9.741.792 eleitores escolhem um novo Presidente entre dez estreantes
Depois do recorde de 53,48% de abstenção em presidenciais em 2011, a afluência às urnas deverá hoje ser maior: é isso que tem acontecido sempre que o Presidente não se recandidata, porque são eleições mais disputadas.
Este domingo deveriam ir às urnas 9.741.792 eleitores portugueses para eleger um novo Presidente da República entre dez candidatos. É certo e sabido que isso não acontecerá, seja por manifesto desinteresse dos cidadãos, seja porque esses números do recenseamento eleitoral não correspondem ao dos portugueses maiores de 18 anos residentes em Portugal e recenseados no estrangeiro. Ainda assim, é de esperar que estas eleições sejam mais participadas do que as de 2011 e de 2001: os portugueses vão mais às urnas quando o Presidente não se recandidata.
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Este domingo deveriam ir às urnas 9.741.792 eleitores portugueses para eleger um novo Presidente da República entre dez candidatos. É certo e sabido que isso não acontecerá, seja por manifesto desinteresse dos cidadãos, seja porque esses números do recenseamento eleitoral não correspondem ao dos portugueses maiores de 18 anos residentes em Portugal e recenseados no estrangeiro. Ainda assim, é de esperar que estas eleições sejam mais participadas do que as de 2011 e de 2001: os portugueses vão mais às urnas quando o Presidente não se recandidata.
Entre os dados do Ministério da Administração Interna sobre os eleitores registados em território nacional e as estimativas do INE – Instituto Nacional de Estatística para os cidadãos portugueses com mais de 18 anos residentes em território nacional há uma discrepância de cerca de 1,6 milhões de pessoas. São 9.439.510 os eleitores registados nos cadernos eleitorais em Portugal continental e regiões autónomas (a que se somam 302.282 nos consulados espalhados pelo mundo), ao passo que existirão apenas 7,836 milhões de portugueses com mais de 18 anos a residir no país (considerando os óbitos em 2015). À hora de abertura das urnas está, portanto, garantida uma abstenção de pelo menos 17%.
Olhando para os resultados das presidenciais desde 1976 percebe-se que há nitidamente um efeito “recandidatura”: desde Mário Soares que quando um chefe de Estado se recandidata a um segundo mandato a taxa de abstenção dispara nessa eleição (22,01% em 1986; 37,84% em 1991) – depois do histórico socialista, aconteceu o mesmo com Jorge Sampaio (33,71% em 1996; 50,29% em 2001) e com Aníbal Cavaco Silva (38,47 em 2006; 53,48% em 2011).
Com o general Ramalho Eanes, que também fez dois mandatos em Belém, tinha acontecido o contrário, talvez porque aquando da segunda candidatura eram seis candidatos (mais dois que em 1976) e porque as eleições se realizaram poucos dias depois da morte do primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro, no acidente aéreo de Camarate, o que terá motivado os eleitores a exercerem com mais veemência o direito cívico de votar.
Como foram eleitos os Presidentes da República em democracia
Rui Oliveira e Costa, responsável da Eurosondagem, diz ser impossível prever, em sondagens pré-eleitorais, o nível da abstenção. “De uma forma geral, as pessoas não dizem que não vão votar tal como não dizem que não pagam impostos”, ironiza. Por isso, falar sobre os níveis de abstenção expectáveis é fazer “palpites”. E o seu é de que vai “subir muito, muito, muito” em relação a 2006. “Quanto é o muito não sei. Mas acredito que ultrapasse as legislativas [44,16%] e se aproxime dos 50%.”
Presidente tem vantagem?
Ser Presidente e candidato dá a essa pessoa uma “enorme vantagem política pela capacidade de usar o cargo que já ocupa”, afirma o politólogo Pedro Magalhães. Tem maior visibilidade pública, já é mais conhecido e é visto como o favorito à partida. Essa pole position leva a que a sua campanha “faça um menor esforço para mobilizar o eleitorado”. Ao mesmo tempo, os adversários “são de menor qualidade no sentido de que têm menos notoriedade e peso político, não são da primeira linha do partido”. “São poucos os que avançam para desafiar o Presidente da República”, vinca o investigador do Instituto de Ciências Sociais (ICS).
A explicação de Marina Costa Lobo, investigadora do mesmo instituto e que integrou o projecto Comportamento Eleitoral e Atitudes Políticas dos Portugueses, segue a mesma linha: “Quando há um vencedor à partida, a mobilização é menor, tanto em termos de candidatos competitivos como em termos de eleitores.” As altas percentagens de abstenção nas presidenciais são, no entanto, um reflexo do que acontece nas restantes eleições: os portugueses têm votado sucessivamente menos, “em consonância com o aumento na insatisfação com a democracia em Portugal”, diz a politóloga.
No caso específico das presidenciais, também estará relacionada com “alguma desilusão em relação às grandes expectativas iniciais sobre os poderes” do chefe de Estado. “Tanto a revisão constitucional em 1982, como a reorganização do sistema partidário centrou o poder do executivo no primeiro-ministro nos últimos 30 anos. Mas o Presidente continua a exercer um poder importante e central, e terá perspectivas de se tornar ainda mais importante numa fase em que o sistema partidário está em mudança”, antecipa Marina Costa Lobo.
Os cartazes das eleições presidenciais desde 1976
Pedro Magalhães realça que nos últimos anos essa ideia de um Presidente menos influente pode ter mudado um pouco: recorda que Jorge Sampaio foi determinante para a queda de Santana Lopes e mudança de Governo, que Cavaco Silva teve nas mãos a indigitação de António Costa e conduziu o processo de forma muito pública. O investigador do ICS considera que os cidadãos não têm a real noção, no dia-a-dia, de que o Presidente tem ingerência directa nas decisões políticas, porque “essa influência se passa longe dos olhares da opinião pública e dos media”. Salienta, por exemplo, que os “decretos-lei vindos do Governo e que chegam à Presidência para promulgação são muitas vezes negociados nos bastidores”.
O facto de haver o número mais elevado de sempre de candidatos e de serem todos estreantes nas andanças presidenciais pode potenciar o voto? Sim, admitem os dois politólogos e o especialista em sondagens. Rui Oliveira e Costa lamenta que a campanha eleitoral e a “proliferação e vulgarização dos debates não tenham contribuído para o esclarecimento” – tanta gente a falar em tão pouco tempo não ajuda a diferenciar. E avisa, ironizando, que, com este facilitismo para entrar na corrida, “daqui a cinco anos teremos o candidato da cereja do Fundão, o da sardinha da Nazaré e o do vinho do Cartaxo”.
Já a ausência do apoio formal dos partidos a candidatos, com a ajuda das máquinas partidárias, contribui “claramente” para o aumento da abstenção, considera Marina Costa Lobo, que recorda o “primeiro referendo ao aborto em que o PS não se empenhou e os resultados foram negativos do ponto de vista da mobilização”.
Agora, a existência de muitos candidatos ao cargo de Presidente da República não compensa, em termos de mobilização, a ausência do envolvimento dos partidos nessas candidaturas, algumas de "qualidade duvidosa", assinala a politóloga do ICS. Mas os "candidatos de qualidade que apresentam candidaturas de cidadania têm apoios partidários ou passado de envolvimento partidário”, nota ainda Marina Costa Lobo.