Queda de passageiro à linha mostra falha de segurança nos comboios de Sintra
Em todas as composições é o maquinista que permite a abertura de portas pelos passageiros, mas na linha de Sintra basta que o comboio esteja parado para o poderem fazer. Por causa disso, um passageiro caiu à linha.
10 de Novembro de 2014. O comboio suburbano n.º 18807, que tinha saído do Rossio às 18h38 com destino a Sintra, pára na estação de Algueirão-Mem Martins mas, por distracção do maquinista, fica com parte da composição fora da plataforma. Um passageiro com limitações cognitivas e visuais que viajava na penúltima carruagem, depois de accionar a abertura de uma porta através do respectivo manípulo, desembarca e cai à linha.
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10 de Novembro de 2014. O comboio suburbano n.º 18807, que tinha saído do Rossio às 18h38 com destino a Sintra, pára na estação de Algueirão-Mem Martins mas, por distracção do maquinista, fica com parte da composição fora da plataforma. Um passageiro com limitações cognitivas e visuais que viajava na penúltima carruagem, depois de accionar a abertura de uma porta através do respectivo manípulo, desembarca e cai à linha.
Do acidente apenas resultaram ferimentos ligeiros. A queda deu-se de uma altura de um metro e meio e o passageiro, depois de ter sido transportado para o Hospital de São Francisco Xavier, em Lisboa, teve alta no próprio dia. Mas o GISAF (Gabinete de Investigação de Segurança e de Acidentes Ferroviários) resolveu investigar o sucedido por desconfiar que poderia haver ali uma falha de segurança.
O relatório, agora publicado, diz que “não existe qualquer análise de risco por parte da CP ao sistema de comando de portas implementado no tipo de material circulante envolvido no acidente” e recomenda ao IMT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes), enquanto entidade reguladora, que garanta que a CP implemente um procedimento operacional para que a abertura de portas pelos passageiros “apenas seja permitida depois da confirmação de estarem reunidas as condições de segurança para o efeito”.
Em causa está uma especificidade dos comboios da linha de Sintra, que transportam uma média de 140 mil passageiros por dia útil. Se uma composição parar em plena via, compete ao maquinista bloquear o sistema de abertura de portas a fim de que os passageiros não as abram fora das estações ou quando não houver condições de segurança (salvo em situações de emergência). Mas, na restante frota da CP, é ao contrário: as portas estão sempre bloqueadas, devendo o maquinista desbloqueá-las quando o comboio está parado na estação. É o que acontece, tanto com os suburbanos da linha de Cascais, como com as automotoras regionais, ou os comboios Alfa Pendular.
E não é só a frota da CP. O relatório do GISAF apresenta os exemplos da Croácia, Reino Unido, Dinamarca, França e Espanha como países onde a autorização para a abertura de portas dos comboios depende da actuação manual por parte do maquinista. E não identifica nem no resto da Europa, nem nos Estados Unidos, nem no Japão nem na Austrália um sistema idêntico ao dos comboios da linha da Sintra.
Por isso, independentemente dos motivos que levaram o maquinista a parar o comboio com algumas carruagens fora da plataforma, o acidente poderia ter sido evitado se as portas não fossem passíveis de ser abertas pelos passageiros pelo simples facto de a composição estar parada.
Outras falhas
Na sequência deste acidente, o GISAF identificou ainda “um incidente de segurança no decurso das operações de socorro”, nomeadamente a passagem de um comboio numa via junto à qual decorria a assistência à vítima. Os investigadores consideraram que houve falha de comunicação entre o pessoal da CP e o da Infraestruturas de Portugal que estava no Centro de Comando Operacional (CCO) de Braço de Prata, porque “o acidente foi tratado como uma queda na plataforma do apeadeiro e não como uma queda à via”. E, tratando-se deste último, deveria ter sido accionado o plano de emergência que suspende a circulação dos comboios pela linha junto aos socorristas, o que não aconteceu.
O relatório diz que “durante toda a ocorrência a comunicação havida entre os diversos intervenientes nunca foi clara quanto ao entendimento e transmissão do local efectivo da queda do passageiro”. Por isso, faz recomendações ao IMT para que a CP “estabeleça protocolos de comunicação (adequados) a que em situações de emergência a informação seja transmitida de forma integral e fidedigna quanto à realidade da situação”.
Instada a comentar a versão preliminar do relatório, a CP respondeu ao GISAF que “a causa primária do acidente, não obstante o sistema de comando das portas, terá sido a paragem aquém do local indicado”, remetendo assim para o maquinista a total responsabilidade pelo ocorrido. “O erro/lapso do maquinista não consistiu no facto de não ter inibido a abertura de portas, mas sim no facto de ter efectuado a paragem antes do local referido”, diz a empresa.
A CP rejeita ainda que tenha havido falhas de comunicação no motivo que levou a que os comboios continuassem a circular mesmo com operações de socorro junto à linha, remetendo essa responsabilidade para o CCO de Braço de Prata, ou seja, para a Infraestruturas de Portugal.