Se a Islândia votasse hoje, elegia uma poeta e pirata
Ministro da Agricultura e Pescas assume chefia do Governo de coligação e anuncia eleições para o próximo Outono.
As eleições antecipadas na Islândia só deverão realizar-se no Outono. Mas se fossem amanhã, seria provável que os islandeses escolhessem uma mulher, poeta e pirata, para chefiar o Governo. Até lá, será Sigurdur Ingi Johannsson, que era ministro da Agricultura e Pescas, a assumir o cargo que era de Sigmundur Gunnlaugsson. Isto se a mudança for suficiente para aplacar a revolta popular provocada pelo envolvimento do Executivo nos Panama Papers.
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As eleições antecipadas na Islândia só deverão realizar-se no Outono. Mas se fossem amanhã, seria provável que os islandeses escolhessem uma mulher, poeta e pirata, para chefiar o Governo. Até lá, será Sigurdur Ingi Johannsson, que era ministro da Agricultura e Pescas, a assumir o cargo que era de Sigmundur Gunnlaugsson. Isto se a mudança for suficiente para aplacar a revolta popular provocada pelo envolvimento do Executivo nos Panama Papers.
A demissão de Gunnlaugsson na terça-feira foi a primeira baixa política do escândalo sobre a fuga de informação do escritório de advogados Mossack Fonseca, no Panamá. Entre os 11,5 milhões de documentos estão alguns que provam que a mulher do ex-primeiro-ministro é dona da Wintris, uma empresa offshore com interesses em bancos que estão em negociações com o Governo. O próprio Gunnlaugsson chegou a deter também metade da firma durante dois anos, quando ainda era deputado.
O Partido do Progresso, de Gunnlaugsson e Johannsson, e o Partido da Independência acordaram na quarta-feira à noite que seria Johannsson a chefiar a coligação de centro-direita até novas eleições. “Vamos continuar a trabalhar juntos. Evidentemente, esperamos que isto traga estabilidade política”, afirmou o novo primeiro-ministro numa conferência de imprensa. “Prevemos organizar eleições este Outono”, cita a AFP. As legislativas estavam programadas para a Primavera de 2017.
A passagem de testemunho foi contestada, já que Johannsson é acusado de pertencer ao grupo de responsáveis que fechou os olhos aos excessos financeiros que conduziram à crise de 2008. Esta solução "não é o que o povo pretende", comenta à AFP Birgitta Jonsdottir, líder do Partido dos Piratas.
A crise política vem dar um novo impulso aos Piratas, tornando Jonsdottir na possível futura primeira-ministra (a Islândia já teve uma mulher na liderança, no rescaldo da crise).
A Reuters refere que “revolução” é a palavra preferida de Jonsdottir, uma apoiante dos WikiLeaks, que aos 22 anos publicou o seu primeiro livro de poesia. O seu partido, com uma ideologia anti-sistema, foi criado por um grupo de activistas em 2012. Recebeu o mesmo nome que outros partidos de protesto europeus.
Não é de agora o aumento da popularidade dos Piratas – desde o último ano que as sondagens lhe atribuem uma crescente popularidade. Mas a última auscultação dá-lhe 43% das intenções de voto. Um aumento muito considerável face aos 5,1%, que lhes garantiram três deputados, nas eleições de 2013, que levaram ao poder a coligação de centro-direita.
“O país decidiu que o que é demais é demais”, comentou Jonsdottir, de 48 anos, numa entrevista à Reuters. “Eles mostraram de forma expressiva que querem uma coisa diferente. Por alguma razão, essa coisa diferente parece ser o meu partido”. E entre as bandeiras dos Piratas está a concessão da nacionalidade islandesa a Edward Snowden, antigo funcionário da CIA que divulgou informação confidencial.
Este escândalo fez ecoar a hecatombe de 2008 – o culminar de anos de euforia do sector financeiro, que usou e abusou de empresas-fantasma. Quando o sistema financeiro islandês implodiu, os principais bancos detinham activos equivalentes a cerca de 923% do PIB do país – que com a crise decresceu 10%. A recessão levou a um aumento brutal do desemprego (nove vezes superior aos valores pré-crise), a uma forte desvalorização da coroa islandesa (80% face ao euro) e à intervenção do Fundo Monetário Internacional. Seguiram-se julgamentos de gestores de topo e até do primeiro-ministro (acusado, mas ilibado, de negligência), tornando a Islândia no único país do mundo a enviar para a prisão os responsáveis pela crise.
Ainda que em 2011 o país já estivesse em crescimento, o trauma permaneceu. E vários analistas olham para a popularidade dos Piratas como um sinal disso mesmo. “Vivemos numa altura em que assistimos a verdadeiras forças transformadoras, em que a população em geral está a expressar de uma forma muito afirmativa que quer um tipo diferente de governação: querem mais empenho”, diz ainda a sua líder, que se inclui na linha do candidato democrata à corrida presidencial americana Bernie Sanders, ou de Alexis Tsipras, o primeiro-ministro grego, e do seu Syriza.