Os serviços sociais britânicos e o “rapto” de crianças portuguesas para adopção

Podem os serviços sociais britânicos retirar uma criança a pais portugueses para adopção? Podem e devem, não só a pais portugueses — até porque isto não é uma questão étnica ou de orgulho nacional

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Lucy Nicholson/Reuters

Podem os serviços sociais britânicos retirar uma criança a pais portugueses para adopção? Podem, particularmente quando o pai da dita criança tenta lavá-la com lixívia. Segundo o mesmo, através deste salutar banho, estará a proteger o seu rebento contra cancro, VIH, Alzheimer, autismo, entre outros.

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Podem os serviços sociais britânicos retirar uma criança a pais portugueses para adopção? Podem, particularmente quando o pai da dita criança tenta lavá-la com lixívia. Segundo o mesmo, através deste salutar banho, estará a proteger o seu rebento contra cancro, VIH, Alzheimer, autismo, entre outros.

Se a isto juntarmos o comportamento agressivo do pai, então pouco mais se espera de um serviço de segurança social para além de assegurar isso mesmo, a segurança da criança em risco de sofrer um banho letal por parte de um progenitor que pertence a uma seita religiosa. O Genesis II, sediado nos Estados Unidos (onde mais, senão na América?), promove a venda de um comprimido milagroso, o MMS ("Miracle Mineral Solution"), que não é mais do que lixívia e, como todos sabem, a cura para todos os males — isto se tivermos em conta ser a morte a cura definitiva de todos os males.

Este é o caso de Iolanda Menino e Leonardo Edwards, residentes no Reino Unido, presentemente em campanha nos media e redes sociais contra os serviços sociais britânicos, a quem acusam de rapto, depois de terem perdido a guarda do filho cinco dias após o seu nascimento. No entanto, este não é o primeiro caso em que filhos são retirados a famílias portuguesas no Reino Unido. Em 2013, cinco filhos foram retirados da guarda de pais que nunca "batem" nos seus filhos, apenas "castigam". Para bom entendedor…

Mas vamos a factos. O Reino Unido é o país onde Victoria Climbié morreu aos nove anos, em 2000, vítima de agressões múltiplas por parte da mãe e do seu companheiro, apesar do envolvimento de serviços sociais, polícia e serviços de saúde. O Reino Unido é também o país do Baby P, morto pelos pais aos 17 meses de idade, em 2007, vítima de abusos físicos e maus tratos ao longo de oito meses, apesar de estar sinalizado pelos serviços de saúde e segurança social.

Infelizmente, foi preciso chegar à morte de duas crianças para que hoje os serviços sociais britânicos procurem, no menor espaço de tempo possível, garantir o bem-estar de quem menos se pode defender num mundo cada vez mais bizarro e onde o perigo está sempre um passo à nossa frente.

Portugal, no entanto, pouco ou nada tem aprendido com tão gritantes exemplos. Recentemente, em Fevereiro de 2016, uma mãe abriu as águas do Tejo de par em par para lá deixar, para todo o sempre, uma filha de 18 meses e outra de quatro anos. Isto apesar de ambas as crianças estarem sinalizadas pela Segurança Social e polícia por suspeita de abusos sexuais e violência doméstica.

Portanto, podem os serviços sociais britânicos retirar uma criança a pais portugueses para adopção? Podem, e devem, não só a pais portugueses — até porque isto não é uma questão étnica ou de orgulho nacional — mas a todos os pais que não só não sabem ser pais como não o querem ser, facilmente confundindo agressão com educação, e aos quais nos compete a todos chamar a atenção, denunciando às autoridades competentes todo e qualquer caso que suscite a nossa preocupação.

E se os serviços sociais britânicos podem, e devem, retirar uma criança em risco à guarda dos seus pais, menos não se espera dos serviços sociais portugueses. Porque tudo é uma questão de bom senso e mais vale prevenir do que chorar a bom chorar sobre o caixão branco e pequenino de quem já não volta nunca mais.