Draghi, o homem dos juros baixos, chega a Lisboa com conselhos e avisos

Primeiro um almoço com o presidente, o primeiro-ministro e o governador, depois uma presença no Conselho de Estado. O presidente do BCE vem falar de política económica e financeira com a liderança do país.

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Mario Draghi chegará a Lisboa na quinta-feira Kai Pfaffenbach/Reuters

Com um almoço ao mais alto nível e uma inédita intervenção no Conselho de Estado, Mario Draghi, a personalidade internacional que mais influência tem tido na evolução da economia e do sistema financeiro do país nos últimos anos, entra esta quinta-feira em directo e ao vivo no mundo político português. Se não houver surpresas, aquilo que deverá fazer será, como nos últimos meses, pedir uma estratégia orçamental prudente, com o cumprimento das regras europeias, defender o desempenho do Banco de Portugal na gestão da estabilidade financeira e deixar um aviso: o BCE pode ter de deixar de ajudar se o rating da DBRS cair.

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Com um almoço ao mais alto nível e uma inédita intervenção no Conselho de Estado, Mario Draghi, a personalidade internacional que mais influência tem tido na evolução da economia e do sistema financeiro do país nos últimos anos, entra esta quinta-feira em directo e ao vivo no mundo político português. Se não houver surpresas, aquilo que deverá fazer será, como nos últimos meses, pedir uma estratégia orçamental prudente, com o cumprimento das regras europeias, defender o desempenho do Banco de Portugal na gestão da estabilidade financeira e deixar um aviso: o BCE pode ter de deixar de ajudar se o rating da DBRS cair.

Na agenda da visita do presidente do Banco Central Europeu a Lisboa vão estar dois momentos fundamentais. À tarde, a partir das 15h, Draghi participa, a convite do presidente da República, no Conselho de Estado. Imediatamente antes disso, ao almoço, conversa com Marcelo Rebelo de Sousa e o primeiro-ministro, António Costa, na presença do governador do Banco de Portugal, Carlos Costa.

Embora o tema da intervenção de Mario Draghi no Conselho de Estado seja a evolução da economia europeia, as discussões do homem forte do BCE durante quinta-feira estarão centradas, quer com os conselheiros de Estado quer principalmente no almoço a quatro, nos últimos desenvolvimentos económicos e financeiros em Portugal. E em quase todos eles, o papel desempenhado pelo banco central é fundamental.

No que diz respeito ao sector financeiro, são muito variados os temas. As instruções directas vindas de Frankfurt no processo de resolução do Banif, contribuindo de forma decisiva para a escolha do Santander como comprador do banco português, vieram comprovar que, no que diz respeito à banca, aquilo que Mario Draghi diz faz lei.

E essa certeza surge em simultâneo com o debate a que se assiste agora em Portugal sobre o risco que representa um domínio espanhol da banca nacional. Nesse contexto, para além do Banif, o presidente do BCE deverá debater com António Costa, Marcelo Rebelo de Sousa e com os membros do Conselho do Estado qual irá ser a posição assumida no processo de venda do Novo Banco, na exigência que está a ser feita ao BPI para reduzir a sua exposição a Angola (e que poderá levar ao reforço da posição dos accionistas espanhóis) e na necessidade de reforço de capitais noutros bancos nacionais, como o BCP e a Caixa Geral de Depósitos.

Mario Draghi deverá manter o seu apoio ao desempenho de Carlos Costa, o representante do Eurosistema em Portugal, em mais uma defesa do estatuto de independência que os bancos centrais gozam na zona euro. É isto que Draghi tem feito, sem excepção, em todos os países e em todas as circunstâncias.

Mais investimento público... nalguns casos

No que diz respeito à condução da política económica e orçamental, o debate será feito directamente com o Governo. O presidente do BCE é, em público, extremamente comedido a comentar a política específica de um determinado governo da zona euro. Mas são vários os sinais que tem dado.

Quando um Governo do PS apoiado pela esquerda se começou a desenhar, disse não querer comentar a situação política, mas sempre avisou que “a instabilidade não é positiva para a economia”.

Depois, sempre que o BCE anuncia novas medidas de estímulo para a economia da zona euro defende que, do lado dos governos, também é preciso fazer mais. Ultimamente, uma das coisas que tem dito é que é preciso fazer mais investimento público, o que até poderia ser lido como aprovação da política de estímulo da procura interna seguida pelo do Governo português no seu primeiro orçamento.

No entanto, invariavelmente, sempre que diz isso, Mario Draghi tem o cuidado de lembrar: este aumento do investimento público deve ser feito pelos países que têm espaço de manobra orçamental para isso e as regras europeias são para cumprir.

Draghi reforça também outro conselho aos governos que lhe é muito caro, o de fazerem as chamadas reformas estruturais, que na óptica do BCE são as medidas no mercado de trabalho e de produto que aumentam a competitividade e produtividade dos países.

Esta primeira reunião do Conselho de Estado convocado por Marcelo Rebelo de Sousa como Presidente da República decorre num momento em que o Governo se prepara para entregar em Bruxelas, até ao final de Abril, o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas, dois documentos em que o governo português vai mostrar aos parceiros europeus (e ao BCE) aquilo que quer fazer ao nível do orçamento e das reformas estruturais.

Mario Draghi e o seu banco central, embora não tenham em teoria qualquer tipo de papel na avaliação desses programas (a tarefa cabe à Comissão Europeia e ao Eurogrupo), irá continuar a desempenhar um papel decisivo na capacidade de o país obter o financiamento de que precisa.

Para além das linhas de financiamento a taxas de juro muito baixas para os bancos portugueses, o BCE tem contribuído, através do seu programa de compra de obrigações a nível europeu, para que o custo do financiamento da dívida pública nos mercados internacionais se mantenha a níveis confortáveis para o Estado português.

Atenção ao rating

Apesar disso, contudo, Mario Draghi não deverá resistir a deixar um aviso. Se Portugal perder o rating acima de “lixo” que apenas a agência DBRS atribui ao país, as regras do bancos central impõem que deixe de comprar dívida pública portuguesa e que deixe de aceitar esses títulos como garantia oferecida pelos bancos para os seus empréstimos, um cenário que colocaria Portugal em grande dificuldade.

"É bom que o Presidente do Banco Central Europeu tenha a noção exacta daquilo que se passa em Portugal", disse o Presidente da República aos jornalistas em Oeiras, justificando a presença de Mario Draghi no primeiro Conselho de Estado mas sem confirmar o almoço a quatro. "Eu limito-me a dizer apenas que é importante a vinda do Presidente do Banco Central Europeu pelo papel que tem o banco no quadro das instituições europeias e porque é fundamental que nós tenhamos a noção de que o que se passa económica e financeiramente em Portugal tem a ver com o que se passa na Europa", afirmou, citado pela Lusa.

O convite a outras personalidades que não membros do Conselho de Estado para estarem presentes na reunião do órgão de aconselhamento do Presidente da República é raro mas não inédito. A última vez que aconteceu foi em Setembro de 2012, no auge da crise da TSU (Taxa Social Única), quando o então chefe de Estado, Cavaco Silva, convidou o ministro das Finanças Vítor Gaspar a estar presente na primeira parte da reunião, para explicar a polémica medida e responder a perguntas.

Um formato idêntico ao que vai ser seguido nesta quinta-feira: Mario Draghi fará uma intervenção e responderá a perguntas dos conselheiros de Estado. Carlos Costa é convidado apenas a assistir, podendo fazer perguntas, mas não uma intervenção.