Portugal cumpriu “escrupulosamente” programa da troika, diz António Costa
Os dois primeiros-ministros estiveram reunidos e, no final, assinaram um documento conjunto a prometer cooperação na crise dos refugiados e a criticar as consequências das políticas de austeridade.
O primeiro-ministro, António Costa, afirmou esta segunda-feira que Portugal cumpriu “escrupulosamente” o seu programa de assistência financeira, mas que este teve consequências negativas sociais e económicas, e defendeu que o problema dos refugiados na Grécia é também português.
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O primeiro-ministro, António Costa, afirmou esta segunda-feira que Portugal cumpriu “escrupulosamente” o seu programa de assistência financeira, mas que este teve consequências negativas sociais e económicas, e defendeu que o problema dos refugiados na Grécia é também português.
Posições assumidas por António Costa numa conferência de imprensa conjunta com o primeiro-ministro da Grécia, Alexis Tsipras, após ter sido interrogado por uma jornalista grega sobre as causas de Portugal ter concluído o seu programa da troika (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional), enquanto a Grécia permanece desde 2010 sob assistência financeira.
“Portugal, de facto, cumpriu o seu programa de ajustamento e tem sido apontado pelas instituições europeias como o exemplo do país que cumpriu mais escrupulosamente todo o programa. Ficamos muito contentes com esse reconhecimento por parte da União Europeia”, começou por afirmar António Costa, que cumpre um dia de visita oficial à Grécia.
No entanto, para o primeiro-ministro, não se pode “ignorar que esse ajustamento não evitou que a dívida tivesse subido de 97% do PIB (Produto Interno Bruto) para 130%, que o país tenha uma taxa de desemprego extremamente elevada e que tenha aumentado significativamente o nível de pobreza em Portugal”.
Aliás, António Costa aproveitou a conferência de imprensa para condenar as “lógicas de pensamento único neoliberais”. Depois, numa indirecta a quem recusa executivos radicais como o do Syriza na Grécia, acentuou que a União Europeia, apesar de ter regras comuns, “tem de respeitar a existência de alternativas políticas” em cada Estado-membro.
Deu então o exemplo de Portugal, onde houve mudança de Governo no final do ano passado, “mas sem que houvesse desrespeito das regras da União Europeia”. Alexis Tsipras pegou neste ponto para criticar a insistência das instituições europeias no mesmo modelo de austeridade, “apesar de muitos dos responsáveis destas instituições reconhecerem os erros e as suas consequências nefastas”.
Sobre a questão dos refugiados, o primeiro-ministro defendeu que a pressão migratória em alguns países como a Grécia não pode ser encarada como um problema deste Estado-membro. “Um problema da Grécia é um problema da União Europeia e, nesse sentido, é também um problema de Portugal”, declarou António Costa.
“Entendemos que o valor fundamental no qual se funda a Europa é o da solidariedade”, advogou António Costa, que, ao longo da conferência de imprensa, não especificou quantos refugiados Portugal poderá receber, embora em ocasiões anteriores já se tenha referido o número de dez mil.
A posição de abertura de António Costa em relação ao acolhimento de refugiados mereceu logo a seguir elogios do primeiro-ministro grego, apontando que há países com população idêntica a Portugal e com níveis de riqueza superior que “não estão disponíveis para acolher tantos refugiados” como o Estado português.
Antes da conferência de imprensa Costa e Tsipras assinaram uma declaração conjunta em que prometem cooperar, sobretudo na resposta à crise migratória, e criticam as consequências das políticas de austeridade na União Europeia.
A declaração conjunta foi distribuída aos jornalistas após o encontro entre Alexis Tsipras e António Costa, que antes também esteve reunido com o chefe de Estado grego, Prokopis Pavlopoulos, no primeiro ponto do seu programa de visita oficial à Grécia.
No documento, Alexis Tsipras e António Costa consideram que as políticas de austeridade adoptadas contribuíram para "deprimir as economias e dividir as sociedades" nos Estados-membros da União Europeia onde foram aplicadas.
Os dois chefes de Governo defendem ainda que a austeridade gerou "altos níveis de desemprego" e de "pobreza".
"Com o crescimento da desigualdade social e da pobreza, os nossos países e a Europa enfrentam um longo período de estagnação económica", lê-se no documento.
Tanto Tsipras, como Costa, "como primeiros-ministros de dois países com uma experiência similar em relação aos respectivos programas de ajustamento, partilham a convicção de que a exclusividade das políticas de austeridade estão erradas e são insuficientes para promover as necessárias mudanças".
"Seis anos após o primeiro resgate, podemos confirmar que a austeridade, aplicada isoladamente, falhou nos seus objectivos e provocou um impacto social e económico que foi mais longe do que o inicialmente antecipado. Estas políticas têm de ser revistas", acentuam os primeiros-ministros de Portugal e da Grécia.
Em relação ao fenómeno dos refugiados, Tsipras e Costa salientam na declaração conjunta que a Europa enfrenta um "enorme desafio" desde o ano passado, importando combater as "causas" deste fenómeno.
"Neste contexto, Grécia e Portugal vão cooperar para fazer com que a União Europeia dê os passos necessários para a efectivação de uma política migratória efectiva nas suas fronteiras externas", refere-se na declaração conjunta.
Tsipras e Costa, pelo contrário, deixam uma crítica às concepções favoráveis à construção de "muros" e "barreiras", unilateralmente, por parte de países europeus.
Os primeiros-ministros de Portugal e da Grécia defendem antes que a Europa assuma uma política "solidária" e "humana" na gestão dos fluxos migratórios, devendo manter-se aberta aos cidadãos que a procuram e precisam de protecção internacional, substituindo "as perigosas rotas irregulares de migração" por vias legais de acolhimento a pessoas que fogem de zonas em conflito militar, caso especial da Síria.
Além da importância de acelerar os processos de recolocação de refugiados que chegam à Grécia e à Itália, Tsipras e Costa referem-se também ao fenómeno da emigração económica, defendendo que a União Europeia, "ao mesmo tempo, encete esforços para estabilizar os acordos de readmissão com os países de origem".
No mesmo documento, os dois primeiros-ministros condenam o terrorismo e mostram-se disponíveis para cooperar ao nível de uma política externa de segurança comum.
Costa e Tsipras manifestam "preocupação" com a situação no Afeganistão, dão apoio aos acordos de Minsk para a resolução da crise na Ucrânia, assim como a um processo negocial, supervisionado pelas Nações Unidas, para uma solução para Chipre que respeite a lei internacional e cumpra os princípios democráticos, "respeitando os direitos humanos e a liberdade de expressão de todos os cipriotas" - uma alusão à parte de Chipre sob ocupação turca.