Uma artista nua é uma exibicionista?
Artista Deborah De Robertis publicou no Vimeo o vídeo da sua polémica performance no Museu d’Orsay, em Paris.
“Não há perigo!”, exclama a artista Deborah De Robertis, protagonista de uma performance que envolveu a Olympia de Édouard Manet, provavelmente uma das mais célebres pinturas do Museu d’Orsay, em Paris. Deborah De Robertis é quase uma persona non grata no museu e é para aí que aponta o vídeo publicado esta semana, um documento da sua segunda tentativa para reflectir sobre o papel dos modelos nus na arte.
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“Não há perigo!”, exclama a artista Deborah De Robertis, protagonista de uma performance que envolveu a Olympia de Édouard Manet, provavelmente uma das mais célebres pinturas do Museu d’Orsay, em Paris. Deborah De Robertis é quase uma persona non grata no museu e é para aí que aponta o vídeo publicado esta semana, um documento da sua segunda tentativa para reflectir sobre o papel dos modelos nus na arte.
Esta nova performance da artista luxemburguesa foi feita no penúltimo dia da exposição temporária Esplendor e Miséria: Imagens de Prostituição (1850-1910) em frente a Olympia (1863), um retrato de uma prostituta nua e da sua criada negra. Olympia, que foi um escândalo na época, desafia-nos com o seu olhar e interroga-nos sobre o seu lugar na sociedade.
Deborah De Robertis publicou a performance no Vimeo, num vídeo de nove minutos que dá conta de uma montagem acidentada pelas sucessivas tentativas dos guardas de impedir a actuação: querem vestir a artista, que chegou de casaco de peles e se despiu para os visitantes. Deborah De Robertis traz uma GoPro presa à cabeça e recolhe imagens enquanto interage com os funcionários do museu. Há também vários outros intervenientes, percebemos no final, que filmam com telemóveis entre o público.
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O texto Direito de Resposta, que foi publicado pela artista como comentário ao vídeo e lido durante a performance, explica por que razão Deborah De Robertis não pediu autorização ao Museu d’Orsay para esta segunda intervenção: “Como é que eu podia pedir autorização a uma instituição que recusou oficialmente considerar a minha performance em frente à Origem do Mundo de Courbet um acto político? Nunca podia correr o risco de ver negado o acesso ao museu. Seria auto-censura.”
O museu, justifica a artista, mandou uma mensagem errada ao mundo ao considerar a performance em frente à vulva de Courbet um acto vulgar de exibicionismo sexual. Essa mensagem é de “uma grande violência” para os artistas e activistas que, como ela, “usam os seus corpos como um instrumento de reflexão”. Embora a queixa do museu contra a artista não tenha tido consequências legais, o significado, argumenta, “é muito grave”, porque o museu “inventou uma transgressão que nunca existiu”.
Deborah De Robertis defende que a exposição sobre prostituição do Museu d’Orsay não podia chegar ao fim sem mostrar o ponto de vista dos modelos nus exibidos. “Em 2016 Olympia já não é um simples modelo enfrentando o espectador: o seu olhar fixo é metálico; o seu aspecto é contemporâneo; é uma espécie de lente-olho gravando o olhar do espectador, do guarda e do director.”
Hoje Olympia controla o seu próprio copyright, diz a artista, mas como é proibido fotografar ou filmar no museu a instituição nega assim o ponto de vista dos mesmos modelos nus que expõe, reduzindo-os a objectos. “Je suis Olympia”, ouve-se a artista gritar no vídeo. Aqui, Deborah De Robertis é artista e é modelo ao mesmo tempo. “Insisto e repito que quando reencarno a pintura não exponho a minha nudez, mas a posição de um modelo nu que volta a olhar para a audiência actual e desafia o olhar moderno.”
A performance é pensada então como um direito de resposta ao director do museu, Guy Covegal, catalizada, como explicou ao jornal britânico The Guardian, por uma recente campanha publicitária Museu d’Orsay no Metro de Paris que incentiva os pais “a levarem as crianças a ver pessoas nuas”.
Nas duas performances, Deborah De Robertis violou as leis francesas contra o exibicionismo. A última acabou na prisão e foi avaliada por um psiquiatra. “Trataram-me como uma pessoa doente. Ouviram-me a explicar a arte e a médica disse-me que não percebia nada de arte”, disse na mesma entrevista ao Guardian. “Foi um grande erro.” Depois, felizmente, apareceu outro médico que percebia pelo menos de impressionismo.
O advogado da performer, Tewfik Bouzenoune, tem como objectivo mudar a lei. “Quer introduzir a noção de intenção. Não deve haver uma confusão entre actos destrutivos e actos construtivos. A lei do exibicionismo não se deve aplicar ao meu trabalho ou ao de qualquer outro activista que usa a nudez para dizer alguma coisa.”
A artista agradece no final aos guardas do museus por terem desempenhado o seu papel.