Coisas que o Nuno talvez não saiba…
São raras as pessoas cuja vida tem este lastro. São muito raras. O Nuno Teotónio Pereira foi (é) uma delas.
A vida de algumas pessoas é maior do que elas. A palavra, a obra e os gestos que vão inscrevendo na história dos dias ajudam a entender o porquê desse salto qualitativo entre o que viveram – o que foram – e o significado, o impacte da sua vida em nós. Podem encontrar-se explicações de vária ordem e em diversos planos, mas há um qualquer irredutível mistério neste ganho de dimensão. São raras as pessoas cuja vida tem este lastro. São muito raras. O Nuno Teotónio Pereira foi (é) uma delas.
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A vida de algumas pessoas é maior do que elas. A palavra, a obra e os gestos que vão inscrevendo na história dos dias ajudam a entender o porquê desse salto qualitativo entre o que viveram – o que foram – e o significado, o impacte da sua vida em nós. Podem encontrar-se explicações de vária ordem e em diversos planos, mas há um qualquer irredutível mistério neste ganho de dimensão. São raras as pessoas cuja vida tem este lastro. São muito raras. O Nuno Teotónio Pereira foi (é) uma delas.
Conheci-o no princípio dos anos “setenta” através do filho Miguel. Aprendi a reconhecê-lo em muitos dos acontecimento que antes disso foram marcos da oposição ao regime salazarista. E em muitas outras realizações que permitiram relações, pensamento, desenhos e obra inovadores. Aprendi com ele a urgência de agir, aquele inesquecível olhar entrando-nos pela alma dentro para, em silêncio, nos gritar as tarefas, a faina, a parte para que tínhamos préstimo e era já ontem o tempo de as materializar. Lembro-me do seu sorriso e da sua irresistível capacidade de pôr toda a gente que conhecia – e ele conhecia toda a gente! – a mexer, a relacionar-se entre si. E em tudo isto, o Nuno nunca reclamava louros nenhuns, parecia sempre que outros haviam feito o que ele permitira que acontecesse.
Hoje quero recordar que ao Nuno devo a possibilidade de ter encontrado um caminho, um modo, uma inquietação para me dizer cristão. Naquele tempo, depois e hoje. Não era fácil então, no início dos anos setenta, ser jovem, lutar contra o regime e a guerra colonial, denunciar o modo como a igreja católica apoiava o salazarismo, mesmo sem Salazar, e… manter-se crente. O Nuno foi para mim essa inspiração, essa referência, que me permitiu manter entreaberta a improvável janela da fé. E continuou a ser, mesmo depois de se ter deixado de rever como cristão. Sei que para muitos outros e outras da minha geração também assim foi.
Todos devemos algo ao Nuno. Mesmo os que o não sabem. Também há coisas que lhe devemos que ele não sabe. A vida de um grande homem é maior do que a intencionalidade que nela põe...
Jornalista