Morreu Noémia Delgado, a cineasta de Máscaras

Ligada à geração do Cinema Novo português e autora de um pioneiro documentário etnográfico, a realizadora, que foi casada com o poeta Alexandre O'Neill, morreu em Lisboa aos 82 anos.

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A realizadora portuguesa Noémia Delgado, autora de um pioneiro documentário etnográfico sobre os caretos tradicionais de Trás-os-Montes, Máscaras (1976), morreu esta quarta-feira em Lisboa, aos 82 anos.

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A realizadora portuguesa Noémia Delgado, autora de um pioneiro documentário etnográfico sobre os caretos tradicionais de Trás-os-Montes, Máscaras (1976), morreu esta quarta-feira em Lisboa, aos 82 anos.

Ligada desde os anos 60 ao cinema português e à geração do Cinema Novo, que então procurava revolucionar a produção cinematográfica nacional, foi assistente de Paulo Rocha em Mudar de Vida (1966) e de Manoel de Oliveira em O Passado e o Presente (1971), tendo depois estagiado em Paris com Jean Rouch.

Opositora do Estado Novo, chegou a estar um mês presa em Caxias. A seguir ao 25 de Abril, foi assistente de realização do alemão Thomas Harlan no célebre documentário Torre Bela (1977).

Nascida em Angola, em S. Pedro da Chibia (a actual Chibia), foi com um ano para Moçambique, onde viveu a infância e a adolescência, e chegou a Portugal em 1955. Casou-se dois anos depois com o poeta Alexandre O’Neill (1924-1986), com quem teve um filho, o fotógrafo Alexandre Delgado O’Neill, que morreria precocemente aos 34 anos, em 1993.

Como realizadora, a sua obra mais conhecida é Máscaras, de 1976, inspirada nos trabalhos etnográficos de Benjamim Pereira, que a realizadora e actriz Catarina Alves Costa considera “um filme muito pioneiro e muito importante para quem trabalha em cinema etnográfico em Portugal”, e que situa na linha dos documentários de António Campos, como Vilarinho das Furnas (filme) (1971) ou Falamos de Rio de Onor (1974).

“É um filme de referência, com um olhar bastante autêntico, mas ao mesmo tempo também poético sobre o povo e a cultura popular”, diz a realizadora de O Arquitecto e a Cidade Velha (2004) ou Falamos de António Campos (2009). “É um retrato um bocado romantizado, mas que tenta mostrar um país que estava bastante esquecido naquela altura, uma parte do país que os realizadores ligados ao regime do Estado Novo não mostravam."

Um objectivo igualmente visível nas já referidas obras iniciais de António Campos, mas também, lembra Catarina Alves Costa, em filmes como Festa, Trabalho e Pão em Grijó de Parada (1973), de Manuel Costa e Silva, ou Veredas (1977), de João César Monteiro, que aborda os contos tradicionais portugueses.

Lamentando que Máscaras esteja hoje “bastante esquecido” e nunca tenha sido editado em DVD, a realizadora conta que teve oportunidade de revisitar, no final dos anos 90, os mesmos lugares em que Noémia Delgado filmara, quando co-realizou com Catarina Mourão um documentário para a exposição Rituais de Inverno com Máscaras, um projecto coordenado pelo próprio Benjamim Pereira.

Nos anos 80, Noémia Delgado realizou vários documentários e séries para televisão, designadamente sobre as regiões vinícolas nacionais, a arte nova e déco no norte de Portugal ou o trabalho do ouro e da prata também no norte do país. Assinou ainda a série Palavras Herdadas, dedicada a escritores portugueses, e ela própria publicou um livro de poemas, Jacarandá no Coração (1986). O seu último filme, Quem Foste, Alvarez?, de 1988, é dedicado ao pintor modernista português José Dominguez Alvarez (1906-1942).