Governo vai apertar regras dos concursos públicos

Os socialistas pretendem mexer nas regras dos concursos públicos. Dos que transitam do anterior Governo, restam 21 dirigentes por nomear.

Foto
Ministro das Finanças, Mário Centeno Daniel Rocha

Com apenas quatro anos de vida, a polémica CRESAP – Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública (organismo criado pelo Governo de Pedro Passos Coelho para acabar com os chamados ‘jobs for the boys’) vai mudar de regras. O Governo quer que os concursos públicos sejam mais rigorosos e vai propor que sejam reduzidos de três para dois o número de nomes de candidatos seleccionados pela comissão para serem escolhidos pelo ministro, soube o PÚBLICO.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Com apenas quatro anos de vida, a polémica CRESAP – Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública (organismo criado pelo Governo de Pedro Passos Coelho para acabar com os chamados ‘jobs for the boys’) vai mudar de regras. O Governo quer que os concursos públicos sejam mais rigorosos e vai propor que sejam reduzidos de três para dois o número de nomes de candidatos seleccionados pela comissão para serem escolhidos pelo ministro, soube o PÚBLICO.

O objectivo do Governo ao mexer nas regras dos concursos públicos é apertar a selectividade. Para isso irá também implementar mudanças ao nível dos critérios, que passarão a ser mais restritos. De acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO, o Governo poderá, nomeadamente, apertar a definição dos perfis.

A preocupação é contrariar a imagem generalizada de que estes concursos para cargos dirigentes são feitos à medida e à imagem dos candidatos, sendo por isso considerados pouco rigorosos. A diminuição do número de seleccionados permitirá contribuir para a afinação do rigor perante os candidatos que chegam à fase de escolha política e de confiança do responsável governamental da tutela.

Sem o assumir publicamente preto no branco, há, entre os membros do Governo e entre os socialistas, quem considere que a lei, tal como foi aprovada, sob orientação do ex-ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, permite muitas vezes que acabem por ser escolhidos para altos dirigentes do Estado pessoas de confiança política, já que alarga o leque de escolha aos três candidatos que fiquem à frente nos concursos.

Isto contraria, no entender do governante ouvido pelo PÚBLICO, o menor grau de rigor, do ponto de vista do mérito, com que a escolha e a nomeação é feita, prejudicando assim o Estado do ponto de vista da competência dos que ocupam altos cargos na direcção da máquina do Estado.

A aprovação das novas regras não tem ainda data prevista. Por agora, o assunto está a ser tratado pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, cuja secretária de Estado da Administração e do Emprego Público, Carolina Ferra, tem entre mãos a elaboração de um levantamento minucioso dos altos quadros do Estado, das situações que estão pendentes e das necessidades reais.

A decisão de mexer nesta legislação para apertar a regulamentação dos concursos públicos é a razão pela qual o Governo tem procedido a nomeações sem concurso público, explicou ao PÚBLICO um responsável ligado ao Governo. Em causa está também o facto de, ao fim de um ano, os altos dirigentes do Estado nomeados por concurso terem direito a indemnização, em caso de despedimento. E essa indemnização terá que ter em conta a duração do contrato. Pelo contrário, os agora nomeados directamente e sem concurso poderão sempre responder a provas e ser aferidos mais tarde.

Assim, o Governo adia para um momento oportuno em que a lei esteja revista e os dirigentes possam ser escolhidos de acordo com novas regras para ocupar em definitivo os cargos de direcção da administração pública.

Críticas antigas

O incómodo dos socialistas em relação à CRESAP não é novo. Em março de 2015, a comissão foi duramente criticada pelo PS e também pelo PCP. Na origem da polémica esteve o facto de quase todos os 14 nomeados para cargos dirigentes nos centros distritais da Segurança Social terem cartão de militante do PSD ou do CDS

Na altura, o ainda líder do PS António Costa anunciou que iria exigir um balanço sobre as nomeações feitas até então pelo executivo de coligação. “No futebol dizia-se que era 11 contra 11 e no final ganhava o Porto. Nestes resultados da CRESAP começo a achar que é uma história parecida. Há muito concurso, há muita transparência, são todos objectivamente avaliados, e a CRESAP até indica ao Governo sempre três nomes de candidatos apurados, mas, depois, no fim, é sempre alguém do PSD ou do CDS que é nomeado para aquele lugar”, disse António Costa a partir de Vila Nova de Gaia, onde o PS se reunia em jornadas parlamentares.

Acresce a curiosidade, então apurada pelo PÚBLICO, de não só haver um padrão nos candidatos escolhidos pelos ministérios, mas também nos chumbados. No total das “339 propostas que chegaram às diferentes tutelas desde que a comissão foi criada”, escrevia o jornal, quase todos os nomes rejeitados tinham “uma ligação ao Partido Socialista”.

Um dos candidatos socialistas havia integrado por 11 vezes a short list de três nomes enviados à tutela, sem nunca ter chegado a ser nomeado. “Pelo menos, foram excluídos do processo de selecção os militantes ou simpatizantes incompetentes”, que era “coisa que antes não acontecia”, reagiu João Bilhim, presidente da Comissão.

Consciente das fragilidades do processo de selecção da CRESAP, João Bilhim chegou a ser ouvido no Parlamento e a deixar uma lista de 17 propostas de alteração ao Estatuto de Pessoal Dirigente da Administração Pública.

O presidente da comissão propunha, por exemplo, a fixação de um prazo de 45 dias para o executivo proceder à nomeação, após a recepção da short list. As propostas foram feitas “na convicção de que só haverá uma administração ‘apartidária’ quando os seus dirigentes representarem estatisticamente a diversidade político-partidária do país”, disse, na altura, João Bilhim.