A abertura ao mar da lagoa de Santo André

Interrogo-me como este evento, que gera uma cascata de ondas estáticas com muita força, não tem projecção internacional.

Em Portugal temos uma lagoa que vai ao mar uma vez por ano. Chama-se lagoa de Santo André, situa-se pouco acima de Sines e é um ecossistema costeiro fantástico. Há já alguns séculos que a água doce que esta lagoa acumula no Inverno não é suficiente para romper naturalmente com a frequência necessária o cordão dunar de algumas dezenas de metros que a separa do mar. Para evitar que se torne um pântano, a lagoa é aberta artificialmente no início das marés-vivas da Primavera.

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Em Portugal temos uma lagoa que vai ao mar uma vez por ano. Chama-se lagoa de Santo André, situa-se pouco acima de Sines e é um ecossistema costeiro fantástico. Há já alguns séculos que a água doce que esta lagoa acumula no Inverno não é suficiente para romper naturalmente com a frequência necessária o cordão dunar de algumas dezenas de metros que a separa do mar. Para evitar que se torne um pântano, a lagoa é aberta artificialmente no início das marés-vivas da Primavera.

Outrora com recurso à força de braços e tracção animal, hoje com maquinaria pesada, é aberto um canal na areia das dunas, que em poucas horas se transforma num estuário efémero que pode durar alguns dias ou poucas semanas. A lagoa despeja-se quase na totalidade, permitindo libertar-se do excesso de matéria orgânica.

Com a água do mar que entra na maré cheia, chegarão larvas de peixes, crustáceos e moluscos que crescerão já com a lagoa fechada, servindo de alimento a algumas espécies de aves, e a alguma pesca tradicional.

O momento da abertura e as horas seguintes são de uma beleza extraordinária e quem sabe e pode comparecer não perde o espectáculo. O desnível entre a água da lagoa e a água do mar – por isso se escolhe abrir no início da maré vazante – é tal que se gera uma cascata de ondas estáticas com muita força, que rapidamente alarga o canal.

Há já alguns anos que alguns praticantes de surf e bodyboard descobriram a sensação de apanhar estas ondas que aparentam não se mexer, com a vantagem de durarem horas e terem muito pouca profundidade. Se forem levados para trás, basta apenas porem-se de pé, avançar uns passos e tentar de novo.

Este ano estive lá, e quando cheguei estavam apenas na água quatro praticantes de bodyboard e um de surf, com poucos espectadores a assistir. Como presumo que não haja muitos locais do mundo onde isto acontece, interrogo-me como este evento não tem projecção internacional. Com um pouco de pesquisa, encontramos na Internet alguns vídeos de ondas estáticas, em rios ou canais de rega, mas nada que se compare à cascata de Santo André.

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Será que tem de ser assim? Será que não ganharíamos todos muito mais se apostássemos na promoção da abertura ao mar da lagoa de Santo André como uma grande festa? Nos últimos anos temos assistido ao despertar do país para os novos usos do mar. Da onda gigante da Nazaré à reserva mundial de surf da Ericeira, vamos consolidando a ideia de que o nosso mar do século XXI não é só sol e praia ou pesca, e que esta mudança terá de ser feita sobretudo nas nossas cabeças, pois é dentro delas que existe a maior resistência à mudança.

Talvez um dia tenhamos um chefe de Estado que tenha praticado bodyboard e se disponibilize para ir apanhar a primeira onda e “abrir a pista”, chamando a todos a atenção que a abertura da lagoa merece. Ah… espera…

Biólogo