Áustria força fecho das portas aos refugiados para obrigar UE a agir
Encerrar a rota dos Balcãs e criar uma crise na Grécia pode forçar os Vinte e Oito a resolver a crise dos refugiados? É nisso que está a apostar a Áustria, que desafia a Alemanha a dizer quantos está disposta a aceitar este ano.
No conforto dos seus gabinetes, os dirigentes de vários países europeus debatem como “reduzir os fluxos” de refugiados que continuam a fugir da guerra na Síria, ou da paz podre pontuada de bombas no Afeganistão. A Áustria convidou nove países dos Balcãs para uma reunião para combinar como o fazer, e apresenta os resultados nesta quinta-feira, num encontro dos ministros da Justiça e do Interior da União Europeia. “Queremos fazer pressão sobre a UE para que seja adoptada uma solução comum”, afirmou a ministra do Interior austríaca, Johanna Mikl-Leitner.
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No conforto dos seus gabinetes, os dirigentes de vários países europeus debatem como “reduzir os fluxos” de refugiados que continuam a fugir da guerra na Síria, ou da paz podre pontuada de bombas no Afeganistão. A Áustria convidou nove países dos Balcãs para uma reunião para combinar como o fazer, e apresenta os resultados nesta quinta-feira, num encontro dos ministros da Justiça e do Interior da União Europeia. “Queremos fazer pressão sobre a UE para que seja adoptada uma solução comum”, afirmou a ministra do Interior austríaca, Johanna Mikl-Leitner.
A fronteira da Macedónia com a Grécia já foi encerrada no fim-de-semana – sobretudo para afegãos, que passaram a ser classificados como imigrantes económicos, o que resultou mais uma vez em confrontos com a polícia. Pelo menos 12 mil pessoas estão bloqueadas junto à fronteira. Já durante a semana passada, a Áustria impôs um limite diário de processamento de 80 pedidos de asilo por dia e a autorização de 3200 atravessamentos do país a partir da fronteira com a Eslovénia.
No ano passado, a Áustria, um pequeno país de 8,5 milhões de habitantes, acolheu 90 mil refugiados – o equivalente a 1% da sua população, uma das taxas mais elevadas dos membros da UE. Mas agora, o Governo – formado por uma grande coligação esquerda-direita, ao estilo alemão – está a ser cada vez mais pressionado por formações de extrema-direita, e sofrer os efeitos de ter recebido um número bastante grande de refugiados.
Tal como está a acontecer com Angela Merkel, por ter imposto uma política de portas abertas na Alemanha. Aliás, Viena desafia Berlim a impor também limites: “Esperamos que a Alemanha diga se está ainda disposta a receber refugiados e quantos, ou se já não está disposta a isso”, declarou ao tablóide alemão Bild o chefe da diplomacia austríaca, Sebastian Kurz. A Áustria limitou a 37.500 o número de refugiados que receberá em 2016.
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Por incentivo austríaco, o que está acontecer já é que nas fronteiras dos Balcãs estão a ser travadas as pessoas que são consideradas imigrantes económicos, as que viajam sem documentos de identidade ou que tenham feito declarações falsas. Esta é também a proposta que a Áustria e os outros nove países (Albânia, Bósnia-Herzegovina, Bulgária, Croácia, Eslovénia, Kosovo, Macedónia, Montenegro, Sérvia), nem todos membros da UE, apresentam esta quinta-feira no Conselho de Ministros do Interior e da Justiça.
A Comissão Europeia, no entanto, já manifestou sérias reservas e está a investigar a legalidade das movimentações austríacas: “Estamos preocupados por alguns países estarem a agir fora do quadro estabelecido”, disse Natasha Bertaud, uma porta-voz da comissão. “Estamos inquietos com estes desenvolvimentos ao longo da rota dos Balcãs e com a crise humanitária que pode produzir-se em alguns países, em particular na Grécia”, escreveram o comissário europeu da Imigração, Dimitris Avramopoulos, e o ministro holandês que tem este dossier, Klaas Dijkhoff, num comunicado conjunto.
A Grécia manifestou o seu desagrado por não ter sido feito um convite ao Governo grego para estar na reunião dos países balcânicos com a Áustria, e apresentou um protesto diplomático, chamando o embaixador de Viena em Atenas ao Ministério dos Negócios Estrangeiros para expressar a sua insatisfação. “Foi um gesto unilateral e não amistoso”, disse Atenas.
“Não percebem”
Os sírios também estão a ser bloqueados e mandados para trás. Cerca de 1600 pessoas chegaram ao porto de Pireu, em Atenas, esta manhã, vindas das ilhas gregas próximas da costa turca, que milhares de pessoas tentam alcançar todos os dias. Esta quarta-feira, no entanto, a polícia tinha instruções para parar os autocarros que partiam em direcção a Idomeni, na fronteira com a Macedónia. “Hoje ninguém vai para Idomeni. Não sai nenhum autocarro até se saber que Skopje abre a fronteira”, disse à Reuters Konstantinos Louziotis, responsável pelo sector de manutenção da ordem pública no Ministério da Imigração grego.
Hasan Frnjari, um estudante de marketing da cidade síria de Alepo, que está sob intenso bombardeamento russo, numa ofensiva “tudo-ou-nada” do regime de Bashar al-Assad para reconquistar a que já foi a cidade mais populosa da Síria, é um dos refugiados que foi apanhado nesta outra luta, a das divisões da União Europeia.
Sob um pesado céu cinzento, a anunciar chuva, Frnjari senta-se como muitos outros em tendas, junto a fogueiras acesas na zona do porto de Atenas, a tentar afugentar o frio. Disseram-lhe para ficar ali até haver novidades. “Chegámos aqui de manhã e não sei o que fazer. Queremos continuar até à Macedónia mas dizem-nos que a fronteira está fechada”, contou à Reuters. “Acho que não percebem realmente por que é que deixámos a Síria. Em Alepo as pessoas correm perigo. A cidade está sob bombardeamento constante. Pode-se morrer só por atravessar a rua.”
Pelo menos 102.500 pessoas chegaram às ilhas gregas desde o início de 2016, disse a Organização Internacional das Migrações. Em 2015, só em Junho se chegou a esse número. Quem chega vem, na maior parte dos casos, da Síria, do Afeganistão, do Iraque – locais de guerra e privação. E ao contrário do que se passava no Verão passado, quando 73% dos que faziam esta viagem eram homens adultos, agora 60% dos que procuram chegar à Europa para se porem a salvo são mulheres e crianças, diz a UNICEF.
O novo Alto-comissário das Nações Unidas para os Refugiados, Filippo Grandi, esteve na ilha de Lesbos esta quarta-feira, e manifestou a sua preocupação com o que vê na UE – em vez de medidas para resolver a questão dos refugiados, há cada vez mais portas a fecharem-se. “Estou muito preocupado com as notícias de encerramentos crescentes das fronteiras europeias na rota dos Balcãs. Vai criar-se ainda mais caos e confusão e aumentar o fardo da Grécia.”
Grandi sublinhou a necessidade de promover a recolocação dos refugiados que estão na Grécia e em Itália – dos 160 mil que os países da UE prometeram receber, menos de 600 encontraram novo lar noutro país, entre os quais 30 em Portugal.
Antes pelo contrário: o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, paladino da política do encerramento de fronteiras aos refugiados, defendida pelo grupo de Visegrado, anunciou esta quinta-feira que vai promover um referendo sobre o sistema de quotas voluntárias de distribuição dos refugiados, de acordo com a dimensão dos países e outros critérios, defendido pela Alemanha e pela Comissão Europeia – que resultou no número de 160 mil – e que está praticamente morto, por falta de adesão dos países dos Vinte e Oito. Não avançou datas, anunciou apenas que a proposta para a consulta popular foi entregue na Comissão Nacional de Eleições.