A "geringonça" aprovou o Orçamento contra a vontade da "caranguejola"
Proposta de Orçamento do Estado para 2016 foi aprovada pelo PS, BE, PCP e PEV. PSD e CDS alertaram para riscos.
Ainda que com limitações e insuficiências, as bancadas à esquerda do PS preferiram realçar as medidas que conseguiram incluir no Orçamento de Estado (OE) para 2016. Foi com esse apoio inédito que o PS aprovou a sua proposta orçamental em votação final global. PSD e CDS votaram contra, o PAN absteve-se, apesar de terem sido aceites algumas das suas alterações.
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Ainda que com limitações e insuficiências, as bancadas à esquerda do PS preferiram realçar as medidas que conseguiram incluir no Orçamento de Estado (OE) para 2016. Foi com esse apoio inédito que o PS aprovou a sua proposta orçamental em votação final global. PSD e CDS votaram contra, o PAN absteve-se, apesar de terem sido aceites algumas das suas alterações.
Na sessão de encerramento, que decorreu esta quarta-feira de manhã, a deputada bloquista Mariana Mortágua sustentou que o contributo do partido foi “decisivo” para “travar o empobrecimento do país”. E disse “orgulhar-se” do alargamento da tarifa social de energia a um milhão de famílias com carência económica, deixando um aviso para o futuro. “Falta agora o mais difícil: coragem para executar estas escolhas, alicerçada na força social que defende o país da burocracia europeia”. A deputada começou a sua intervenção por dizer que o Orçamento foi “piorado na Comissão Europeia e melhorado na Assembleia da República”.
Em jeito de balanço, João Oliveira, líder da bancada do PCP, reconheceu que “no final da discussão o OE leva mais longe as medidas positivas da proposta inicial”. E exemplificou com a aprovação da gratuitidade progressiva dos manuais escolares proposta pela bancada comunista. João Oliveira admitiu, no entanto, que é insuficiente ao dizer que “a resposta fica aquém do que seria necessário e possível perante os problemas que atingem os trabalhadores, o povo e o país”. Estas “limitações e incoerências” devem-se às “imposições e condicionamentos externos, sejam eles o da submissão ao euro, ao pacto de estabilidade ou a uma dívida insustentável”, afirmou.
Na mesma linha, a deputada do PEV Heloísa Apolónia congratulou-se com as linhas mestras do Orçamento por quebrarem “o ciclo do empobrecimento” e por ter sido “notoriamente influenciado pelas posições conjuntas assinadas” pelo PS com os partidos à esquerda. A deputada salientou que houve “margem” para aprovar alterações na especialidade e referiu exemplos dos ecologistas como a distribuição de leite sem lactose nas escolas bem como a isenção de IMI mesmo para quem tem dívidas ao fisco.
Apesar de ter conseguido fazer passar algumas das suas propostas – como a redução do IVA nos copos menstruais e deduções fiscais nas despesas com veterinários – o deputado do PAN – Pessoas-Animais-Natureza absteve-se por não se rever inteiramente no Orçamento. André Silva argumentou que embora tenha havido alguns avanços nas questões relativas aos animais, isso não aconteceu na natureza.
Ainda que cada uma das bancadas da esquerda tenha puxado apenas pelas próprias contribuições para o Orçamento foi a crítica ao PSD e ao CDS que acabou por ser o denominador comum entre elas. O ataque mais violento viria da bancada do PS.
Carlos César criticou a "caranguejola" da direita
Carlos César acusou o PSD de não querer “servir quem o elegeu nem servir para o que foi eleito”, numa alusão à decisão social-democrata de não apresentar propostas e de se abster nas alterações. Uma estratégia diferente da adoptada pelo CDS. “Da ‘caranguejola da direita, que se desconjuntou, foi o PSD que ficou a pé mas não de pé”, apontou o dirigente socialista. “ [O PSD] ficou à porta da democracia”, acrescentou, recordando que os sociais-democratas votaram contra mais de 70 artigos idênticos dos do OE2015 que eram da sua autoria. “Esteve aqui a votar conta o que concordava, com a mesma leviandade com que se absteve no que discordava”, criticou Carlos César.
O também presidente do PS deixou um “desafio” aos dois partidos da direita: que já em Abril participem no debate da orientação das políticas orçamentais, contribuindo para o Programa de Estabilidade e Crescimento e o Plano Nacional de Reformas para ajudarem a “construir uma política mais amiga do crescimento e do investimento e estejam na Europa do lado que interessa aos portugueses e que beneficia Portugal”.
Realçando que o PS e o Governo se empenharam numa “cultura de diálogo” para que o orçamento tivesse “a maior participação possível”, Carlos César lembrou que nos últimos anos foram “sempre rejeitadas” as propostas do PS pela maioria de direita mas agora foram “aprovadas propostas de todos os partidos que as submeteram, inclusive do CDS”.
O desafio de colaborar com os socialistas no Programa de Estabilidade e Crescimento e no Plano Nacional de Reformas deixado por Carlos César à direita teve de Luís Montenegro a resposta que o PSD insiste em levar até ao fim e que aplicou na discussão do orçamento: no dia em que o Governo e António Costa não tiverem o apoio dos partidos com quem assinaram acordos “terão que se demitir”.
“Isto não é uma questão de azedume e muito menos ameaça política”, apressou-se a dizer o líder da bancada social-democrata, mas sim uma “questão de seriedade, de responsabilidade política e de verdade”. Luís Montenegro acrescentou: “Não contem connosco para atitudes dissimuladas. Não somos dos que afinam e mudam o discurso em função das plateias que têm pela frente. Nós não somos desses.”
O discurso foi assim do princípio ao fim nos 17 minutos de que o PSD dispunha para intervir: Montenegro tentou explicar a atitude do seu partido vincando as diferenças de atitude perante o país, os problemas e o orçamento entre os dois, tentando desmontar as críticas dirigidas pela esquerda, em especial o facto de não ter apresentado propostas de alteração.
O social-democrata avisou que à “imprudência orçamental de hoje vai corresponder o plano B de amanhã” e que Costa está a fazer o que Sócrates fez em 2009 – “dá o que tem e o que não tem para, a seguir, cobrar em dobro o que deu antes” – pelo que a “factura” não tardará.
O alerta para o “enorme risco” do Orçamento socialista também foi deixado pelo vice-presidente da bancada do CDS-PP, Telmo Correia, ao apontar a substituição do “gradualismo” pelo “imediatismo”. O risco, prosseguiu, “não é para o Governo”, mas sim “infelizmente para todos os portugueses, como foi em 2011”, lembrando a bancarrota. O democrata-cristão não deixou de dar recados à esquerda, usando o exemplo da Grécia: “Aqueles que estavam tão exaltados com a Grécia e o Syriza como sendo o futuro e o sol na terra, agora os syrizitas de cá foram os primeiros a roer a corda aos syrizas de lá. Enfim, é a syriza no topo do bolo”.
Em defesa do Orçamento do Governo PS, o ministro das Finanças, Mário Centeno, assumiu que o executivo tem a “plena consciência” de que “virar a página da austeridade não significa governar sem restrições”. Disse que a proposta assenta em “previsões conservadoras” e recusou alinhar “em discursos alarmistas ou profecias catastróficas”, alegando não ser um ”orçamento irrealista”.