FMI avisa que certas reformas têm impacto imediato negativo na economia

As reformas estruturais no mercado de trabalho que não implicam mais despesa pública podem abrandar as economias já em dificuldade, conclui o FMI numa análise com implicações para Portugal.

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A entidade liderada por Christine Lagarde pede prudência na escolha das reformas estruturais a aplicar Foto: François Lenoir/Reuters

O impacto das reformas estruturais num país, principalmente no curto prazo, dependem da situação em que se encontra a economia e do nível de endividamento atingido pelas empresas, afirma o Fundo Monetário Internacional (FMI) num estudo em que, embora se defenda a necessidade de os governos fazerem reformas, se reconhece também os problemas que países como Portugal podem sentir no imediato se decidirem ser demasiado ambiciosos no seu ímpeto reformista.

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O impacto das reformas estruturais num país, principalmente no curto prazo, dependem da situação em que se encontra a economia e do nível de endividamento atingido pelas empresas, afirma o Fundo Monetário Internacional (FMI) num estudo em que, embora se defenda a necessidade de os governos fazerem reformas, se reconhece também os problemas que países como Portugal podem sentir no imediato se decidirem ser demasiado ambiciosos no seu ímpeto reformista.

No capítulo do relatório das Previsões de Primavera publicado esta quarta-feira, os responsáveis do Fundo fazem uma análise aos efeitos que as reformas nos mercados de trabalho e de produtos têm nas economias avançadas do Mundo. O documento reafirma aquilo que tem sido uma das ideias chave defendidas pelo FMI ao longo das décadas: a realização de reformas estruturais é a chave para que as economias aumentem o seu crescimento potencial, que tem caído de forma acentuada desde o início do Milénio.

As reformas de que se fala são as do costume: desregular o comércio e serviços, as profissões reguladas e as indústrias de rede; reduzir o nível e a duração dos subsídios de desemprego; facilitar e tornar mais baratos os processos de contratação e despedimento no mercado de trabalho; reduzir o impacto da contratação colectiva; reduzir os custos de trabalho associados às contribuições sociais e aos impostos.

Aquilo em que o documento agora publicado pelo FMI inova é na análise que é feita aos impactos que estas medidas podem ter consoante a conjuntura que se vive e as características específicas de um país. E é aqui que Portugal fica com um problema em fazer valer os eventuais esforços de reforma que decida fazer.

Uma das principais conclusões da análise do Fundo é que, em algumas das reformas estruturais propostas, o impacto económico pode ser negativo no curto prazo quando um país enfrenta um problema de escassez de procura, com taxas de desemprego elevadas e um crescimento abaixo do potencial. Isto é verdade em particular em medidas como a redução do subsídio do desemprego ou de facilitação dos despedimentos. “As reformas feitas ao nível da protecção do emprego ou aos sistemas de subsídio de desemprego têm efeitos positivos quando os tempos são bons, mas podem tornar-se contraccionistas em períodos de crise porque podem enfraquecer a procura agregada”, afirma o documento.

É nesta situação que Portugal se encontra já há vários anos. Tal não impediu que, sob conselho da troika (da qual faz parte o FMI), o país tivesse avançado precisamente para reformas deste tipo quando estava no auge da crise, o que poderá, a acreditar nas conclusões agora publicadas, ter contribuído ainda mais para a contracção da economia.

Agora, o FMI recomenda neste relatório que, nos países a passar por uma fase negativa do ciclo económico, a prioridade se centre noutro tipo de reformas. Por um lado, ao nível do mercado de trabalho, são aconselhadas as reformas que reduzam os custos de trabalho através da diminuição dos impostos e das contribuições sociais que incidem sobre o trabalho, para além de uma dinamização das políticas activas de emprego.

No entanto, Portugal aqui também enfrenta um problema. É que esse tipo de medidas, como assinala o FMI, “implica algum grau de estímulo orçamental”, algo que vai contra os objectivos de redução do défice e da dívida que também são exigidos ao país.

Outra alternativa apresentada pelo FMI é a aposta nas reformas estruturais nos mercados de produto, cujo efeito no curto prazo, mesmo quando a economia está em crise, não é calculado como negativo. Mas, também aqui, Portugal está limitado porque o FMI diz que o impacto positivo no investimento que se espera nestes casos “tende a ser mais fraco em empresas constrangidas por dívida”. O sector empresarial português é um dos mais endividados da zona euro.

Perante tantos obstáculos, torna-se difícil perceber como é que Portugal, enquanto a economia estiver a crescer pouco, pode avançar para as reformas estruturais recomendadas pelo FMI sem afectar a economia ou prejudicar os objectivos orçamentais no curto prazo.

O relatório do FMI, contudo, deixa algumas sugestões: criar incentivos para a melhoria dos balanços das empresas e dos bancos, compensar reduções dos impostos sobre os salários com o aumento de outro tipo de impostos, aplicar reformas no mercado de trabalho apenas para os novos trabalhadores adiando o impacto negativo, e estabelecer regras orçamentais que aumentem o espaço de manobra dos Estados na concretização de reformas estruturais.

Por fim, para além das reformas estruturais analisadas, o FMI afirma que, para aumentar o crescimento potencial é ainda preciso ir mais longe, através de novas políticas ao nível da educação e inovação, por exemplo.