Wolfgang Tillmans entre o céu e o mar, com Grândola Vila Morena em fundo

Fotógrafo alemão vencedor do Prémio Turner inaugura no Museu de Serralves a sua primeira exposição em Portugal, paredes-meias com o piano de Liam Gillick, que toca variações da canção-símbolo de José Afonso.

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As primeiras imagens mostram ao que vamos: uma pequena fotografia foca o motor de um avião a sobrevoar a Amazónia; as imagens em frente fazem-nos ver o céu, as nuvens, o mar… Estamos a entrar No limiar da visibilidade, a exposição com as “paisagens verticais” de Wolfgang Tillmans (n. 1968), que esta sexta-feira tem inauguração oficial no Museu de Arte Contemporânea de Serralves (MACS), e abre ao público no sábado, ficando até ao dia 25 de Abril.

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As primeiras imagens mostram ao que vamos: uma pequena fotografia foca o motor de um avião a sobrevoar a Amazónia; as imagens em frente fazem-nos ver o céu, as nuvens, o mar… Estamos a entrar No limiar da visibilidade, a exposição com as “paisagens verticais” de Wolfgang Tillmans (n. 1968), que esta sexta-feira tem inauguração oficial no Museu de Arte Contemporânea de Serralves (MACS), e abre ao público no sábado, ficando até ao dia 25 de Abril.

Trata-se da primeira exposição em Portugal da obra deste artista alemão que, em 2000, se tornou no primeiro fotógrafo a ser distinguido com o Prémio Turner, e cuja carreira se tem desenvolvido entre o seu país e Londres, com passagem por Nova Iorque.

Na visita guiada realizada esta quinta-feira de manhã para a comunicação social, a presidente de Serralves, Ana Pinho, apresentou Wolfgang Tillmans como “um dos artistas mais influentes do nosso tempo”, e a directora do MACS, Suzanne Cotter, disse tratar-se de um dos criadores “mais inspiradores e emocionantes” da actualidade, pelo assombro e inteligência com que explora as possibilidades da fotografia como medium que lhe permite tratar, “com total liberdade”, temas tão actuais como as questões sociais ou os fenómenos da natureza.

Durante a visita em que falou demoradamente sobre o seu trabalho, Tillmans apresentou-se apenas como “um artista”. “Sou um fotógrafo, mas fundamentalmente sou um artista, e a fotografia é o medium com que crio quadros contemporâneos”, disse o alemão, lembrando ter, no início da sua carreira no final da década de 1980, experimentado fazer desenhos, pintura e música. Acabou por se render à fotografia, que vê como “um instrumento maravilhoso”. “É uma coisa incrível, que nos habituamos a dar como garantido, mas que, afinal, não é mais do que um processo químico – é um milagre pelo qual tenho o máximo respeito”, acrescentou Tillman, afirmando-se também como "um fotógrafo analógico", mesmo se utiliza actualmente as tecnologias digitais que tem ao seu alcance.

A viagem pela meia centena de fotografias e um vídeo – Telescópio solar sueco (2014), um loop de cerca de 3 minutos que obrigou à adaptação do corredor do museu numa pequena sala escura para o seu visionamento – que constituem No limiar da visibilidade é, de facto, uma experiência imersiva. Seja na infinitude do céu e do mar, como nas experiências da cor e das matérias que Tillmans captura com a sua objectiva.

O artista alemão visitou o Museu de Serralves pela primeira vez no passado mês de Outono, altura em que aí fez uma conferência sobre o tema da Felicidade, integrada no Fórum do Futuro, e que lotou o auditório da fundação. Já nessa altura, em entrevista ao PÚBLICO, Tillmans antecipava que a sua exposição no Porto iria tratar o tema das fronteiras entre a água e as nuvens, entre o céu e o horizonte.

Explicou agora por que classificou as suas imagens como “paisagens verticais” – e não apenas porque grande parte delas têm este formato que contraria a horizontalidade do olhar humano. “Há um horizonte, uma fronteira, que nunca poderemos atingir: o mar é todo uma fronteira imensa que nos põe sempre à distância”, disse, acrescentando, por outro lado, que o título No limiar da visibilidade é o mesmo de uma natureza morta, uma mesa de pequeno-almoço que fotografou em 1997, que não deixa de criar alguma estranheza no universo mais abstractizante das fotografias expostas no MACS. “Quando fiz esta fotografia, fiquei intrigado com a infinitude das suas cores” – o vermelho do chá, o amarelo da manteiga… –, disse, referindo-se à incrível capacidade da fotografia de tornar as coisas simultaneamente "visíveis e intangíveis”.

E a prova de que o sentido de infinitude de que fala Tillmans não tem que passar exclusivamente por imagens de horizontes longínquos e fundidos-encadeados de cores está naquela com que o artista registou, no ano passado, “o mar do Porto” (O estado em que estamos, 2015): dir-se-ia quase um grande plano, em que as diferentes gradações de azul como que congelam a água numa imagem mental, interior.

Numa selecção de fotografias que tanto se apresentam na pequena dimensão familiar como na grandeza de um mural, No limiar da visibilidade transporta também o visitante ao mundo inteiro: da Amazónia ao Mar do Japão, de Sundance a Xangai, do Louisiana a Lima; mas também, de avião ou no Concorde, do mar ao céu, da lua a Vénus…

Ao som da Grândola

A circunstância de a inauguração da exposição de Wolfgang Tillmans coincidir, no calendário do MACS, com a abertura de uma outra instalação faz com que as visitas ao museu se façam, até Abril, com os sons de Grândola Vila Morena em fundo. A canção-símbolo da Revolução dos Cravos é repetida à exaustão na intervenção do artista britânico Liam Gillick (n. 1964) intitulada Factories in the snow (Fábricas na neve).

Nesta que é também a sua primeira exposição em Portugal, Gillick instalou na sala principal do MACS (normalmente conhecida como “a piscina”) um piano sobre o qual cai ininterruptamente neve preta, e que toca sozinho variações da canção de José Afonso.

O artista explicou ter adaptado agora no Porto uma intervenção que concebeu, em 2007, para um festival de teatro em Manchester. É, realçou, “um trabalho sobre a memória, sobre a relação do indivíduo com a sociedade”, e sobre a ideia de que “o artista é também um cidadão”. Gillick apresentou ainda como óbvia, para Portugal, a escolha de Grândola, Vila Morena, pela dimensão política e o sentido de luta que a canção contém. “Já não há canções assim, como a Internacional ou o Grândola”, lamentou o artista, cuja instalação Fábricas na neve é apenas a primeira parte de um projecto mais amplo, intitulado Campanha (a dimensão política, novamente), e que irá desenvolver-se em Serralves até ao início de Janeiro do próximo ano.

Seguir-se-á, no próximo mês de Abril, AC/DC Joy Division House, reflexo de uma encomenda feita a Gillick para um centro social para adolescentes em Milão.