Boxe, Tchékhov a ouvir Lou Reed e outros desejos para 2016

Os festivais não esgotam a programação de teatro e dança, mas concentram uma boa parte do que teremos para ver até ao fim do ano. Antevisão, a completar nos próximos meses.

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Apesar das baixas (o Próximo Futuro não volta, sobre o Citemor há muitas dúvidas), 2016 vai ser um ano de festivais para o teatro e para a dança — desde logo porque há Alkantara (25 de Maio a 11 de Junho), mas também porque há acontecimentos novos no pedaço, do DDD — Dias da Dança (27 de Abril a 8 de Maio) que o Teatro Municipal do Porto estende a várias salas ao Cumplicicidades do coreógrafo Francisco Camacho, que tem a sua verdadeira primeira edição ainda este Inverno (4 a 19 de Março).

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Apesar das baixas (o Próximo Futuro não volta, sobre o Citemor há muitas dúvidas), 2016 vai ser um ano de festivais para o teatro e para a dança — desde logo porque há Alkantara (25 de Maio a 11 de Junho), mas também porque há acontecimentos novos no pedaço, do DDD — Dias da Dança (27 de Abril a 8 de Maio) que o Teatro Municipal do Porto estende a várias salas ao Cumplicicidades do coreógrafo Francisco Camacho, que tem a sua verdadeira primeira edição ainda este Inverno (4 a 19 de Março).

A abrir o Alkantara (25 a 27 de Maio), o choque de realidade (brasileira, mas temos alegrias e dramas em comum, que aqui talvez se condensem no Satellite of love de Lou Reed) a que Christiane Jatahi submete As Três Irmãs, de Tchékhov em E se elas fossem para Moscou? Numa edição que parece inventariar “a forma como os artistas contemporâneos reconstroem relações com o passado”, adianta ao Ípsilon o director Thomas Walgrave, a encenadora brasileira atira-se a um monstro sagrado do repertório europeu para o reequacionar como uma história sobre “a necessidade de sair, de partir”, que em bom português (tanto de Portugal como do Brasil) se traduz à letra por “emigração” (e que tem tantos links com o brain drain que a austeridade agravou por cá como com a crise dos refugiados). À sua maneira, aliás, E se elas fossem para Moscou? é verdadeiramente um espectáculo bilingue: o espectador é convidado a vê-lo duas vezes, uma na versão ao vivo e outra na versão filmada (e surpresa: são radicalmente diferentes).

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Entretanto, e até Junho, Cláudia Dias vai continuar a aprender boxe: Segunda-feira: atenção à direita!, que terá a sua estreia portuguesa no Alkantara, é a primeira pedra de Sete Anos, Sete Peças, série de encontros da bailarina e coreógrafa com artistas convidados (o primeiro é Pablo Fidalgo Lareo, cujo Haverás de ir à guerra que começa hoje foi o melhor espectáculo de teatro de 2015 para o Ípsilon; seguem-se, entre outros, John Romão e o pai que ela tinha mais tarde ou mais cedo de “matar”, João Fiadeiro, com quem partilhou “dez anos de criação” e aprendeu “um método muito particular”, a composição em tempo real). “Entendo este projecto como um gesto de resistência num momento em que só podemos programar a vida ano a ano e em que a palavra inevitabilidade se cola à pele — de resistência e de recusa, no sentido de dizer que temos o direito de construir futuro, de construir o nosso futuro”, explica ao Ípsilon, revelando que o que a distância que havia entre ela e o encenador galego se venceu em sucessivos rounds de perguntas (das duas mil que terão feito ficaram 200) e que a gramática do boxe acabou por impor-se. O espectáculo de Cláudia Dias é, a propósito, um dos que farão a ponte aérea entre o Alkantara e o FITEI — Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (28 de Maio a 19 de Junho) — tal como Suite nº 2, do francês Joris Lacoste (em que o festival do Porto reencontra, logo na abertura, um dos artistas que há um ano deram corpo ao ciclo Expatriados, Nuno Lucas), e a nova peça de Gonçalo Waddington. Para ver só no FITEI, que este ano tem como “assunto” a cenografia (haverá exposições de Nuno Carinhas, José Capela e Pedro Tudela e um audio-walk do Teatro do Frio percorrendo todas as salas de teatro do Porto, as que já fecharam e as que se mantêm vivas): A Morte de Àlex Rigola, combate entre o encenador catalão e o actor/encenador português Nuno Cardoso que resulta de três meses de entrevistas a dois, o reencontro de Howard Barker com As Boas Raparigas em Hunt, dirigido pelo próprio dramaturgo britânico, e a nova encenação de Gonçalo Amorim (também director do festival) para o Teatro Experimental do Porto, Não matem o mandarim, a partir de Eça de Queirós

Ainda (e só) no Alkantara, dois dos espectáculos de Faustin Linyekula para a bienal Artista na Cidade: Sur les traces de Dinozor, update do anterior The Dialogue Series: III. Dinozord em que o coreógrafo congolês retoma a história do seu amigo, e então prisioneiro político, Antoine Vumilia Muhindo, para fazer o ponto de situação de toda uma geração (Muhindo, já agora, conseguiu entretanto fugir da prisão e exilou-se na Suécia, o que lhe permite estar em palco); e The Dialogue Series: IV. Moya, conversa íntima com a fulgurante bailarina sul-africana Moya Michael, que talvez recordemos de peças anteriores de Anne Teresa de Keersmaeker e Akram Khan.

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Hyperfruit, de Ludvig Daae, será uma das estreias nacionais do GUIdance, já em Fevereiro HEDVIG JENNING

Muito antes disso, e já a 11 de Fevereiro, o GUIdance (4 a 13) leva a Guimarães a remontagem do já histórico Kaash (2002), com que o mesmo Akram Khan se lançava (levando com ele Anish Kapoor e Nitin Sawhney) no formato blockbuster, e nova visita da Rosas da mesma Anne Teresa de Keersmaeker, com Golden Hours (as you like it). O programa inclui ainda a estreia absoluta das novas criações de Victor Hugo Pontes, que abre o festival com o tchekhoviano Se alguma vez precisares da minha vida, vem e toma-a, e de Miguel Moreira, Maremoto, a que se juntam as visitas de dois reincidentes no GUIdance: o norueguês Ludvig Daae, com Hyperfruit, e a japonesa Kaori Ito, com Je danse parce que me méfie des mots.

Em Março, e após a “edição zero” do ano passado, o Festival Cumplicidades arranca em definitivo, com a intenção de “aproximar Portugal a outras latitudes geográficas e coreográficas dos países do Mediterrâneo” — concretizada na estreia nacional de You’re Not a Fish After All, uma viagem feita das guerras, dos assassínios e das vozes perdidas que o bailarino turco Mihran Tomasyan vai desemalando. Também em estreia no festival, O Céu É Apenas Um Disfarce Azul do Inferno, dueto entre o medo e a excitação de Joana von Mayer Trindade e Hugo Calhim Cristóvão. Mais dança em Abril, no já referido DDD, que trará ao eixo Porto-Matosinhos-Gaia o mais recente Raimund Hoghe, Songs for Takashi, dueto com o bailarino Takashi Ueno, mas também espectáculos de Ambra Senatore, Vera Mantero, Marlene Monteiro Freitas (Jaguar), Cristina Planas Leitão e Flávio Rodrigues com Joana Castro.

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A seguir, o FIMFA — Festival Internacional de Marionetas e Formas Animadas (5 a 22 de Maio) aposta em “espectáculos invulgares”, como aqueles que terão honras de abertura e encerramento: respectivamente Les Encombrants Font Leur Cirque, da companhia francesa Théâtre La Licorne, que assenta arraiais no circo e faz de “artistas centenários” a braços com artroses e outras maleitas verdadeiros campeões de destemperança e audácia, e House by the Lake, das israelitas Yael Rasooly e Yaara Goldring, em que três irmãs da Europa Central (qualquer associação ao Holocausto é incentivada) se escondem num quarto frio e se fundem com pedaços partidos de bonecas, até encontrarem abrigo num universo fantástico.

Do Festival de Almada, que no ano passado nos deu A Menina Júlia na singular encenação de Katie Mitchell, espera-se a habitual programação de peso, conhecendo-se até à data apenas as produções da companhia residente, com destaque para o palpitante O Feio, texto de Marius von Mayenburg, que “inventa” um homem belo por meio de uma intervenção cirúrgica (mas só até ao momento em que o cirurgião resolve replicar em série essa sua criação), com encenação do italiano Toni Cafiero.

Já na rentrée, o Circular — Festival de Artes Performativas (24 de Setembro a 1 de Outubro) dá carta branca a João Sousa Cardoso para trabalhar Os Pescadores, de Raul Brandão, e Liliom, de Ferenc Molnár, com a comunidade piscatória das Caxinas, mostra a nova peça que Catarina Miranda está a construir a partir do estudo de protocolos e ímpetos de guerra (título provisório Boca-muralha — as benevolentes), e acolhe em residência artística os espanhóis Carme Torrent e Iñaki Álvarez.

Já são muitos bolds para anotar na agenda nova, e ainda é só o início: a temporada dos festivais, e tudo o que está para lá deles, segue dentro de momentos.