Tribunal diz que gestores públicos sabiam da “dimensão dos riscos” dos swaps
Sentença proferida em Londres concluiu que responsáveis das empresas de transportes do Estado tinham os conhecimentos necessários para negociar com o Santander. Um dos contratos negociados com o banco tem de ser liquidado já este mês.
A sentença proferida na sexta-feira por Justice Blair, o juiz que acompanhou em Londres o caso dos swaps do Santander, é clara: as empresas públicas estavam conscientes do risco que estes contratos implicavam e os seus gestores tinham os conhecimentos necessários para negociar com o banco. Apesar de concluir que não os subscreveram com um intuito especulativo, mas antes com o objectivo de conter a escalada da dívida, o tribunal britânico deu razão à instituição financeira, descartando o argumento de que estes swaps são “jogos de azar”.
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A sentença proferida na sexta-feira por Justice Blair, o juiz que acompanhou em Londres o caso dos swaps do Santander, é clara: as empresas públicas estavam conscientes do risco que estes contratos implicavam e os seus gestores tinham os conhecimentos necessários para negociar com o banco. Apesar de concluir que não os subscreveram com um intuito especulativo, mas antes com o objectivo de conter a escalada da dívida, o tribunal britânico deu razão à instituição financeira, descartando o argumento de que estes swaps são “jogos de azar”.
Estas são algumas das conclusões que integram a sentença de 163 páginas sobre os nove swaps vendidos à Metro de Lisboa, Carris, Metro do Porto e STCP. No documento, a que o PÚBLICO teve acesso, explica-se que o propósito das empresas foi “reduzir os encargos com juros” do financiamento contraído ao longo dos anos, maioritariamente para concretizar investimentos nas infra-estruturas públicas.
No entanto, o tribunal frisa que “não poderia haver qualquer dúvida por parte dos responsáveis destas empresas que subscreveram os swaps relativamente à dimensão dos riscos que acarretavam”. Algo que “não pressupunha um elevado nível de sofisticação financeira”. Apesar de discordar das alegações do Santander, que argumentou que os gestores tinham conhecimentos “sofisticados” sobre os produtos, o juiz concluiu que o grau de familiaridade com este tipo de contratos era o “adequado”.
Mesmo assim, tribunal alerta que os riscos que são hoje evidentes, face ao impacto negativo que a descida das taxas de juro teve nestes contratos, não poderiam ter sido antecipados. Um cenário “sem precedentes”, provocado pela crise financeira internacional, refere a sentença. “Os responsáveis das empresas não tiveram qualquer intenção de especular. As transacções foram vistas, naquele momento, como a melhor forma de gerir a dívida”, conclui, sublinhando que, até determinada altura, “foram vantajosas para o banco, mas também para os seus clientes”.
O tribunal partilha da leitura do Santander no que diz respeito às sucessivas tentativas de renegociação dos swaps, que ficaram sem resposta das empresas. “Quando a crise financeira se instalou, o banco tentou encontrar soluções de reestruturação. Mas essas tentativas acabaram por não ser bem-sucedidas porque, durante muito tempo, não foi claro se seria do interesse das empresas de transportes liquidar, renegociar os swaps, ou simplesmente esperar”, escreve o juiz.
A instituição financeira, que moveu a acção contra o Estado em 2013 depois de as empresas terem deixado de amortizar as prestações devidas, pedia que os nove contratos fossem considerados legais e que o dinheiro em dívida fosse pago, bem como os valores a entregar até ao final dos contratos. Justice Blair deu razão ao Santander, rejeitando os argumentos do Estado, que alegava, entre outras, que as empresas não tinham legitimidade para subscrever os swaps, que se tratava de contratos especulativos e que as circunstâncias se alteraram de tal forma que estava em causa a sua validade.
Liquidação este mês
Os contratos de swap assinados pelas empresas de transportes visavam a cobertura do risco de subida das taxas de juros nos empréstimos contratados com o banco. Como as taxas Euribor começaram, a partir de finais de 2008, a cair de forma significativa, atingindo mesmo valores negativos, o produto financeiro passou a gerar perdas elevadas para as entidades públicas. A 1 de Outubro de 2015, as perdas potenciais dos nove contratos julgados em Londres ultrapassavam os 1500 milhões de euros (que só têm de ser pagos se os contratos forem liquidados antecipadamente ou quando chegarem ao fim).
Na maioria deles, a maturidade só será atingida a partir de 2019, mas existe um swap que termina já a 27 de Março. Trata-se de um produto subscrito pela Carris, em 2007, mas que é o menos problemático, visto que as perdas potenciais rondavam, em Outubro, os 185 mil euros. É na Metro de Lisboa e na Metro do Porto que se concentram os maiores riscos, visto que os contratos destas duas empresas podem implicar prejuízos futuros de quase 1200 milhões.
No imediato, o Estado foi condenado a ressarcir o Santander das prestações que deixaram de ser pagas, a partir de Setembro de 2013 e que já totalizam 272 milhões de euros (dinheiro que foi sendo guardado pelas empresas a título de provisões). O valor global a suportar pelos cofres públicos, que incluirá ainda as despesas com advogados e também os encargos suportados pelo banco com processo, será determinado pelo tribunal até 23 de Março.
O Estado ainda poderá recorrer da decisão, mas, ao que o PÚBLICO apurou, o Governo ainda não decidiu que dará esse passo ou se simplesmente aceitará a decisão judicial. Caso as empresas não procedam ao pagamento dos 272 milhões de euros, o Santander será obrigado a avançar com uma acção de execução, desta vez envolvendo um tribunal português. Com Rosa Soares