Mercados e Eurogrupo forçam Portugal a preparar plano B
Governo vai preparar novas medidas de redução do défice, que estejam de prevenção para usar “quando necessário”.
Foi com os mercados a pressionar Portugal de uma forma que não se via desde Julho de 2013 que Mário Centeno entrou na reunião do Eurogrupo desta quinta-feira. De lá, depois de ouvir os seus colegas da zona euro a pedirem mais garantias de que irá cumprir as metas orçamentais, o ministro das Finanças saiu com o anúncio de que o Governo irá preparar uma lista de medidas de austeridade adicionais que ficarão prontas para serem usadas rapidamente, caso tal venha a revelar-se necessário.
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Foi com os mercados a pressionar Portugal de uma forma que não se via desde Julho de 2013 que Mário Centeno entrou na reunião do Eurogrupo desta quinta-feira. De lá, depois de ouvir os seus colegas da zona euro a pedirem mais garantias de que irá cumprir as metas orçamentais, o ministro das Finanças saiu com o anúncio de que o Governo irá preparar uma lista de medidas de austeridade adicionais que ficarão prontas para serem usadas rapidamente, caso tal venha a revelar-se necessário.
O cenário dificilmente poderia ser mais difícil para o responsável político português. Durante a manhã, os mercados financeiros viveram mais um dia de forte turbulência e Portugal foi um dos focos de maior preocupação. As taxas de juro da dívida pública portuguesa subiram mais do que a de qualquer outro país europeu, com os investidores a mostrarem uma desconfiança em relação aos títulos nacionais semelhante à que se assistiu quando Paulo Portas anunciou a sua demissão do Governo há dois anos e meio.
Se do lado da maioria dos membros do Eurogrupo já poderia haver à partida dúvidas em relação aos planos orçamentais portugueses, com a forte pressão vinda dos mercados o sentimento de urgência entre os ministros das Finanças veio ao de cima, sendo considerado indispensável apresentar algum tipo de mensagem tranquilizadora aos investidores.
Essa mensagem veio sob a forma de uma espécie de plano B. O Eurogrupo não avançou para a exigência de aplicação imediata de novos impostos ou cortes de despesa, algo que iria contra a opinião emitida pela Comissão Europeia na semana passada, mas fez com que o Governo português tivesse de se comprometer a preparar um pacote de medidas que esteja pronto para ser accionado caso seja necessário.
"Em linha com a opinião da Comissão Europeia, aquilo que o Eurogrupo pede ao Governo português é para estar preparado para adoptar novas medidas quando elas forem necessárias (…) As medidas serão preparadas para serem tomadas quando forem necessárias, estando nós conscientes de que um cumprimento daquilo que é o Orçamento de Estado não necessitará dessas medidas", explicou Mário Centeno aos jornalistas a seguir à reunião.
Ao mesmo tempo, em conferência de imprensa, Jeroen Dijsselbloem, Pierre Moscovici e Klaus Regling defenderam a importância de tranquilizar os mercados, mostrando de forma mais credível que Portugal está pronto para cumprir as metas orçamentais a que se propôs. "O Eurogrupo saúda o compromisso das autoridades portuguesas em preparar a partir deste momento medidas adicionais a implementar assim que necessário, para garantir que o orçamento de 2016 respeite o pacto de estabilidade e crescimento," disse o presidente do grupo dos 19 ministros das Finanças da zona euro. Dijsselbloem defendeu ainda, numa resposta colocada sobre a situação em Espanha, que “quando os mercados estão voláteis, temos de ter uma mão firme”.
O comissário europeu Moscovici disse que “esta é a única forma de tranquilizar os investidores, restaurar a confiança e criar condições para haver bastantes e estáveis empregos que a população portuguesa precisa”.
Klaus Regling, director do mecanismo europeu de estabilidade financeira - que representa o maior credor de Portugal - , reconheceu que os mercados reagiram de forma "negativa" às incertezas que envolveram os últimos desenvolvimentos orçamentais. "Penso que o compromisso tomado pelas autoridades portuguesas para preparar imediatamente medidas adicionais, a usar caso seja necessário, é muito tranquilizador," disse Regling.
Já antes da reunião, o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, tinha dito que “Portugal deve estar ciente de que pode perturbar os mercados financeiros se der impressão de que está a inverter o caminho que tem percorrido, o que será muito delicado e perigoso para Portugal".
E que medidas é que poderão fazer parte deste plano B português? Nem Mário Centeno, nem os outros responsáveis políticos europeus quiseram avançar com ideias. "Nós não dizemos aos nossos colegas que medidas tomar, mas dada a situação actual de Portugal ficámos satisfeitos com o compromisso do governo Português em respeitar o pacto [de estabilidade]," disse Dijsselbloem.
Quando negociou a proposta de orçamento com a Comissão, o Governo apresentou mais de 1000 milhões de euros de medidas adicionais, incluindo subidas de impostos sobre os combustíveis e o tabaco e o recuo na redução da TSU para os salários mais baixos. O executivo evitou mexer no IVA, tanto no valor da taxa normal como no sector da restauração, onde irá efectuar uma descida. Poderá ser aqui que Governo conseguirá contar com mais margem de manobra, em termos de ganho de receita e de apoio político.
Tanto do lado da Comissão como do Eurogrupo, fez-se questão de deixar bem claro que a vigilância a Portugal será bem apertada, especialmente nos próximos três meses.
Em Maio, o teste que as autoridades europeias irão fazer a Portugal vai assentar em três dados novos: os números definitivos do défice de 2015, as previsões de Primavera da Comissão Europeia e o programa de estabilidade que Portugal irá apresentar com as metas orçamentais para os próximos quatro anos.
Em relação a 2015, o défice deverá ter ficado acima de 3% mesmo descontando o efeito do Banif e o défice estrutural, em vez de descer, subiu. Sendo assim, a Comissão Europeia ficará na mão com argumentos para ameaçar Portugal com um agravamento do procedimento por défice excessivo (com calendarização de medidas e possíveis sanções) caso não esteja à vista uma acção mais decidida em 2016 e nos anos seguintes.
A complicar ainda mais as coisas para Portugal está a expectativa de tempos de instabilidade nos mercados internacionais, semelhantes ao que se assistiu esta quinta-feira. Os investidores vêem as economias emergentes a abrandarem, os bancos centrais a baixarem ainda mais as taxas de juro e os bancos a perderem a sua rendabilidade. A ameaça de uma nova crise financeira é uma realidade e por isso a opção para muitos é a de fugir o máximo possível aos activos de risco.
Por isso, evitam os mercados accionistas e o petróleo e investem em ouro e prata. Nas obrigações, compram os títulos alemães e norte-americanos e vendem dívida dos países mais frágeis da zona euro. Portugal está a mostrar que, nesta fase, está claramente na linha da frente dos receios dos investidores.
As taxas de juro da dívida pública portuguesa a 10 anos subiram, no final da tarde desta quinta-feira, para 3,945%, mais cerca de 0,4 pontos do no dia anterior, de acordo com a Reuters. Foi a maior subida entre todos os países europeus e chegou a ser muito maior a meio da manhã, quando a taxa de juro chegou a aproximar-se dos 4,5%. Entre os receios dos mercados, está o facto de apenas uma agência de rating – a DBRS -- classificar a dívida portuguesa a um nível acima de “lixo”. Se se perder essa classificação, a capacidade do país aceder ao financiamento internacional pode ficar fortemente fragilizada.