Quem rebenta primeiro?
O grande jogo global é hoje a vontade de colapso.
Há uns anos era difícil imaginar como se podia chegar ao fascismo. Agora é quase mais difícil não imaginar outra coisa. Há demasiados lugares no mundo onde a catástrofe política está a um par de eleições de distância — ou menos. E em vários outros lugares, da Rússia à Hungria e à Turquia, o futuro já chegou — só está, como dizia o outro, mal distribuído.
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Há uns anos era difícil imaginar como se podia chegar ao fascismo. Agora é quase mais difícil não imaginar outra coisa. Há demasiados lugares no mundo onde a catástrofe política está a um par de eleições de distância — ou menos. E em vários outros lugares, da Rússia à Hungria e à Turquia, o futuro já chegou — só está, como dizia o outro, mal distribuído.
O grande jogo global é hoje a vontade de colapso. Por um lado, essa vontade de colapso é o resultado da concorrência entre poderes: cada senhor neo-feudal está investido em saber quem rebenta antes, se ele ou os seus adversários. Fora das elites, a obsessão pelo colapso é apenas o reverso da falta de horizontes. Sem nada de positivo a poder imaginar para o país, o continente ou o mundo, resta temer — ou antecipar — o seu declínio com estrondo.
O seguinte exercício é revelador. Escrevam num motor de busca da internet o início de uma frase com o nome de um país, federação ou região do mundo. Como é hábito, o computador preencherá o resto da frase com as buscas mais populares no mundo. Fiz esta pesquisa principalmente em inglês, mas imagino que noutras línguas a coisa não será muito diferente.
Se escrevermos “irá a Rússia...” o computador completa — “...atacar a Turquia?”. A segunda opção mais popular é “colapsar”?
“Irá a Europa...” — “colapsar?”. Em segundo lugar, a pergunta mais popular era se o euro iria subir. A terceira, se o euro iria desaparecer.
“Irão os Estados Unidos...” — “atacar o ISIS?”. Em segundo lugar: “colapsar?”.
“Irá a Turquia...” — “invadir a Síria?”. “Colapsar” é a segunda pergunta mais popular.
Para o Brasil, a pergunta mais popular (em inglês) é se conseguirá organizar os jogos olímpicos a tempo (em português é: “será que o Brasil tem jeito?”). Para o Japão é se irá afundar-se. Para a China, “colapsar”. Para a Arábia Saudita, “colapsar”. Para o Egito, “colapsar”. Para o Reino Unido — “sair da UE?”. Para a Alemanha “crescer de novo?” mas logo seguida de “fechar as fronteiras?”. Para a França, todas as perguntas são belicistas: “invadir a Síria?”, “bombardear a Síria?”, “atacar a Síria?”. A Espanha: “dividir-se?”. E o mundo: “irá acabar?”, “acabar em 2016?”.
Enfim. Perguntas otimistas, só duas: “irá a Índia tornar-se numa superpotência?” e “irá o Irão crescer sem sanções?”.
Já agora, as mais populares perguntas sobre Portugal (em inglês) são, em primeiro lugar, se “irá unir-se com a Espanha”, e em segundo lugar “ganhar o Euro2016”. Só em terceiro se “irá sair do euro”. Alguns dirão que isto demonstra a pouca validade do exercício. Mas em português os resultados são mais sugestivos: “será que Portugal vai melhorar?”. Em segundo lugar a triste pergunta: “será Portugal um país desenvolvido?”.
Desta volta pelo estado de alma mundial não resulta nenhuma pergunta esperançosa: ninguém quer saber que país ou continente vai chegar a Marte, descobrir a vacina contra o zika ou atingir o pleno emprego. O mundo está profundamente mergulhado no pessimismo. Mesmo quando não perguntamos sobre países. Sabem o que acontece se escrevermos, em inglês, “será q...”?
O computador (ou a consciência global por detrás dele) responde logo, pressuroso: — “será que Trump ganha as eleições?”.