Ala segurista arrasa Maria de Belém e responsabiliza-a pela derrota
Um dia depois das eleições presidenciais, dirigentes afectos ao anterior secretário-geral aguardam que António Costa convoque os órgãos do partido.
A derrota estrondosa de Maria de Belém nas eleições de domingo deve ser assacada exclusivamente à candidata presidencial, que recusou o apoio de algumas figuras do PS conotadas com o anterior secretário-geral do partido, António José Seguro. É isso que defendem alguns ex-dirigentes nacionais do partido, que acusam a candidata de ter “cometido erros” ao longo da campanha eleitoral e de ter sido "incapaz de ter um discurso que fosse buscar votos ao eleitorado de Marcelo Rebelo de Sousa". “A candidata não foi capaz de traçar a sua linha divisória e mostrar que podia protagonizar uma segunda volta indo buscar votos ao centro”, afirma um dirigente nacional ao PÚBLICO.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A derrota estrondosa de Maria de Belém nas eleições de domingo deve ser assacada exclusivamente à candidata presidencial, que recusou o apoio de algumas figuras do PS conotadas com o anterior secretário-geral do partido, António José Seguro. É isso que defendem alguns ex-dirigentes nacionais do partido, que acusam a candidata de ter “cometido erros” ao longo da campanha eleitoral e de ter sido "incapaz de ter um discurso que fosse buscar votos ao eleitorado de Marcelo Rebelo de Sousa". “A candidata não foi capaz de traçar a sua linha divisória e mostrar que podia protagonizar uma segunda volta indo buscar votos ao centro”, afirma um dirigente nacional ao PÚBLICO.
Embora na altura da preparação da corrida eleitoral dirigentes do partido afectos ao ex-secretário-geral tenham participado no desenho da campanha, Maria de Belém não quis que a sua candidatura fosse conotada como uma “candidatura de facção” e evitou tê-los a seu lado ao longo dos quinze dias de campanha. Houve porém algumas excepções: João Soares, actual ministro da Cultura, e o deputado Alberto Martins.
“Maria de Belém entendeu que era importante passar uma imagem de que a sua candidatura não era de facção e por isso decidiu afastar todas aquelas pessoas que estavam conotadas com António José Seguro”, sublinha um outro dirigente nacional, afirmando que para ela era “mais importante a presença de Marcos Perestrello [presidente da Federação da Área Urbana de Lisboa, mais próximo de Costa] do que nos ter a nós na campanha”.
Outra fonte socialista ligada ao anterior secretário-geral, que também solicitou o anonimato, lamenta que Maria de Belém “não tenha feito um telefonema a António José Seguro convidando-o para participar na campanha. É uma coisa que não se faz”.
Os seguristas entendem que o partido deve fazer uma reflexão sobre o que se passou, mas não querem forçá-la, nem discuti-la a quente e dizem que é preciso ter inteligência e deixar acalmar as coisas. Um outro dirigente adverte para “os perigos” que podem surgir para o Governo liderado por António Costa se o partido fizer essa discussão em cima da derrota. “Perante esta derrota temos que pensar muito bem e não será prudente fazer comentários, é melhor pensarmos primeiro com calma”, acrescenta.
“O pior que nos podia acontecer era precipitarmo-nos e isso não pode acontecer primeiro porque o PS está agora no Governo e depois porque este é um momento delicado do ponto de vista do processo orçamental”, adianta ainda, mostrando preocupação com "a subida do Bloco de Esquerda nestas eleições”.
O ex-deputado Ricardo Gonçalves coloca a tónica na descida do PCP, que se ficou nos 3,9%, um resultado “pouco digno” para os comunistas. “Não podemos permitir que o PCP se torne irrelevante”, defende, chamando a atenção para o facto de “apenas o Bloco estar a tirar partido”, numa alusão às duas vitórias que conquistou, primeiro nas legislativas, agora nas presidenciais.
O ex-deputado eleito pelo círculo de Braga fala de uma “grande derrota” da esquerda em geral nas eleições presidenciais para dizer que essa mesma esquerda é a "base de sustentação do Governo de António Costa”.
Ricardo Gonçalves diz que o primeiro-ministro, António Costa, cometeu “um erro” ao não defender a apresentação de um candidato único presidencial quando fez o acordo com as esquerdas para a formação do Governo. “Foi um erro monumental que vamos pagar caro”, refere, sublinhando que as eleições presidenciais são o primeiro acto que acontece com este Governo em funções.
Quanto à ex-presidente do PS, não a poupa. “Maria de Belém passou a campanha a disputar o espaço de Sampaio da Nóvoa, quando o que devia ter feito era ocupar o espaço de Marcelo Rebelo de Sousa e combatê-lo politicamente e não foi isso que fez”, aponta este dirigente, que integra a comissão nacional do partido. Ao PÚBLICO, defende que a direcção do PS tem de convocar os órgãos e tentar perceber as razões da derrota.
Para já, os seguristas vão esperar para ver. Acreditam que António Costa vai convocar uma Comissão Política Nacional para reflectir sobre o que falhou nestas eleições, mas vão manter-se atentos. Aparentemente, os rostos do segurismo, que se transformou numa corrente ideológica estratégica dentro do partido, não vão, para já, tomar nenhuma posição, mas a probabilidade de aproveitarem o próximo congresso nacional do PS para confrontar a liderança do partido está em cima da mesa.
Francisco Assis, a figura principal desta corrente, deverá reaparecer no seu programa de televisão. Este grupo, do qual fazem também parte Álvaro Beleza, Eurico Brilhante Dias e Ricardo Gonçalves, entre outros, quer manter alguma discrição.
Alberto Martins, que esteve ao lado de Seguro nas eleições primárias, tal como Maria de Belém, já veio dizer que o partido precisa de discutir a dimensão da derrota da candidata. Fê-lo na noite eleitoral, depois de Maria de Belém ter assumido a derrota.
O PÚBLICO tentou um contacto com a secretária-geral adjunta do PS, Ana Catarina Mendes, mas sem sucesso. O mesmo aconteceu com Marcos Perestrello, líder da FAUL, que se mostrou indisponível para fazer qualquer declaração.