias: “O acidente que ocorreu em vários voluntários do ensaio (…) aparece claramente ligado à molécula testada”, lê-se no relatório do Comité Científico Especializado Temporário criado pela Agência Nacional de Segurança do Medicamento francesa (ANSM), divulgado esta terça-feira.

Em resposta oficial às conclusões do relatório, a Bial apenas diz ao PÚBLICO: “O relatório hoje [nesta terça-feira] publicado não é conclusivo sobre a causa da morte do voluntário.”

Em Janeiro último, seis voluntários de um ensaio clínico de fase I da molécula BIA 10-2474, para fins sobretudo analgésicos, foram hospitalizados em Rennes. Quatro dos cinco sobreviventes ficaram com lesões cerebrais graves, refere a agência de notícias AFP.

A ANSM criou um grupo de 12 peritos externos (da área da toxicologia, farmacologia, vigilância farmacológica, neurologia e medicina interna), com o “objectivo de explorar as hipóteses farmacológicas e toxicológicas” deste acidente, lê-se no site da agência francesa. Os peritos analisaram o conjunto de dados existentes sobre a classe de substâncias a que pertence a molécula BIA 10-2474 – os chamados “inibidores da FAAH”, que é uma enzima –, bem como dados sobre a própria molécula da Bial, dados pré-clínicos e clínicos do ensaio e ainda informações adicionais pedidas à empresa portuguesa, acrescenta o site.

O que é um inibidor da FAAH? Antes de mais, FAAH é a sigla, em inglês, para “enzima hidrólase das amidas de ácidos gordos”, uma proteína essencial na metabolização dos endocanabinóides. E os endocanabinóides, que são produzidos naturalmente pelo corpo, actuam no sistema nervoso central: ligam-se a receptores (moléculas) das células e têm efeitos fisiológicos no apetite, na sensação de dor, no humor e na memória. As empresas farmacêuticas querem desenvolver inibidores desta enzima porque, ao bloquear a sua actividade, os endocanabinóides manter-se-ão no corpo. Desta forma, poder-se-ia produzir um efeito analgésico, evitando o uso de opiáceos, e um efeito na memória, que teria implicações em doenças demenciais. 

Por um lado, o relatório francês considera “pouco provável” que a toxicidade verificada esteja ligada à estimulação do sistema endocanabinóide através da inibição da FAAH ou que se tenha devido a uma substância resultante da metabolização da molécula testada, apontando a seguinte possibilidade: “A hipótese que nesta altura é mais provável é a de uma toxicidade própria da molécula via a sua fixação sobre outras estruturas cerebrais.” E que essa fixação foi facilitada pela sua “fraca especificidade pela sua enzima-alvo” (a FAAH); pela “utilização de doses repetidas bem superiores às que conduzem (pelo menos no homem) a uma inibição completa e prolongada da FAAH”; e a “sua provável acumulação progressiva, ao nível cerebral, sem dúvida ligada às particularidades farmacológicas da BIA 10-2474”, o que poderá “explicar por que o acidente de Rennes só ocorreu a partir do quinto dia de administração de uma dose de 50 mg e não nos voluntários que tinham recebido uma dose duas vezes mais forte numa única administração”.

No relatório de 30 páginas, diz-se ainda que, embora os dados transmitidos não fizessem crer que havia um risco particular a nível toxicológico da primeira administração da molécula ao homem, a Brochura do Investigador (compilação de dados clínicos e não clínicos sobre um produto em investigação) tinha um “grande número de erros, imprecisões, inversão de números ou traduções erradas das fontes documentais que tornavam difícil a compreensão de vários pontos”, o que é “surpreendente, dada a importância regulamentar deste documento”.

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