Angola e São Bento, os votos da vergonha
Como se trata do regime angolano, o respeitinho luso é “muito bonito”. Mas ficámos muito feios no retrato.
Paulo Portas, no adeus ao CDS, bem tinha avisado: havia que evitar "a tendência para a judicialização da relação entre Portugal e Angola" e procurar "em todas as frentes um compromisso." O CDS ouviu-o e cumpriu. Não só ele. Também o PSD e o PCP. No dia 31 de Março, o Parlamento português chumbou, com votos contra destes partidos, duas propostas que condenavam, de forma mais branda ou mais desabrida, a aplicação de pesadas penas de prisão a 17 activistas angolanos por um tribunal de Luanda. O PS, autor de uma das propostas, limitava-se a lamentar "a situação a que se assiste e que atenta contra princípios elementares da democracia e dos Estados de direito, fazendo votos para que seja corrigida". Um voto piedoso. Já o Bloco de Esquerda, mais hostil, condenava "a punição dos activistas angolanos", apelando à sua libertação e a que a tramitação do processo "obedeça aos princípios fundadores do Estado de direito".
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Paulo Portas, no adeus ao CDS, bem tinha avisado: havia que evitar "a tendência para a judicialização da relação entre Portugal e Angola" e procurar "em todas as frentes um compromisso." O CDS ouviu-o e cumpriu. Não só ele. Também o PSD e o PCP. No dia 31 de Março, o Parlamento português chumbou, com votos contra destes partidos, duas propostas que condenavam, de forma mais branda ou mais desabrida, a aplicação de pesadas penas de prisão a 17 activistas angolanos por um tribunal de Luanda. O PS, autor de uma das propostas, limitava-se a lamentar "a situação a que se assiste e que atenta contra princípios elementares da democracia e dos Estados de direito, fazendo votos para que seja corrigida". Um voto piedoso. Já o Bloco de Esquerda, mais hostil, condenava "a punição dos activistas angolanos", apelando à sua libertação e a que a tramitação do processo "obedeça aos princípios fundadores do Estado de direito".
Ora nada disto podia ser validado, no estado de mansa submissão a que nos habituámos. Os argumentos usados não diferem muito dos do Jornal de Angola, porta-voz do regime, de cada vez que resolve zurzir em Portugal por um comentário menos apropriado. Se este se queixava de uma "ingerência desabrida" que "ultrapassa todos os limites", os que agora chumbaram os protestos alegaram coisa parecida: que é preciso "respeitar a soberania de República de Angola" e que, como argumentou o PCP, "cabe às autoridades judiciais angolanas o tratamento" de tal processo. Talvez não se tenham dado conta que as "autoridades judiciais" já fizeram isso mesmo, impondo penas de um peso inqualificável sob pretextos que nenhuma justiça normal aceitaria sem protestar.
E aqui está uma palavra proibida: protestar. Não se pode. Em Angola, dá prisão. Aqui, protesta-se muito mas não oficialmente. É preferível baixar a cabeça, sabe-se lá o que nos reserva o futuro. Ficámos, com estes votos da vergonha, muito mal no retrato.