Moradores de Évora encontraram notas de 20 euros nas caixas de correio
Uma empresa distribuiu 60 euros ao longo de três dias a várias famílias, procurando sensibilizá-las para as vantagens da poupança.
Pelo menos 13 moradores da rua do Ouro no bairro do Bacelo em Évora foram contemplados durante os últimos três dias com notas de 20 euros colocadas nas caixas do correio.
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Pelo menos 13 moradores da rua do Ouro no bairro do Bacelo em Évora foram contemplados durante os últimos três dias com notas de 20 euros colocadas nas caixas do correio.
Na quinta-feira, a insólita dádiva suscitou reacções controversas: o agradecimento de uns e a suspeição de outros. Na tarde de sexta-feira, o PÚBLICO recolheu os testemunhos de vários moradores, perplexos com o sucedido. No entanto, e como dizia o criativo Fernando Pessoa no slogan para o primeiro anúncio da Coca-Cola em Portugal: "Primeiro estranha-se, depois entranha-se".
Assim, à surpresa do primeiro dia, seguiu-se a satisfação mesmo dos mais cépticos em relação “à bondade” da acção que “quatro artistas” na expressão de um dos moradores, que distribuíram dinheiro sem pedir nada em troca.
Paula Silva arranjava os vasos das flores e quando lhe foi perguntado se recebera também 20 euros respondeu a sorrir: “Ontem, [quinta-feira] tinha 20 euros na caixa do correio e hoje, [sexta-feira] tenho 40, mas as notas estão guardadas à espera de saber o que nos está a acontecer” sublinhou. Apenas procurou confirmar se eram falsas ou verdadeiras. Afinal eram “notas boas”, garantiu-lhe a PSP de Évora que sabia da “operação” e quais os propósitos da acção mas não os revelou.
“Nos dias de hoje não é muito normal darem dinheiro às pessoas”, disse ainda Paula Silva. Alguns dos moradores viram um dos “artistas” a colocar o dinheiro na caixa do correio, enquanto outro filmava a reacção das pessoas e os diálogos que o acontecimento gerava.
“Só nos dizem para estarmos atentos à caixa do correio”, acrescenta Paula Silva, deixando expresso um princípio de que não abdica: “Você não vai gastar dinheiro que não é seu, que não ganhou a trabalhar.”
Mais adiante o vizinho João Fernandes reconhece que não ficou irritado com a benesse, bem pelo contrário.
Sindicalista filiado na CGTP e estudante na Universidade de Évora, reflecte o que diz ter sido uma das conclusões do último congresso da central sindical: a crise é profunda e transversal à sociedade portuguesa”. Logo, “por mim, podem vir todos os 365 dias do ano” colocar 20 euros na caixa do correio. Não se importa.
João Fernandes tem um palpite. “Deve ser algum projecto-piloto, um estudo de sociologia sobre acção/reacção, para saber como a população interage em situações anormais.”
O seu vizinho do lado não partilha deste ponto de vista e assume a sua irritação e mal-estar pelo que aconteceu às pessoas da rua do Ouro. “Suponhamos que é como aqueles gajos na Bélgica ou para marcar o meu ritmo de vida para saber se eu estou em casa a determinadas horas?”
A seu lado, a esposa acrescenta: “Isto quem vê caras não vê corações”. E o marido completa de imediato o raciocínio sobre hipotéticas ameaças. “Veja aquele gajo da Bélgica que tomava o café num restaurante de um português e depois foi colocar bombas.”
João Fernandes tentou desdramatizar. “Não tenho uma perspectiva tão negativista. Parto do princípio de que são boas pessoas.”
O vizinho reflectiu um pouco e acabou por concluir que apesar do “clima de insegurança” que se interioriza "20 euros por dia até não está mal, não senhor".
João Carmona, um dos “artistas” que andou a distribuir dinheiro, explicou ao PÚBLICO que a entrega das notas de 20 euros tem como finalidade “sensibilizar as pessoas para as vantagens de poupar, uma vez que receber dinheiro grátis, apesar de toda a gente gostar, não é habitual nem sustentável.”
E relata pormenores da acção que desenvolveu ao longo de três dias. “ A Rua do Ouro encheu-se de vizinhos a comentar entre si, moradores do mesmo bairro que perguntavam se também iam receber dinheiro, houve pessoas que ofendidas devolveram as notas, outras que se emocionaram e agradeceram”. Mas houve quem ficasse ofendido e devolvesse as notas, e até quem suspeitasse da acção e tivesse chamado a polícia.
No total, cada família recebeu 60 euros, assinala Carmona, frisando que o investimento total na acção que envolveu 13 famílias rondou os 800 euros.
Por detrás da iniciativa esteve a Quoty, que se apresenta como “uma plataforma agregadora de folhetos” que dá suporte ao consumidor através de uma aplicação para smartphone e tablet, e de um site, que permite a identificação de oportunidades de compra e o armazenamento virtual de cartões de fidelização.