Activistas angolanos condenados já voltaram para a cadeia

Luaty Beirão condenado a cinco anos e seis meses de prisão. Domingos da Cruz condenado a oito anos e seis meses. Todos os 17 acusados foram hoje levados para a cadeia de Viana. Defesa vai recorrer no Tribunal Supremo.

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Os 17 activistas angolanos que foram considerados culpados dos crimes de “actos preparatórios de rebelião e associação de malfeitores” foram condenados esta segunda-feira a penas que variam entre os dois e os oito anos de prisão, noticiou o site Rede Angola. Todos foram condenados a penas de prisão efectiva e já estão na cadeia de Viana, incluindo as duas activistas, Rosa Conde e Laurinda Gouveia, que passaram o julgamento em liberdade, disse um dos advogados, Zola Ferreira, ao PÚBLICO que confirmou a informação avançada pela Rede Angola. O rapper luso-angolano Luaty Beirão foi condenado a cinco anos e seis meses de prisão e Domingos da Cruz, considerado o líder do grupo, cumprirá oito anos e seis meses de pena.

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Os 17 activistas angolanos que foram considerados culpados dos crimes de “actos preparatórios de rebelião e associação de malfeitores” foram condenados esta segunda-feira a penas que variam entre os dois e os oito anos de prisão, noticiou o site Rede Angola. Todos foram condenados a penas de prisão efectiva e já estão na cadeia de Viana, incluindo as duas activistas, Rosa Conde e Laurinda Gouveia, que passaram o julgamento em liberdade, disse um dos advogados, Zola Ferreira, ao PÚBLICO que confirmou a informação avançada pela Rede Angola. O rapper luso-angolano Luaty Beirão foi condenado a cinco anos e seis meses de prisão e Domingos da Cruz, considerado o líder do grupo, cumprirá oito anos e seis meses de pena.

Nuno Dala, Sedrick de Carvalho, Nito Alves, Inocêncio de Brito, Laurinda Gouveia, Fernando António Tomás “Nicola”, Afonso Matias “Mbanza Hamza”, Osvaldo Caholo, Arante Kivuvu, Albano Evaristo Bingo -Bingo, Nelson Dibango, Hitler Samussuku e José Gomes Hata foram condenados a quatro anos e seis meses de prisão. E Rosa Conde e Jeremias Benedito foram condenados a dois anos e três meses de prisão. Nos 17 casos, as penas são efectivas na excecução.

"Esperávamos uma condenação. O que nos abalou foi as penas aplicadas serem tão gravosas", continua Zola Ferreira. "O juiz foi vago nas suas fundamentações", diz relativamente à acusação por associação de malfeitores, que o Ministério Público acrescentou nas alegações finais, no dia 21 de Março, e pelo qual os réus não tinham sido pronunciados. 

Os advogados de defesa vêem a introdução deste crime como "ilegal" e como mera justificação para enquadrar o caso num "crime mais gravoso sem possibilidade de ter pena suspensa ou convertível a multa". Se fossem acusados de actos preparatórios de rebelião, crime pelo qual estavam acusados no início do julgamento, a pena máxima seria de três anos, com possibilidade de ser suspensa na execução. "Todos receberam cúmulo de penas" de ambos os crimes.

Todos os advogados de todos os acusados "já apresentaram recurso em acta no acto da condenação" e têm cinco dias para recorrer da decisão no Tribunal Supremo e no Tribunal Constitucional, explica o advogado. "Também solicitámos o recurso com efeito suspensivo" para que os condenados aguardassem a decisão sobre do Tribunal Supremo fora da prisão "mas o juiz só admitiu recurso para o processo e não relativamente à situação carcerária." Terminada a leitura da sentença, "os condenados foram directamente conduzidos à prisão a pedido do juiz". 

Decisão "sem sentido"

O penalista angolano Benja Satula considera que a sentença é inconstitucional e acredita que é isso mesmo que o Tribunal Supremo irá declarar, o que por lei pode ser até daqui a entre seis meses a um ano. Depois disso, o Tribunal Constitucional pode pronunciar-se caso a decisão do Supremo seja desfavorável aos arguidos e aí demorar outros 45 dias. “Não faz sentido absolutamente nenhum que a primeira acusação seja de actos preparatórios de rebelião, golpe de estado e atentado contra o Presidente e não se produza prova disso e no final o Ministério Público venha dizer que havia prova de crime de associação de malfeitores. No Código Penal, que é de 1886, vem alegado que a associação de malfeitores pressupõe que tenha havido um pacto e, por causa disso, os malfeitores tenham praticado actos maus. Se foram acusados de actos preparatórios, estes” não podem ser incluídos no tipo legal de associação de malfeitores, comentou. Além disso, houve uma alteração da prova e dos factos e quando assim é recomenda a Constituição que se proceda ao direito de defesa e ao princípio do contraditório, portanto o tribunal tinha que devolver à defesa e aos arguidos o direito de defesa. Benja Satula prevê que exista recurso – e comenta que o facto de os arguidos irem de novo para a cadeia será mais uma violação da Constituição que consagra que a interposição de recurso suspende os efeitos da decisão.

O advogado não tem dúvidas de que o espírito é condenar os activistas. “Como não era consistente a acusação de actos preparatórios de rebelião, golpe de estado e atentado contra o Presidente começou-se a estudar uma nova forma.”

O caso dos 15 activistas, a cumprir prisão domiciliária, e duas outras arguidas que responderam à justiça em liberdade, teve início a 20 de Junho de 2015, quando um grupo de jovens foi surpreendido pela polícia durante uma acção de formação, que as autoridades consideraram ser de preparação para actos de rebelião e atentado contra o presidente José Eduardo dos Santos.

Segundo o Rede Angola, ficou provado que os debates realizados pelos activistas serviram para planear e concretizar os actos de rebelião. “Não há qualquer dúvida que os arguidos estavam a preparar actos de rebelião porque os mesmos não pretendiam apenas ler um livro [Ferramentas para Destruir o Ditador e Evitar Nova Ditadura Filosofia Política da Libertação para Angola, do académico Domingos da Cruz). Os arguidos queriam aprender como destituir o poder”, disse nas alegações finais a representante do Ministério Público, Isabel Fançony Nicolau .

Também pelo facto de não responderem nenhuma das questões do juiz e nem da acusação, a representante do Ministério Público alegou que os 17 activistas formaram uma associação de malfeitores, liderada pelo co-réu Domingos da Cruz – o autor dos manuais nos quais se baseava a formação dos réus e principal formador do grupo – e por Luaty Beirão, e pediu a condenação dos arguidos pela formação de organização criminosa.

A defesa dos arguidos já tinha anunicado que vai recorrer das sentenças. O Ministério Público vai fazer o mesmo.

"Absolutamente estúpido"

“Este foi um processo claramente político”, comentou ao PÚBLICO o escritor angolano José Eduardo Agualusa. “As acusações foram mudando ao longo do tempo. Todo o processo foi burlesco, acabando com esta acusação de malfeitores que justifica a sentença”, acrescentou. “Uma coisa que aprendi ao longo dos anos foi a nunca subestimar a estupidez do regime. Este foi um gesto, do ponto de vista político, absolutamente estúpido. Desde o fim da guerra que Angola não passava por uma crise (económica) tão grave. Esta condenação vai ter uma consequência imediata que é fazer regressar o movimento de solidariedade para com os presos e a contestação contra o regime”.

“Este final é completamente surpreendente pela violência e o livre arbítrio a que o regime chegou”, disse ao PÚBLICO o professor da Universidade Católica de Angola Nelson Pestana e escritor sob o pseudónimo Eduardo Bonavena. “Nas alegações finais, pela primeira vez, o Ministério Público fala de um novo crime, de associação de malfeitores, que não existiu na pronúncia nem nunca foi falado ao longo de todo o julgamento. É com base nessa nova acusação que são deduzidas as penas de prisão e que são as sentenças, que ultrapassam os três anos previstos na acusação” pela qual estavam pronunciados de actos preparatórios de rebelião.

"É o livre arbítrio completo”

“Isto quer dizer que qualquer cidadão pode ser preso acusado de qualquer coisa e ser condenado a pena máxima no país", denuncia Nelson Pestana. "Porque a qualquer momento se pode retirar ou acrescentar novas acusações. Isto quer dizer que qualquer cidadão pode ser preso acusado de qualquer coisa e ser condenado a pena máxima no país. É o livre arbítrio completo.”

Este desfecho “é intimidatório, vai intimidar muita gente, mas por outro lado é natural que aconteçam novas manifestações organizadas pela ala da juventude do movimento revolucionário”, diz ainda Nelson Pestana. Em consequência disto, o académico considera que “a contestação interna e o descrédito internacional” vão aumentar. “É uma vergonha. Desacreditam o país e fazem crescer a revolta.” 

Os ativistas recusaram sempre as acusações imputadas e garantiram em tribunal que os encontros semanais que promoviam  visavam discutir política e não qualquer ação de destituição do Governo ou atos violentos.

No decurso do julgamento, que se arrasta desde 16 de Novembro, sempre rodeado de fortes medidas de segurança, o Ministério Público angolano deixou cair a acusação de atos preparatórios para um atentado contra o Presidente. Foi no dia 21 de Março que a representante do Ministério Público, Isabel Fançony Nicolau, alegou que não ficou provado que os 15+2 pretendiam atentar contra a vida de José Eduardo dos Santos e aos demais órgãos de soberania e também absolveu o arguido Manuel Chivonde Baptista Nito Alves do crime de falsificação de identidade.

Concentração em Lisboa

Num apelo à liberdade incondicional de todos os activistas, foi marcada para esta segunda-feira uma concentração no Rossio em Lisboa às 18h, pelo movimento LAPA – Liberdade aos Activistas Presos em Angola – à qual se juntará a Amnistia Internacional, que reuniu mais de 41 mil assinaturas numa petição dirigida ao ministro da Justiça e procurador-geral de Angola a pedir a libertação dos réus.