José Eduardo Agualusa na shortlist do Man Booker International com Ferrante e Pamuk
Depois de ter sido incluído na longlist de 13 finalistas, com Teoria Geral do Esquecimento, passa à fase final, num conjunto que os jurados consideram “entusiasmante”.
O escritor angolano José Eduardo Agualusa vai competir com Elena Ferrante ou Orhan Pamuk para o Man Booker Internacional, prémio literário britânico que consagra o que de melhor se faz na ficção a nível mundial. Acaba de passar para a shortlist.
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O escritor angolano José Eduardo Agualusa vai competir com Elena Ferrante ou Orhan Pamuk para o Man Booker Internacional, prémio literário britânico que consagra o que de melhor se faz na ficção a nível mundial. Acaba de passar para a shortlist.
Depois de ter sido incluído na longlist de 13 finalistas, em Março, um ano depois de o mesmo ter acontecido a Mia Couto, Agualusa passa agora ao grupo de seis finalistas deste prémio no valor de 60 mil euros (a dividir com o tradutor da obra escolhida): Teoria Geral do Esquecimento (D. Quixote, 2012, que já lhe valeu em Portugal o Prémio Fernando Namora), História da Menina Perdida, de Elena Ferrante (pseudónimo), A Strangeness in My Mind, do turco, e prémio Nobel, Orhan Pamuk, The Vegetarian de Han Kang, The Four Books de Yan Lianke, e A Whole Life de Robert Seethaler. Ou seja, histórias passadas durante a guerra civil em Angola, uma amizade feminina numa Nápoles controlada pela Camorra, a emancipação de uma dona de casa coreana, uma inventariação de personagens, acontecimentos, comida, objectos que sintetizam Istambul, as atrocidades maoístas, a grande fome na China em particular, e toda a vida de um homem nos Alpes austríacos.
É uma volta ao mundo e às fronteiras da ficção, segundo os jurados deste prémio - júri, encabeçado por Boyd Tonkin, um dos redactores seniores do The Independent, e composto pela antropóloga e escritora Tahmina Anam, pela poeta Ruth Padel e pelos académicos David Bellos e Daniel Medin. É uma lista variada e “entusiasmante”. O comunicado de imprensa reproduz uma declaração de Boyd Tonkin: “A nossa selecção mostra que os melhores livros traduzidos ultrapassam as fronteiras não só do nosso mundo mas da própria arte da ficção. Esperamos que os leitores de todas as partes do mundo partilhem o nosso prazer e excitação com esta shortlist.”
Os livros na corrida
No extenso comunicado de imprensa em que divulga a shortlist, a organização do Man Booker resume, assim, o livro de José Eduardo Agualusa, o autor de 55 anos nascido no Huambo que hoje vive entre Portugal, Angola e o Brasil: um “mosaico selvagem” que forma um romance que conta a história de Angola através de Ludo, uma mulher que decide barricar-se no seu apartamento nas vésperas da independência do país. Durante os 30 anos seguintes, Ludo não sai à rua, sobrevive alimentando-se de vegetais e pombos, e acompanha o que se passa no mundo exterior através da rádio e das conversas dos vizinhos. A rotina desta mulher é interrompida quando conhece Sabalu, um rapaz que decide trepar até ao seu terraço. “Com a imagem de marca do autor – sentido lúdico, humor e até afecto – Teoria Geral do Esquecimento é um romance deslumbrante, uma história humana sobre as emoções, a esperança e os perigos de uma mudança radical”, lê-se na nota de imprensa.
Daniel Hahn, que tem no seu currículo mais de 30 livros, de autores tão díspares como o Nobel português José Saramago e a estrela brasileira de futebol Pelé, é o tradutor da obra de Agualusa a concurso.
Na corrida está também Ferrante com o último volume dos seus romances de Nápoles, História da Menina Perdida (traduzido no Reino Unido por Ann Goldstein e publicado em Portugal pela Relógio d’Água), centrado na amizade entre duas mulheres muito diferentes – Elena e Lila – que crescem tentando escapar ao bairro onde vivem, “uma prisão de conformismo, violência e tabus invioláveis”. Passados uns anos em Florença, cidade em que formou família e publicou vários livros que foram bem recebidos, Elena regressa a Nápoles para ficar com o homem que sempre amou. Lila nunca se libertou da cidade, tornando-se uma peça chave do sistema que inicialmente rejeitara. “Cada parágrafo brilha com inteligência”, garante o júri deste prémio internacional, “cada capítulo traz uma surpresa: um verdadeiro banquete”.
The Vegetarian (tradução de Deborath Smith), da sul-coreana Han Kang, parte do dia-a-dia monótono de um casal de classe média sem ambições que parece viver num estado “vegetativo” até que a mulher, Yeong-hye, decide cometer um acto doméstico de rebelião – torna-se vegetariana. A pouco e pouco, as suas atitudes revelam-se bizarras e Yeong-hye fantasia transformar-se numa árvore. “Perturbadora” e “bela”, garante a organização do Booker International, The Vegetarian é uma obra sobre a Coreia do Sul contemporânea, mas é também um romance sobre a “estranheza”, “a vergonha, o desejo, e as nossas tentativas frágeis para compreender os outros, de um corpo aprisionado para outro”.
O Nobel Orhan Pamuk dispensa apresentações. O seu A Strangeness in my Mind (tradução Ekin Oklap) conta a história de um vendedor de boza (bebida nacional da Turquia), Mevlut, da mulher a quem dirige uma série de cartas apaixonadas e da vida de ambos em Istambul. É através do olhar de Mevlut que o autor de Jardins da Memória e de O Museu da Inocência faz o leitor viajar pelas transformações políticas e sociais do seu país, pela arquitectura e ruas de Istambul, sem deixar de enfrentar as tensões que nascem no universo familiar, por vezes a partir de pormenores corriqueiros da vida deste vendedor que se sente à parte, diferente. E que nunca deixa de tentar compreender o que mais importa no amor, se o que desejamos, se o que o destino tem guardado para nós.
O livro do austríaco Robert Seethaler, A Whole Life (tradução de Charlotte Collins), também tem uma história de amor em pano de fundo. Uma história que junta Andreas, homem de poucas palavras que sempre viveu nos Alpes austríacos, a Marie, a mulher por quem se apaixona e que, tragicamente, morre numa avalanche quando está grávida do primeiro filho de ambos. Dignidade e solidão abordadas num romance que mete a Segunda Guerra pelo meio, com Andreas a ser feito prisioneiro no Cáucaso, antes de regressar às montanhas, o seu paraíso, para as descobrir modernizadas. Diz o júri do prémio que é “uma história simples sobre um homem simples”, um “conto trabalhado de forma soberba sobre a dor física e emocional nascida da paciência e da resignação”, uma “jóia literária para ombrear com Um Coração Simples, de [Gustave] Flaubert”.
Por último, Yan Lianke e The Four Books (tradução de Carlos Rojas). O júri chama-lhe um dos “mais corajosos autores chineses vivos” e apresenta a obra como um romance a quatro vozes que explora o trauma causado pela Grande Fome de Mao a partir de um campo de reeducação, em que os intelectuais ali detidos redescobrem, no pior dos cenários, o poder da camaradagem, do amor e da fé. Isto tudo numa narrativa em quatro andamentos onde há ecos do pensamento do filósofo Confúcio e dos quatro evangelhos do Novo Testamento.
O outro escritor de língua portuguesa que integrava a lista de finalistas divulgada em Março, o brasileiro de origem libanesa Raduan Nassar, ficou agora pelo caminho.
O vencedor será anunciado a 16 de Maio.