Governo quer “via verde” no SNS para polícias em risco de suicídio
A intenção de facilitar o acesso dos agentes das forças de segurança que estejam em risco a consultas consta de um protocolo assinado nesta sexta-feira. Vai ser feito um estudo para conhecer os factores que podem levar ao suicídio. Associações sindicais dizem que não chega.
Os elementos das forças de segurança que sejam sinalizados pelos gabinetes de psicologia dos seus serviços como estando em risco de suicídio devem ter acesso directo às consultas externas de psiquiatria dos hospitais, sem terem de passar primeiro pelos centros de saúde. Ganham o estatuto de “muito prioritários”. É o que diz, no essencial, o protocolo assinado nesta manhã de sexta-feira pelos ministros da Saúde e da Administração Interna.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Os elementos das forças de segurança que sejam sinalizados pelos gabinetes de psicologia dos seus serviços como estando em risco de suicídio devem ter acesso directo às consultas externas de psiquiatria dos hospitais, sem terem de passar primeiro pelos centros de saúde. Ganham o estatuto de “muito prioritários”. É o que diz, no essencial, o protocolo assinado nesta manhã de sexta-feira pelos ministros da Saúde e da Administração Interna.
Os agentes da PSP e militares da GNR considerados em risco de suicídio terão igualmente prioridade nos serviços de urgência de Psiquiatria e Saúde Mental — à semelhança do sistema de “via verde” para quem chega com um AVC a uma urgência, exemplificou Francisco George, director-geral da Saúde, em declarações ao PÚBLICO.
No ano passado, suicidaram-se sete agentes da PSP e cinco militares da GNR. Há menos suicídios do que noutros países, mas registou-se um aumento em relação a anos anteriores, afirmou nesta sexta-feira o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, depois da assinatura do protocolo com o ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa.
O que é que muda na prática com este acordo? Resposta do ministro da Saúde aos jornalistas: “A facilidade com que as forças de segurança e os seus gabinetes de psicologia podem, de uma forma expedita, ter uma espécie de via verde que faça com que os profissionais tenham um atendimento prioritário, porque são profissionais expostos a uma carga e a um risco diferente do resto da população.” Havia “um procedimento mais difícil, havia barreiras ao acesso”, diz o ministro. Agora deixa de haver.
Durante a cerimónia de assinatura do protocolo, no ministério de Constança Urbano de Sousa, em Lisboa, a governante anunciou ainda que vai ser feito um estudo — “Uma autópsia psicológica” sobre os factores de risco de suicídio entre as forças de segurança. Objectivo: “Actuar a montante, de uma forma mais rigorosa, para evitar este fenómeno.”
Questionada sobre se entre os factores de risco não estarão a falta de condições de trabalho, a ministra da Administração Interna disse que é prematuro antecipar factores, até “porque essa falta de condições também existe noutras profissões”.
Sobre um eventual reforço de psicólogos na GNR e PSP, a ministra disse apenas que está a ser estudado. Mas não avança, para já, números. Lembra, contudo, que “existem nas forças de segurança linhas SOS de prevenção de suicídio com psicólogos, que estão abertas a todo o país.”
“Os guardas não desabafam com psicólogos do SNS”
De acordo com a Pordata trabalham na PSP e GNR cerca de 43 mil pessoas (dados de 2013). Já sobre os números de psicólogos nas duas forças há algumas divergências. A ministra disse de manhã que eram 40 na PSP e um número semelhante na GNR. José Alho, presidente da Associação Sócio-Profissional Independente da Guarda Nacional Republicana (ASPIG), disse que na GNR são apenas 11 – “São sete na linha de apoio, que funciona 24 horas por dia e serve todo o país, mais três no centro clínico, a dar consultas, e mais um no Porto, ou seja 11.” Contactado, posteriormente, o Ministério da Administração Interna, este fez saber que “a GNR tem 22 psicólogos”.
“Isto não vai resultar”, é a reacção de José Alho ao protocolo propriamente dito. “Os guardas não desabafam com psicólogos do SNS”, o que precisam, defende, é de ter à sua disposição mais psicólogos da GNR.
Em declarações ao PÚBLICO, José Alho afirma que a sua experiência lhe diz que os militares sentem que “têm uma imagem a preservar”: a de que “são fortes e não choram”, pelo que numa situação de fragilidade têm mais dificuldades “em abrir-se” com alguém de fora da instituição.
“De estudo em estudo”
A revisão do plano de prevenção do suicídio nas forças de segurança foi anunciada no final do ano passado pelo Governo. O protocolo desta sexta-feira insere-se nesse processo de revisão que, segundo o Ministério da Administração Interna, já está concluído. O novo plano, que vai substituir o de 2007, não foi, contudo, tornado público pelo executivo.
O presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), Paulo Rodrigues, diz que esta medida de articulação com o SNS será uma das mais relevantes do plano. Vai permitir uma “mais fácil coordenação com entidades externas” nas situações urgentes, diz. No entanto, só a criação deste sistema de referenciação e encaminhamento para o SNS não resolve o problema da falta de meios na estrutura — a ASPP reivindica, por exemplo, psicólogos em todos os comandos da PSP do país, o que não acontece actualmente.
“O papel central deve sempre caber ao gabinete de psicologia da PSP, são os psicólogos da PSP que conhecem o ambiente, as condições, que melhor podem avaliar” os agentes, diz Paulo Rodrigues. “O que propusemos, no âmbito da revisão do plano de prevenção do suicídio, foi que houvesse uma reforço da colaboração com o SNS para situações de urgência, mas não é isso que está no protocolo. O que lá está é a transferência de parte do trabalho que devia caber aos gabinetes das forças de segurança” para as consultas externas do SNS.
Sobre a possbilidade levantada por José Alho de ser mais difícil a um agente falar com um profissional de fora do sistema, Paulo Rodrigues diz que o problema com que mais se tem deparado é exactamente o oposto: há agentes que preferem ter apoio psicológico fora da polícia, com receio de que os psicólogos da instituição possam passar informações às estruturas, informações essas que possam ser prejudiciais à sua carreira. “O gabinete de psicologia da PSP tem um trabalho pela frente que é o de desmistificar, junto dos polícias, esse tipo de ideias.”
Sobre o estudo também anunciado pela ministra, para apurar os factores de risco, Paulo Rodrigues afirmou à Lusa que “todas as avaliações são positivas”, mas relembrou que “o gabinete de psicologia da PSP tem dados que devem apontar para um caminho” — “Não podemos andar de avaliação em avaliação, de estudo em estudo, e não dar resposta.”
Linha de apoio psicológico para agentes da PSP: 800 212 312
Linha de apoio psicológico para militares da GNR: 800 962 000