Ai custa, custa, Dr. Costa!
Verão como Costa, na veste de Primeiro-Ministro, manipulou e abusou. E fê-lo para diabolizar um deputado da oposição.
1. Respeito António Costa como homem, como político, como Primeiro-ministro do meu país. Respeito-o, mas não tolero e não admito, nem por uma fracção de segundo, que ponha em causa o meu patriotismo, o meu sentido nacional. Repito: não tolero, não admito e não recebo nem lições nem remoques de António Costa. Lamentavelmente, é a segunda vez que o faz, num curto espaço de dias, primeiro num debate quinzenal, depois no debate do orçamento. E que o faz, não num qualquer comício partidário, no calor excitado das sessões de propaganda em que agora quase diariamente se desmultiplica, mas antes na Assembleia da República e na qualidade estrita de Primeiro-Ministro.
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1. Respeito António Costa como homem, como político, como Primeiro-ministro do meu país. Respeito-o, mas não tolero e não admito, nem por uma fracção de segundo, que ponha em causa o meu patriotismo, o meu sentido nacional. Repito: não tolero, não admito e não recebo nem lições nem remoques de António Costa. Lamentavelmente, é a segunda vez que o faz, num curto espaço de dias, primeiro num debate quinzenal, depois no debate do orçamento. E que o faz, não num qualquer comício partidário, no calor excitado das sessões de propaganda em que agora quase diariamente se desmultiplica, mas antes na Assembleia da República e na qualidade estrita de Primeiro-Ministro.
Não vou aqui puxar galões nem pergaminhos de apego a Portugal, ao espírito nacional e ao sentido patriótico. Seria ridículo e redundante. E acabaria por dar a António Costa o pequenino sabor de uma justificação ou satisfação, o que ele de todo não merece.
2. Limitar-me-ei a corrigi-lo quanto aos factos. Para que a mentira que lançou, de duas vezes repetida em vestes oficiais, não faça o caminho do rumor, da insinuação e da aleivosia, convido todos a ouvirem a gravação da sessão plenária do Parlamento Europeu. Quem no debate plenário, preparatório do Conselho Europeu, aludiu à situação portuguesa e ao governo português foi a deputada Maria João Rodrigues, socialista e vice-presidente do Partido Socialista Europeu. De resto, para o fazer, invocou expressamente a inserção do semestre europeu na agenda daquele Conselho. Falando em inglês, enfatizou que o Governo português era fortemente europeísta. Quando chegou a minha vez de falar, tive naturalmente de a contraditar, no furtivo tempo de um minuto, para dizer que, não pondo em causa a convicção europeia dos socialistas portugueses, não poderíamos esquecer que o Governo português era apoiado por duas forças da esquerda radical. E que uma delas era claramente anti europeia – o PCP – e já o tinha demonstrado nesse mesmo debate na intervenção de João Ferreira (em que, heresia das heresias, falou de Portugal). E que a outra – o Bloco – tinha concepções económicas incompatíveis com a economia social de mercado que está na base da União Europeia tal como a conhecemos. E terminei com a terrível tirada parlamentar: “Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és”. Foi este o grave crime de lesa-pátria que o tal Paulo Rangel cometeu. Foi isto e só isto: nada mais. Deve ser isto que causou toda a agitação e apreensão que o Orçamento Costa gerou e gera nas instituições europeias e nos mercados internacionais. Curiosamente, depois de mim, falaram, sempre incidindo sobre Portugal e o Governo Português, Elisa Ferreira, Ana Gomes e Marisa Matias. Mas elas – como falam segundo os cânones do Governo actual – não atentam decerto contra a nação.
3. Vem depois o alegado “ralhete” do Senhor Juncker que, qual mestre-escola e decerto eivado pelo seu conhecido enlevo pela pátria lusa, teria puxado as orelhas ao dito Paulo Rangel. Interveio, é bem verdade. Mas interveio para lamentar que os deputados portugueses – a saber três socialistas do partido de Costa, um comunista apoiante do Governo Costa, uma bloquista apoiante do Governo Costa e eu, crítico do Governo Costa (suponho que, para já, ainda legitimamente) – travassem um debate muito marcado pela contingência nacional. Devo dizer que acho que Juncker nem sequer tinha razão. O tema era pertinente, fazia sentido e, surpresa das surpresas, foi levantado por uma distinta deputada socialista, do partido de Costa. Mas ainda que Juncker tivesse alguma razão, visou os seis deputados, não apenas um. Ouçam a gravação e verão. Verão como Costa, na veste de Primeiro-Ministro, manipulou e abusou. E fê-lo para diabolizar um deputado da oposição. E isso, Dr. Costa, por muito que lhe custe, não lhe admito.
4. Esta ideia provinciana e bacoca de que no Parlamento Europeu não se trata de assuntos que respeitam aos Estados-membros é verdadeiramente reaccionária e ultramontana. Já escrevi nas últimas duas semanas sobre este surto neonacionalista e esta febre patriótica do “interesse nacional único”. Desde sempre, mas em particular nos últimos sete anos, os eurodeputados de todos os partidos apoiaram e criticaram os diferentes Governos portugueses no quadro europeu. A tarefa dos deputados europeus eleitos por Portugal é representar os seus cidadãos junto da União e representar a visão que esses cidadãos têm do interesse nacional. A visão do interesse nacional do PCP não tem de coincidir naturalmente com a do CDS ou a do PS. De resto, todos os eurodeputados falam sobre o Reino Unido, a Hungria, a Grécia, a Alemanha, a Polónia, a Dinamarca e também naturalmente sobre Portugal. É isto ingerência nos assuntos de outros Estados? Ou é isto uma consequência do grau de integração e de interacção a que chegámos?
Dr. Costa, suspeitava já – por alguns sinais dados – e agora sei de ciência certa que lhe custa lidar com a crítica e a opinião alheia. Nada de novo no mundo claustrofóbico de algumas correntes socialistas. De resto, sei também que lhe custa que alguém demonstre quanto custa e custará o seu orçamento aos portugueses. Ai custa, custa, Dr. Costa! Uma coisa lhe garanto, por muito que isso lhe custe: não me intimida nem me calará; continuarei a exercer em pleno o meu mandato em nome do meu país e de todos os que me elegeram.