Chipre é a grande barreira ao acordo sobre os refugiados com a Turquia
Na cimeira de Bruxelas, a Comissão Europeia propõe medidas para que o processo de devolução seja legal. Prevê acelerar análise dos pedidos de asilo e criar centros de detenção nas ilhas gregas.
Convencer Chipre a aceitar o acordo da União Europeia com a Turquia para impedir que os refugiados da guerra da Síria continuem a chegar à Grécia é a grande tarefa da Comissão Europeia, que tenta o tudo por tudo para o fazer passar na cimeira de quinta e sexta-feira. Sublinhando o seu carácter “extraordinário e ao mesmo tempo temporário”, e que “não há alternativa” a esta proposta, a Comissão mobilizou-se numa ofensiva diplomática para tentar afastar as dúvidas sobre a sua legalidade.
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Convencer Chipre a aceitar o acordo da União Europeia com a Turquia para impedir que os refugiados da guerra da Síria continuem a chegar à Grécia é a grande tarefa da Comissão Europeia, que tenta o tudo por tudo para o fazer passar na cimeira de quinta e sexta-feira. Sublinhando o seu carácter “extraordinário e ao mesmo tempo temporário”, e que “não há alternativa” a esta proposta, a Comissão mobilizou-se numa ofensiva diplomática para tentar afastar as dúvidas sobre a sua legalidade.
O Presidente cipriota, Nicos Anastasiades, ameaçou vetar qualquer progresso nas negociações de acesso da Turquia à UE – uma contrapartida do acordo para Ancara receber todos os migrantes que a Europa recusar. Só não o fará se a Turquia abrir os portos e aeroportos turcos aos aviões e navios cipriotas, reconhecendo a República de Chipre. Desde 1974 que a ilha está partida ao meio, quando o Norte, após uma invasão turca, declarou a independência.
Anastasiades resiste a esta pressão. “É despropositado, contra-produtivo, para não dizer inaceitável, colocar o peso da responsabilidade da crise dos migrantes às minhas costas, ou às costas da República de Chipre”, afirmou. Mas é isso que a diplomacia europeia está a fazer – embora esteja também a insistir com Ancara para que apoie as negociações de reconciliação em Chipre, que pela primeira vez em muitos anos parecem bem encaminhadas.
A Comissão Europeia divulgou vários documentos, antes da cimeira, para concretizar a proposta de Ancara, que tem como ideia central a devolução à Turquia de quem tenha chegado à Grécia por vias ilegais, ainda que seja sírio. Por cada pessoa mandada para trás, a UE compromete-se a receber um refugiado que esteja na Turquia legalmente.
O objectivo desta troca por troca será acabar com “os fluxos irregulares de migrantes a viajar no mar Egeu, substituindo-os por um processo legal e ordeiro de reinstalação”, afirmou o principal vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans. Em Bruxelas, considera-se que com as fronteiras da Europa fechadas, e com os migrantes que entrem de forma irregular na Grécia a serem mandados para trás, mata-se a galinha dos ovos de ouro dos traficantes. “Temos a oportunidade de pôr fim de uma vez por todas ao modelo de negócio dos traficantes e acabar com o sofrimento humano ligado a estas actividades criminais”, afirmou.
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No entanto, a Comissão Europeia quer garantir que cumprirá a lei. “As devoluções só podem ocorrer de acordo com o quadro legal internacional e da UE”, disse Timmermans.
Só que para mandar para trás alguém com necessidade de protecção internacional, é preciso ter a certeza de que vai para um país seguro. E é preciso garantir que, antes, teve a possibilidade de pedir asilo na Grécia, que o seu caso foi apreciado de forma individual, e que pôde recorrer da decisão, no caso de a resposta ter sido negativa. Tudo isto leva tempo, muito tempo numa situação normal.
O que a Comissão propõe é uma grande aceleração desse processo na Grécia, ao abrigo de um ponto da Directiva de Procedimentos de Asilo que reconhece que, “em algumas circunstâncias, pode aplicar-se um processo expedito em que não é necessário examinar a substância de um pedido”, explicou Timmermans. Isto pode acontecer se a pessoa já foi reconhecida como refugiada, se puder ter protecção considerada suficiente “num primeiro país de asilo” ou se vier para a UE a partir de “país terceiro seguro” que possa garantir protecção, sublinhou o comissário europeu. Essa descrição aplica-se à caracterização que está a ser feita da Turquia.
Centros de detenção
A Grécia e a Turquia precisarão de fazer alguns ajustes na sua legislação, diz um dos relatórios divulgados esta quarta-feira. Muitos têm a ver com a aceleração dos processos de reenvio dos migrantes em situação irregular para a Turquia – com custos estimados em 20 milhões de euros por mês em transportes. De Atenas espera-se ainda que aumente, muito, a capacidade de resposta do Serviço Grego de Asilo “para possibilitar o reenvio expedito, bem como a rápida aceitação das requisições de asilo”, diz o relatório, desta vez sem quantificar os custos.
Nada é dito sobre a possibilidade de Ancara reconhecer plenamente o estatuto do refugiado, aprovado após a II Guerra – aplica-o apenas a refugiados da Europa. “A Turquia devia acabar com todas as restrições à Convenção de Genebra”, disse à Reuters Zeid Ra'ad Al Hussein, o Alto-comissário das Nações Unidas para os Refugiados. “Temos muitas preocupações com a situação dos direitos humanos na Turquia.”
Zeid Ra'ad Al Hussein alertou que os hotspots nas ilhas gregas se podem tornar “centros de abuso”, ainda antes de o relatório da Comissão ter reconhecido que os actuais centros de registo dos refugiados vão ter de ser muito ampliados e mudar de carácter. Terão de ter “espaço de detenção suficiente para os indivíduos que apresentam um risco de evasão.”