“Aceitamos condições como a da Work4u por desespero”
"Marca" que oferecia estagiários de borla e à experiência já fechou portas. Quantas pessoas foram já lesadas pela Work4u ninguém sabe. O P3 falou com Joana Fernandes. O "desespero" por um lugar no mercado de trabalho quase a fez cair na teia
Fez 200 quilómetros para comparecer numa entrevista de emprego que era afinal um processo de selecção para possíveis entrevistas de emprego futuras. Para ter acesso a elas, teria de pagar 30 euros e, caso fosse seleccionada, mais 30. O anúncio de “estágio remunerado” na área de Design de Moda ao qual respondeu não tinha afinal remuneração para além de 200 euros mensais para alimentação e transporte — valor variável consoante a vontade da empresa. Joana Fernandes bateu a porta. Mas só no dia seguinte, ao cruzar-se com a denúncia feita pela plataforma Ganhem Vergonha, percebeu o que tinha vivido nas instalações da Work4u.
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Fez 200 quilómetros para comparecer numa entrevista de emprego que era afinal um processo de selecção para possíveis entrevistas de emprego futuras. Para ter acesso a elas, teria de pagar 30 euros e, caso fosse seleccionada, mais 30. O anúncio de “estágio remunerado” na área de Design de Moda ao qual respondeu não tinha afinal remuneração para além de 200 euros mensais para alimentação e transporte — valor variável consoante a vontade da empresa. Joana Fernandes bateu a porta. Mas só no dia seguinte, ao cruzar-se com a denúncia feita pela plataforma Ganhem Vergonha, percebeu o que tinha vivido nas instalações da Work4u.
Joana é apenas uma entre os muitos candidatos a emprego que passaram pela Work4u, uma “marca” por detrás de um negócio maior que envolve duas empresas e uma associação, todas geridas pelos mesmos empresários. A actividade da Work4u foi entretanto encerrada, mas o que está por detrás desta “fachada” é algo maior.
Para a jovem algarvia de 25 anos este seria já o quarto estágio num período de um ano. É licenciada em Design de Moda e Têxtil e mestre em Design de Vestuário e Têxtil. Nunca teve um emprego remunerado, não conhece um contrato de trabalho. Nem através dos estágios do Instituto de Emprego e Formação Profissional conseguiu ainda um lugar. “Hoje em dia é difícil encontrar o primeiro emprego”, lamenta. Por que razão se sujeitam tantas pessoas à precariedade? “Aceitamos condições como a da Work4u por desespero.”
O contacto com o projecto começou no primeiro dia do mês de Fevereiro. Joana lembra-se dos passos detalhadamente. Respondeu online a um anúncio “urgente” de “estágio remunerado” para “prestigiada empresa cliente na área de Design de Moda” e o “feedback” foi quase imediato. Uma funcionária da Work4u contactou-a por telefone e sugeriu-lhe uma entrevista no número 96 da rua Bartolomeu Dias, em Lisboa, para o dia 3. Tinha de levar um currículo e 30 euros para a inscrição na Work4u. Para que empresa estava exactamente a concorrer? Recusaram responder.
Apesar de o pai ter achado “estranho” o pedido de um pagamento, Joana Fernandes decidiu arriscar. Viajou do Algarve até à capital. “Cheguei à morada que me deram e deparei-me com um centro de formação de nome Ibérica.” O local onde decorreu a entrevista era “uma sala de formação de medicina ou algo do género”, descreve.
Só quando a entrevistadora perguntou para que vaga estava a concorrer é que a ficha caiu completamente: “Não estava na empresa de Design de Moda.” Explicaram-lhe que aquele era um processo de selecção antes da entrevista com a empresa. Primeira desilusão. Mas havia mais: o “estágio remunerado” tinha, afinal, apenas um vencimento de 200 euros para transporte e alimentação — e este valor podia até ser outro, mais baixo. Como, aliás, se percebia no anúncio que deu início à polémica: “É a empresa que define o valor mensal de apoio.”
“Disse-me que o estágio seria extra-curricular e que assim são todos os estágios que realizam”, recorda Joana. Mas, como refere a Ganhem Vergonha num resumo do caso que fez na plataforma: “Apesar de muitas vezes referenciado em anúncios, estágio extra-curricular é um tipo de vínculo que não está previsto em nenhuma lei e que é inventado por muitos empregadores.”
Joana ainda não tinha desistido. De que “empresa prestigiada” se tratava afinal, insistiu. Recusaram-se a dizer. Saiu das instalações da Ibérica com um sabor amargo. Ainda vacilou, mas o facto de estar deslocada de casa tornava inviável mudar-se para Lisboa a receber 200 euros. “Ponderei porque trabalhar na área é o que qualquer jovem licenciado ou mestre pretende”, admite. “Muitas pessoas aceitam por acharem que pode ser a única oportunidade. Preferem realizar este tipo de estágios sem condições algumas a estar paradas.”